CÍCERO TAVARES - CRÔNICA E COMENTÁRIOS

Soninha era uma mulher imprevisível quando o assunto era guardar segredo de amigos. Sempre que saia às festas com a turma ficava na moita, só de mutuca, atenta a um escorregão de um colega: falar mal de outro ausente para depois revelar a este colega que aquele havia falado mal dele, quando se reunia nos bate-papos. Ela mentalizava tudo com riqueza de detalhes para depois detonar em ocasiões inapropriadas. Tinha o prazer mórbido de ver o circo pegar fogo só para se lambuzar de rir da situação constrangedora!

Soninha adorava apimentar as fofocas dos outros, mas quando o assunto era consigo, ela se esquivava, fechava-se em si de tal forma que ninguém ouvia uma palavra a seu respeito do passado, do presente ou do futuro. Esse comportamento dela era característico de sua personalidade.

Muitas vezes em mesa de bar ou em festa cerimonial: batizado, casamento, aniversários, ela se sentava à mesa com os colegas de profissão e começava a instigar um e outro para falar mal de terceiros só pelo prazer de ouvir um detonando o segredo do outro pelas costas, para depois confrontá-los na cara quando junto estivessem para provocar atritos e bate-bocas.

Depois de tomar umas e outras os colegas iam abrindo o bico e começavam a baixar o cacete nos outros ausentes à festa: “Fulano é chato, não vale o que o gato enterra”. “Sicrano não gosta de fulano porque ele é intragável, insuportável, alma sebosa.” “Maria de Jesus é casada com José, mas dá o priquito ao patrão que lhe dar de tudo do bom e do melhor.” “O pai e a mãe de Antônio e Zefa só querem ser as pregas de Odete, mas ele é veado e ela é sapatona e ninguém da família sabe por que eles abafam “o segredo.”

Depois de tomar dois copos de cerveja e uma caipirosca, Soninha escancarava os segredos e confissões cabeludas ditas a ela pelos colegas de forma confidencial. Ela tinha o prazer mórbido de revelá-los na cara dos colegas, dando altas gargalhadas sem se importar com o constrangimento dos envolvidos, e depois saía de fininho, assistindo a confusão à distância se rindo de se mijar.

Certa ocasião Soninha estava numa festa de casamento com vários colegas e, lá para tantas, ela sentou-se na ponta da mesa com vários colegas que conheciam o noivo, e, às costas dele, tinham-no detonado em outras ocasiões sem a noiva saber. Lá para as tantas, depois de ter tomado dois copos de cerveja e duas caipiroscas de caju e limão, sua bebida preferida, juntou-se a todos que estavam em redor da mesa e mandou chamar a noiva, que era sua amiga. Quando a noiva chegou, Soninha a mandou sentar-se para dar os parabéns pelo casamento e depois abriu o bico e começou a contar os podres do agora marido, revelados pelos colegas ali presentes.

A confissão foi tamanha que a recém-casada começou a chorar, mandou chamar o marido, perguntou se tudo aquilo era verdade sobre a história da viadagem dele. Foi quando o agora marido procurou saber quem revelou seus segredos de baitolagem para a noiva e quis tirar satisfação com quem os revelou. Como não apareceu quem espalhou os boatos que a mulher havia sabido, o marido entrou em fúria, começou a quebrar as mesas, cadeiras e o que lhe tivesse pela frente. Dez minutos depois de iniciado o quebra-quebra, não havia ninguém na festa, e até a recém-casada havia saído correndo segurando o vestido para não tropeçar nele e cair.

Enquanto o buruçu comia no centro dentro e fora da casa, com o recém-casado quebrando tudo, procurando tirar satisfação e saber quem espalhou o boato da sua vida pregressa, Soninha saiu à francesa dando altas gargalhadas sem ninguém saber que tudo havia começado com ela que espalhou os podres do agora marido da amiga para todo mundo saber.

Soninha não tinha jeito. Sempre aprontava as suas e jogava os colegas na fogueira da intriga.

10 pensou em “SONINHA IMPREVISÍVEL

  1. Cícero, por via das dúvidas: Soninha tinha mais amigos ou inimigos? Ou ela capaz de permanecer incógnita com essas tramoias?

    • Obrigado mestre Maurício pelo comentário.

      Como era muito habilidosa Soninha não deixava rastro das futricas e cizânias inventadas e sempre se saia bem.

      Aliás, ela era a “conselheira de todo mundo.”

      Era formada em filosofia pela UFPE!!!

      Quem sabe se o mestre não foi professor de alguma cadeira paga por ela?

  2. Todo interior tem uma Soninha.
    Lá no meu tinha uma bicha enrustida que, eu ia lendo o seu texto e vendo o danado na descrição de Soninha.
    Fez muitas intrigas.

    • Jesus de Ritinha de Miúdo, obrigado pelo comentário.

      Soninha adorava viajar pelos interiores para colher histórias de matutos e pô-los também em enrascadas.

      Todas as vezes que ela viajava para Brejo da Madre de Deus, onde tinha família, ela aprontava e muitas futricas e sempre se saia ilesa!

