MARCELO BERTOLUCI - DANDO PITACOS

Certa vez um jornalista português disse “Nesse país, o bom não é ser ministro. É ter sido.” Nessa ex-colônia do lado de cá do Atlântico, vale o mesmo, e não apenas para ministros. Ter sido deputado, ou prefeito, ou professor de universidade, ou cantor famoso, ou campeão de futebol, ou participante do Big Brother vale como uma licença vitalícia para falar bobagem.

Li na imprensa uma declaração do ex-ministro Raul Jungmann, reclamando dos novos decretos do governo sobre a compra e posse de armas:

“Ao longo da história, o armamento da população serviu a interesses de ditaduras, golpes de Estado, massacre e eliminação de raças e etnias, separatismos, genocídios e de ovo da serpente do fascismo italiano e do nazismo alemão”

Gostaria de perguntar ao jornalista imbecil que publica sem questionar uma frase como essa quais exemplos ele conhece de ditaduras que armaram a população. Para o ex-ministro, não vale a pena perguntar, é claro. Ele sabe perfeitamente que está mentindo, tanto quanto tem a certeza da impunidade. Dizer que o fascismo italiano e o nazismo alemão promoveram o armamento da população é de uma desonestidade tão abjeta que qualquer jornalista deveria se sentir obrigado a desmentí-la. Mas nesse país jornalistas não contestam, apenas publicam qualquer coisa que um ex-ministro, ex-jogador de futebol ou ex-celebridade da revista Caras diga.

Algum tempo atrás, em um site americano sobre cinema, li um sujeito, aparentemente europeu, queixando-se que os filmes “made in USA” refletiam uma sociedade “obcecada por armas”. Em resposta, outro sujeito escreveu: “Sim, nós cidadãos dos EUA gostamos muito de armas. Acontece que no século 20 mais pessoas foram mortas por seus próprios governos do que em todas as guerras que aconteceram. E um povo só pode evitar tornar-se vítima do governo se possuir uma arma para se defender.”

Fiquei tão curioso com a afirmação que fui pesquisar os números. Sim, ele está certo. A Primeira Guerra Mundial matou vinte milhões, a Segunda matou mais setenta. Segundo alguns autores, a revolução comunista na China matou cinquenta milhões de pessoas, e a revolução russa, mais sessenta. E em termos proporcionais, nenhuma guerra na história chega perto do Khmer Vermelho no Camboja, que matou aproximadamente 40% da população do país – do seu próprio país.

Todos as “ditaduras”, “golpes”, “massacres” e “genocídios” de que o ex-ministro fala foram precedidos de desarmamento da população. Uma população armada e disposta a defender sua liberdade não será nunca vítima de opressão, por uma simples questão numérica: como um pretendente a tirano vai reunir um exército maior que a população do país?

Dizem que pouco antes do início da Segunda Guerra, um general alemão conversava com um militar suíço. “Quantos homens vocês têm?”, perguntou ele. “Quatrocentos mil”, foi a resposta. “E se vocês forem atacados por um exército de oitocentos mil soldados?”, provocou o alemão. “Cada um dos nossos soldados terá que atirar duas vezes”, respondeu o suíço. A Suíça não foi atacada durante a guerra, como já havia acontecido em muitas outras guerras. Não foi por sorte: os Suíços têm uma longa tradição de estarem sempre prontos a defender sua terra e a si mesmos. Aliás, em tempos antigos, as eleições eram realizadas nas praças, e só votava quem portasse uma espada. Quem não estivesse preparado e disposto a defender o país não tinha o direito de dar palpite.

Claro que por aqui essa discussão é imaterial. Nenhum brasileiro acha que o povo deve defender-se de governos tirânicos, muito pelo contrário. O povo daqui reclama quando acha que o governo não está sendo tirânico o suficiente, ou está concedendo liberdade demais. O brasileiro acredita que faz parte de um povo que é inerentemente imaturo e irresponsável, e que deve ser vigiado, guiado e controlado em tudo que faz. Nenhum brasileiro considera a hipótese de portar uma arma para defender-se da tirania, ao contrário: acha que a posse de uma arma é uma generosa concessão do governo, que só deve acontecer se o cidadão, mansamente, se submeter a todas as exigências, burocracias e cadastros.

O ex-ministro pode ficar tranquilo: o cidadão de bem vai comprar seu Taurus de calibre obsoleto, guardá-lo descarregado no fundo de uma gaveta trancada a chave, e continuar obedecendo às ordens do governo.

17 pensou em “SOBRE ARMAS, MENTIRAS E IMBECIS

    • Mesmo não sendo necessária, a autorização está dada…

      Qualquer um que escreve, mesmo que simples pitacos, fica feliz quando vê suas palavras inspirarem alguém.

