CÍCERO TAVARES - CRÔNICA E COMENTÁRIOS

Tipo de armazém de secos e molhados da época, a semelhança do Seu Cirilo

Seu Cirilo era um comerciante mulherengo. Em cada bairro onde tinha um armazém de secos e molhados, possuía um rabo de saia para “furar o couro” a cada dia da semana.

De todas as mulheres com quem teve “um caso”, só Dona Dóris teve três filhos dele, um macho e duas fêmeas. Até hoje não se sabe por que as outras não embucharam dele…

Seu Cirilo não era agiota, mas desenvolveu um método infalível de se apossar das casas dos devedores do seu armazém: quando percebia que o devedor estava com a caderneta de débito a perigo, intimava-o a trazer “a escritura da casa” como garantia do débito e, quando este chegava a determinado patamar, pagava a diferença do valor do imóvel previamente combinado e expulsava o devedor. Por causa desse modo de pressão infalível, Seu Cirilo conseguiu angariar um patrimônio que dava inveja a qualquer comerciante da redondeza.

Antes de falecer, Seu Cirilo havia deixado dois imóveis “apalavrados” para cada filho. Três para a esposa, fora os três armazéns de secos e molhados que, um ano depois de sua morte, fecharam as portas porque os filhos não se entendiam na condução gerencial.

Após a falência dos três armazéns por falta de direção, cada filho, de posse de suas casas e apartamentos dados verbalmente pelo pai em vida, tomou seu rumo na estrada, e passaram a se desentender cada vez que um falava para o outro que queria vender um imóvel “doado” pelo pai para tocar a vida. Nenhum assinava em favor do outro qualquer termo de renúncia, mesmo sabendo que isso era condição necessária para dirimir qualquer dúvida e dar segurança jurídica para quem estava comprando.

Interessante é que os filhos de Seu Cirilo viviam socados na igreja todos os sábados e domingos justamente orando às pessoas que estivessem passando por esse tipo de situação. ”Oh! Pai! Antecedei junto a teus filhos para que não haja desavença entre eles!” “Que eles vivam em harmonia! Amém!” – suplicavam ajoelhados!

Enquanto oravam para Deus para mostrar um caminho, Maria procurava João para que assinasse um termo de anuência e esse se negava terminantemente! João procurava Josefa para que assinasse um termo de concordância para ele vender a casa e esta dizia não! Josefa procurava João e Maria para que assinassem um termo de anuência e estes diziam também não! E assim foram levando a vida nessa discussão interminável, com um colocando a culpa no outro por não fechar o negócio. Enquanto isso os três armazéns pertencentes, em vida, a Seu Cirilo, o tempo ruiu. Até que um dia também Dona Dóris encantou-se e tiveram de procurar a Justiça para dividirem os bens. Contrataram um advogado “especialista” e este, autorizado pelos três irmãos, entrou na Justiça para partilhar os bens.

O tempo passou e a Justiça sem dar um ponto final ao processo. A espera foi tanta que morreram João e Maria. Josefa caminhava para o paletó de madeira por causa do sério diabetes. “Vai chegar o dia em que, quando a Justiça disser ‘de quem é de quem na partilha’ até os netos terão viajado para a cidade de pés juntos!” – Sentenciou um vizinho gaiato que trabalhava no Tribunal.

Bem feito para os três conflitantes que não chegaram a um consenso arbitral antes de procurar a Justiça, que no Brasil só não é lenta para quem é ladrão, assassino, criminoso, latrocida, estuprador, pedófilo e corrupto, porque tem proteção constitucional.

7 pensou em “TRÊS IRMÃOS EM CONFLITO

  1. Parabéns, prezado cronista Cícero Tavares, pela excelente crônica, que retrata a decadência de uma família rica, desunida e sem orientação do chefe! Independentemente da sua condição de mulherengo, o Sr. Cirilo concentrou seu objetivo em ganhar dinheiro e fazer fortuna, esquecendo de preparar os filhos para a vida. Sua morte foi um “desastre” para a família, pois os filhos não estavam à sua altura, para administrar os bens por ele deixados..
    Uma história triste e muito real, que mostra as consequências da falta de orientação dos filhos.

    Um grande abraço e uma ótima semana!

  2. Querida Violante Pimentel:

    Conheço essa triste história como a palma da minha mão. Suavizei as desavenças e escândalos para a narrativa não ficar pornográfica, mas a essência da história é essa: os três filhos eram inimigos figadais, culpa do pai que era muito raparigueiro e indiferente aos filhos antes de morrer?

    Freud, com toda sua sapiência e sabedoria, talvez não soubesse conceituar essa patologia familiar! Aparentemente uma coisa tão simples antes de a gente entrar no terreno arenoso, mais à medida que a gente vai tomando pé da situação a gente ia percebendo que o caso parecia não ter mesmo o fim que se esperava ter.

    Mas querida, Violante Pimentel, a nobre colunista, bem como eu, que ainda trabalhamos diretamente com o público. Eu como Corretor de Imóvel e a exímia cronista, como Promotora, já vivenciamos muitos casos desses, impublicáveis. Mesmo que a gente ficcione o fato se torna cruel porque a gente se depara com o SER HUMANO! E com raríssima exceção, o ser humano é uma desgraça!

    Obrigado pelo comentário, com uma ótima semana para nobre cronista!

  3. Prezado e caro colunista Cícero.

    Essas estórias que o Amigo nos conta parece que vem de um mundo
    um tanto imaginário, porem eu acredito que elas sejam verdadeiras, cavadas
    nos profundos cafundós interioranos do seu Estado e fronteiras.
    Geralmente nos demonstram como a ambição , ignorância, a justiça e as s
    ôtoridades se portam de modo tão inusitado, criando mágoas e tragédias
    evitáveis e sem fim.

    Agora acredito que de posse de tão vasto conhecimento de causos,
    personalidades e caráter interioranos, o Amigo está colhendo material
    para o seu livro de estórias exóticas e um tanto fantásticas, mais
    sempre críveis se ajuizarmos o comportamento mental e as ambições
    desenfreadas dos seres humanos.

    Gosto deste tipo de estórias e de quem as sabe escrever.
    Considero como literatura “verdadeira ” e não falsa ficção inventada.

    • Caríssimo comentarista do coração Dmatt:

      Mais uma vez insisto: como está a saúde do amigo?

      A minha vai meio cambaleante, pois um safado dum aedes aegypti me ferrou, provocando aquelas dorezinhas incomodatícias, principalmente no meu caso que tenho artrose e artrite.

      Obrigado, caro amigo pelo excelente comentário! A mim sua leitura e comentário só me honram, me deixam envaidecido.

      • Tenho certeza de que a sua saúde vai ficar 100%OK muito
        em breve.

        Pois um mosquitinho jamais poderá derrotar um gigante
        da sua estatura e um importante esteio da nossa
        Besta Fubana.
        A minha saúde agora está ok. É só evitar falar no
        bêbado louco.
        Abraços e estimo melhoras rápido.

    • Caríssimo colunista do coração Carlos Ivan:

      Pelos motivos explicados acima ao grande comentarista DMATT, só tive tempo e melhora nas dores articulares para ler e agradecer seu comentário agora, dobre TRÊS IRMÃOS EM CONFLITO.

      Infelizmente são histórias humanas que se repetem diariamente entre família desde que o homo sapiens surgiu na terra, como o definiu muito bem o grande historiador israelense Yuval Harari, no seu livro “Homo Sapins – Uma Breve História da Humanidade.

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