      Era impressionante sua capacidade de sarrar dos outros sem os prejudicar. Pena ela não ter deixado nenhum livro escrito porque ela era vendedora de roupas e viajava muito para São Paulo. Não tinha tempo de escrever!…

      Mas eu vou consultar a família. Se ela deixou algo escrito a gente publica.

      Gostaria que o nobre poeta escreve algumas coisas a sobre histórias hilárias envolvendo seu nome.

  3. Parabéns pelo texto, amigo Cícero. Eu só espero que Soninha acompanhe nossas reuniões lá de cima pq sei que ela iria adorar fazer parte da nossa curriola. Suas memórias muito nos encantam.

  4. Neto, meu estimado comentarista, sou seu fã de carteirinha!

    Obrigado pelo comentário.

    O nobre professor é uma espécie de MAZAROPPI do Cabaré do Berto e do Jornal da Besta Fubana. Pena não ter uma coluna!!!

    Possui uma presença de espírito engraçada no Cabaré. Está além do mordomo.

    Eu às vezes fico pensando que Soninha vive me dando alguns puxões de orelha por faltar algumas reuniões do Cabaré do Berto.

    Quando aparecia qualquer folga na agenda dela ela tocava para o interior e ia beber na fonte dos matutos.

    Tinha uma presença de espírito extraordinária! Adorava o Nordeste! A filha que ela deixou está seguindo os passos da mãe!

  5. Parabéns pelo texto hilário e verdadeiro, querido cronista Cícero Tavares!

    Soninha é o retrato da mulher mal amada, recalcada e invejosa, que não suporta ver ninguém feliz.
    O mundo está cheio de “Soninhas”, que se divertem, fazendo intrigas e praticando injúrias. Falam
    de todo o mundo e até delas próprias!!!kkkk

    Grande abraço, e tudo de bom!

    • Querida cronista do coração, a Dama das Crônicas do Jornal da Besta Fubana, Soninha era mesmo inteligente, o que prova que ela aprontava todas e saia incólume sem os colegas saberem que ela era a mentora dos boatos.

      Formada em filosofia pela UFPE, era uma manipuladora nata. Embaralhava tudo e depois saía-se como se nada tivesse acontecendo.

      Não tivesse ela se apaixonado por negociar com roupas tínhamos tido uma filósofas de mão cheia para satirizar com todo mundo.

      Uma coisa que mais me admirava nela: nunca procurou fazer as presepadas dela por maldade.

      Tudo era feito para ela se divertir. De onde vinha essa ânsia de diversão, só mesmo procurador um especialista.

      Forte abraço, Violante Pimentel e obrigado pela apreciação da leitura.

      Não tivesse se encantado cedo, Soninha era colunista do JBF.

  6. Querido Amigo Ciço.

    Como sempre o talento e a grande capacidade de saber contar uma boa estória
    é sempre previsível na sua coluna. , Posso afirmar pelos nossos ” papos ”
    de longa duração, da sua criatividade e sua enciclopédica inteligência.
    Não é para menos, pois quem foi rei, nunca perde a majestade e seu reinado
    criativo tem muitos cadernos e livros já bibliotecados aguardando uma
    produção oportuna.

    Já desfrutei , com muita alegria da sua generosa companhia, nos textos
    que me alegraram e me envaideceram demais, porem nem todos entenderam
    que como aluno, estava apenas homenageando o mestre, sem nenhum
    sentido de vaidade.

    Peço permissão para um comentário oportuno:

    Nesta multidão de grandes talentos que dão a sua generosa contribuição
    para o sucesso deste grande Jornal, tenho notado que os colunistas, agora
    cada vez mais politicos, estão em grande forma, com textos cada vez mais
    oportunos, inteligentes, analíticos, contribuindo grandemente para uma
    informação correta. É claro que não podemos dizer o mesmo para os
    fanáticos ignorantes esquerdistas que tudo fazem para destruir um]
    país que certo ou errado, pede socorro e pelo nosso apoio.
    Hoje mesmo conversei com alguns amigos nos EE.UU, os quais estão
    desolados com a onda esquerdistas, Obâmica que tomará posse amanhã e
    que eles estão certos, eu também, dentro de no máximo dois anos a
    os EE.UU. serão apenas mais um capacho da China.
    Vão receber um presente de Bandeja.

    PS. Vai sobrar para nós também, sem dúvida.

  7. Mestre, todo as vezes que o mestre se pronuncia com seus comentários inteligentes e sábios a respeito dos meus textos, sinto-me tão honrado que a emoção primazia a razão.

    Uma das maiores bondades que o Jornal da Besta Fubana nos proporcionar e fazer amigos que nos prestigiam à distância sem em troca ter os textos escritos por nós com todo carinho do mundo.

    Brevemente com chamá-lo honrosamente a escrevermos juntos um texto sobre a qualidade de o Leopardo, um dos maiores filmes da história do cinema, de Luchino Visconti.

    Obrigado, amigo do coração pela nossa amizade e comentário, o JBF, na pessoa do seu editor Luiz Berto e de todos os que amam a arte do bem viver e respeitar a boa convivência, agradecemos.

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