  1. Marcelo, uma correção: toda regra tem exceção. Sou professor universitário e não me sinto enquadrado no rol dos que falam bobagens. Como eu, há inúmeros outros que pensam soluções para o Brasil. No dia que deixar de ser, continuarei com minhas convicções, mas não entendam que elas são bobagens. O Rodrigo de Leon é outro professor universitário que não fala bobagens; Arael Costa da mesma forma, o Rômulo Angélica é outro cara com luz própria e estou citando alguns poucos que visitam o JBF. Tem inúmeros outros por ai, inclusive, alguns teus porque, em tese, como você tem opiniões que não são bobagens, elas podem ter vindo de um não bobo que foi teu professor.
    Raul Jugmann é um pavão, um cara vaidoso que, de fato, só diz e só faz merda. Mas, não generalize. Socrátes foi um ex-jogador que mudou paradigmas no Corínthias. Não acho que era um bobo.

    • Maurício, estou me sentindo um pouca-prática. Não tive a intenção, de forma alguma, de dizer isso que você sugeriu.

      Meu texto partiu de um fato específico – a bobagem dita pelo Jungmann, que na minha modesta opinião jamais poderia ser publicada sem um adendo explicando que se trata de uma canalhice, por respeito a quem não teve acesso a informação suficiente para julgar por si só. E partindo deste fato específico, critiquei a imprensa que louva e obedece a qualquer um que tenha uma credencial qualquer para mostrar, sem avaliar ou questionar o que está sendo dito.

      Infelizmente, vivemos no país da carteirada e do “você sabe com quem está falando?”. Nossa imprensa subserviente têm grande parte da culpa. Se dei a entender que acho que todo ex-professor, ou ex-ministro, ou ex-qualquer coisa fala bobagens, desculpo-me novamente.

    • Maurício, sou admirador seu, mas tendo a discordar quanto ao Sócrates. Grande jogador, sem dúvida. Mas com a “democracia corontiana” não levou o time a lugar nenhum. Três pífios títulos paulistas. Ele, Casagrande, Vladimir, etc, não tem um título brasileiro, mundial, etc. E, pelo lado pessoal, como médico, não foi exemplo para no ninguém , enveredando pelo alcoolismo até a morte, por hemorragia hepática. Já Casagrande, que não fala coisa com coisa, com problemas de dicção terríveis, é um sobrevivente do mundo das drogas. Ou seja, mudanças de paradigmas, a meu ver, questionáveis para funcionários de clube que eram. Talvez rebeldes. Tranformadores, nunca. Nem com o talento que tinham
      Forte abraço

  2. Caro Marcelo
    Dentre lembranças, bobagens e outros senões, este velho professor universitário recorda diálogo que se diz ter havido entre os Almirantes japoneses, que entusiasmados com o êxito da incursão sobre Pearl Harbour, propunham prosseguir com a ofensiva, mandando que a frota rumasse para a costa oeste dos Estados Unidos, dando início à pretendida invasão do continente.
    Foram rebatidos, sem contestação, pelo Almirante Yamamoto, que simplesmente lembrou aos presentes o volume da resistência, dizendo “lembremo-nos de que todo americano possui arma e sabe usá-la. Imaginem o tamanho do exército que vamos enfrentar”.
    Como não podia deixar de ser, foi água na fervura e a esquadra momentaneamente vitoriosa regressou a suas águas…

    • Boa lembrança, Arael.

      Acho que existe uma diferença importante, em termos de “pensamento coletivo” (na falta de uma expressão melhor), entre os povos que se vêem como senhores de seus destinos e os que se vêem como súditos de um poder. É um assunto sobre o qual tenho meditado bastante.

      Os grandes exemplos do primeiro caso são os EUA e a Suíça, e não é por acaso que ambos nunca foram invadidos.

      Já a América Latina, por exemplo, herdou o modelo ibérico de “estado forte”, onde a mentalidade é de obediência ao estado acima de tudo.

      O Japão, de uma maneira diferente, seguia a mesma linha; a devoção ao imperador era quase religiosa, e o Yamamoto foi muito corajoso ao se opor à maioria que acreditava, por “dever patriótico”, que seu país era invencível.

      Por aqui, uma sumidade qualquer, tempos atrás, referiu-se à segurança pública não como “dever do estado” mas como “monopólio do estado”, implicando que as pessoas devem ser impedidas de agir em defesa própria ou de sua família, para não ofender o monopólio estatal. E essa opinião estúpida foi repetida por toda a imprensa, sem um pio de questionamento.

    • Arael, esse fato está num livro de Teoria dos Jogos, de Ronaldo Fiani.

      Marcelo, sem problemas. Agora, numa próxima coloca “alguns”….

    • Prof. Arael, apenas lembrando, estudioso e curioso da Segunda Guerra que sou que o Japão falhou terrivelmente em Pearl Harbour ao deixar intactos, literalmente, os depósitos de combustíveis da frota americana, os quais ficavam ao lado das docas. Nem uma bombinha de São João foi lançada lá. Bastava uma e o inferno estaria instalado. Imobilizaria a frota do Pacífico por seis meses, no mínimo, segundo estudos.

  3. Marcelo,
    Bons profissionais, em qualquer área da atuação humana, são raríssimos de serem encontrados, podendo hoje serem comparados com o “achar virgens em bordel”…

    Professores universitários que não falam bobagens: Maurício Assuero, Rodrigo de Leon, Arael Costa, Rômulo Angélica.

    Sancho, “você sabe DE QUEM está falando?”.

    Má é craru qui çei! Esses cabras são o que de melhor há em termos de intelecualidade acadêmica. Uma pena que a IMENSA MAIORIA, dos que com eles comungam a arte de formar profissionais em diversas áreas, são didadó.

  4. Considerar a a fala de alguém, uma bobagem, depende do gosto do ouvinte, se falar o que ele não gosta e não concorda , a fala passa a ser considerada bobagem, mesmo que dita por professor, militar, padre , o papa ou especialistas de programas de televisão. kkkkkk

    • Em termos, Paulo. Existem opiniões e existem fatos. Fatos não dependem do gosto do ouvinte.

      Por exemplo, desarmar a população foi uma das primeiras medidas tomadas tanto por Hitler quanto por Mussolini quando chegaram ao poder, exatamente ao contrário do que o Jungmann afirma. É um fato histórico documentado.

      Sem contexto, pode até parecer um erro inofensivo. Dentro do contexto político atual, é uma apelação politiqueira de baixíssimo nível, mas quanto a isso concordo que alguns podem até gostar.

      • Caro Paulo,

        Tua fala acima endossa uma das maiores canalhices praticadas pelas esquerdas: O RELATIVISMO!

        A VERDADE NÃO É RELATIVA !!!

        FATOS SÃO FATOS !!!!

        Esse negócio de ficar torcendo a realidade dos fatos a fim de justificar todo tipo de patifarias praticados pelas esquerdas, na sua eterna luta pela famigerada HEFGEMONIA, é, simplesmente, aceitar esta cachorrada.

        NÃO FAÇA ISSO NÃO !

  5. O que é isso professor Adônis ,não tentei torcer verdade nenhuma, apenas externei minha opinião de que a maioria dos seres humanos preferem ouvir o que seja de seu gosto e agrado, tanto no campo da política , da musica ou, até da vaidade. . Não quis ser relativista, sofista, ou qualquer outro “ista”. Apenas fiz um simples comentário na publicação do Marcelo., sem querer polemizar com ninguém, muito menos , com o senhor.. Recolha os canhões professor, não desperdice munição com quem não quer lutar. Aqui na Besta, só quero aprender e dar meus pitacos sem ofender ou ser ofendido. .( Cada homem tem seu gosto, alguns preferem sal, outros pimenta, eu prefiro mulheres) Charlie Harper.

    • Prezado Paulo,

      Tenho-lhe um profundo respeito e estima. Desculpe-me o jeito truculento.

      Minha ira foi contra a sua afirmativa de que os fatos são bobagens em função do gosto de quem escuta. Isso é tudo o que os esquerdinhas desejam ouvir.

      Os fatos são bobagens simplesmente PORQUE SÃO BOBAGENS! Não devido à interpretação que lhes dão, ou às narrativas que criam, seja por que motivo for.

      Um grande abraço e releve o meu linguajar canhestro, para que possamos ter sempre as suas abalizadas opiniões.

      Grande abraço.

  6. Estimado Carlos
    Efetivamente você tem razão.
    Faltaram soa japoneses algumas informações prévias que deveriam ter sido levantadas, pelo que se dizia existir nas ilhas havaianas, que seria um perfeito serviço de informações a cargo de japoneses radicados por lá.
    Poupar os depósitos de combustíveis foi grande erro, mas a isto podia ser remediado pela capacidade de reabastecimento que as frotas americanas possuíam, como mostraram de pronto. Afinal, mesmo com os depósitos de combustíveis intactos, o abastecimento da frota, nos portos havaianos, foi impossibilitado em virtude da inoperância destes, pois os destroços navais impediam o acesso aos canais de acostagem.
    O grande erro japonês ou o golpe de sorte dos americanos foi a incolumidade dos porta-aviões, em manobra em alto-mar.
    Nós bem sabemos que, notadamente pela filosofia que àquela época o comando naval norteamericano já adotada, porta-avião não opera sozinho. Ele é o centro de uma força-tarefa autosuficiente, inclusive em manutenção e abastecimento.
    E foi essa força-tarefa que, durante bom tempo, aguentou o tranco.
    Você tem razão, pois a falta de combustível, seria mais um complicador.

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