Esta ciência sem par
De transplante, trouxe um meio,
Que a pessoa pode amar
Com o coração alheio.
Meu benzinho interesseiro
Me deixou, sem piedade,
Quando acabou meu dinheiro
Se acabou nossa amizade.
Ao amor nasci propenso,
Só nele tenho pensado
E tanto pensei, que penso
Que dele fui dispensado.
Não farei o teu desejo,
Te dando versos, Maria,
Pois, em teus olhos eu vejo
Dois livros de poesia.
Quando, raivosa, te exaltas,
Com grosseiras atitudes,
Acusas as minhas faltas
E esquece minhas virtudes.
Me negaste o teu carinho
E hoje eu vejo o resultado,
É melhor andar sozinho
Do que mal acompanhado.
Segue o tempo o seu caminho,
Um dia vai outro vem,
Roubando assim, de pouquinho
A beleza do meu bem.
Ser poeta é ter paixão,
E sentir da dor o espinho,
Ter tudo no coração
E viver sempre sozinho.
Antônio Gonçalves da Silva (1909-2002), mais conhecido como Patativa do Assaré, foi um poeta popular, compositor, cantor e repentista brasileiro. O cearense de Assaré teve sua obra registrada em folhetos de cordel, em discos e livros. Aos 16 anos, comprou sua primeira viola e começou a cantar de improviso. Com uma linguagem simples, porém poética, registrava a vida sofrida e árida do povo do sertão. Projetou-se com a música “Triste Partida” em 1964, uma toada de retirantes, gravada por Luiz Gonzaga, o Rei do Baião. Seus livros, traduzidos em vários idiomas, foram temas de estudos na Sorbonne, na cadeira de Literatura Popular Universal.
O artigo presta uma homenagem muito justa ao grande poeta cearense Patativa do Assare (1909 – 2002). A poesia de Patativa inspirou não apenas escritores, mas também músicos, sobretudo os cantadores do nordeste, contribuindo assim imensamente para a música popular brasileira. A característica principal de seu trabalho é a oralidade: o poeta transferia a palavra para o papel tal qual ela era falada pelo homem simples.
Vitorino,
Grato por seu comentário com observações importantes sobre a poesia desse talentoso poeta cearense. Aproveito esse espaço democrático do Jornal da Besta Fubana para compartilhar um belo poema de Patativa do Assaré (1909-2002) com o prezado amigo:
O Poeta da Roça
Sou fio das mata, cantô da mão grosa
Trabaio na roça, de inverno e de estio
A minha chupana é tapada de barro
Só fumo cigarro de paia de mio
Sou poeta das brenha, não faço o papé
De argum menestrê, ou errante cantô
Que veve vagando, com sua viola
Cantando, pachola, à percura de amô
Não tenho sabença, pois nunca estudei
Apenas eu seio o meu nome assiná
Meu pai, coitadinho! vivia sem cobre
E o fio do pobre não pode estudá
Meu verso rastero, singelo e sem graça
Não entra na praça, no rico salão
Meu verso só entra no campo da roça e dos eito
E às vezes, recordando feliz mocidade
Canto uma sodade que mora em meu peito
Saudações fraternas,
Aristeu
Sou leitor das poesias de Patativa do Assaré, e vejo com alegria este tributo ao grande poeta popular, compositor, cantor e repentista. os aspectos temáticos da sua obra são: a pobreza e o sofrimento do sertanejo, a felicidade e o infortúnio, o bem e o mal, o sertão e a cidade, o latifúndio e o agregado, o retirante, o social e o político, a ética e a honestidade, o perdão e a grandeza, a fé em Deus e na religião.
Messias,
Muito obrigado pelo comentário abordando os temas da obra de Patativa do Assaré (1909-2002). No Jornal da Besta Fubana, aprendemos uns com os outros. Gentileza gera gentileza, então compartilho um belo poema do talentoso Patativa do Assaré:
A terra é nossa
A terra é um bem comum
Que pertence a cada um.
Com o seu poder além,
Deus fez a grande Natura
Mas não passou escritura
Da terra para ninguém.
Se a terra foi Deus quem fez,
Se é obra da criação,
Deve cada camponês
Ter uma faixa de chão.
Quando um agregado solta
O seu grito de revolta,
Tem razão de reclamar.
Não há maior padecer
Do que um camponês viver
Sem terra pra trabalhar.
O grande latifundiário,
Egoísta e usurário,
Da terra toda se apossa
Causando crises fatais
Porém nas leis naturais
Sabemos que a terra é nossa.
Saudações fraternas,
Aristeu
Parabéns, prezado Aristeu, pela excelente postagem, “QUADRINHAS DE PATATIVA DO ASSARÉ”!
Esse poeta popular cearense, compositor, cantor e repentista, Antônio Gonçalves da Silva, conhecido como Patativa do Assaré (1909 – 2002), é inigualável.
Sua estreia, aos 16 anos, tocando viola e fazendo improvisos, foi um prodígio. Sua música “Triste Partida (1964), gravada por Luiz Gonzaga, se eternizou.
Como você disse, “Seus livros, traduzidos em vários idiomas, foram temas de estudos na Sorbonne, na cadeira de Literatura Popular Universal. ”
Ele foi um verdadeiro fenômeno!
Das quadrinhas de Patativa do Assaré, selecionadas por você, destaco:
Me negaste o teu carinho
E hoje eu vejo o resultado,
É melhor andar sozinho
Do que mal acompanhado.
Uma ótima semana, cheia de saúde e Paz!
Violante Pimentel Natal (RN)
Violante,
Agradeço suas considerações sobre Patativa do Assaré (1909 – 2002). A vida prometia ser injusta para o pequeno lavrador Antônio Gonçalves da Silva, morador da pequena Assaré, no Ceará. Do mesmo modo que para milhares ou milhões de moradores do sertão árido do Nordeste. Ainda menino, uma doença lhe tirou a visão de um dos olhos. Aos 8, viu-se obrigado a pegar na enxada para ajudar no sustento da mãe e dos irmãos, após a morte prematura do seu pai. Somente aos 12, durante alguns meses, frequentou a escola local. Foi o suficiente, porém, para alfabetizá-lo.
Antônio tinha um dom raro, daqueles que não se explicam à luz da razão: começou a fazer repentes e a se apresentar em festas e ocasiões importantes. Por fim, aos 20 anos, ganhou o pseudônimo de Patativa porque sua poesia era comparável à beleza do canto dessa ave.
O Brasil ouviu falar de Patativa graças ao poema “A triste partida”, que ele mesmo musicou e Luiz Gonzaga gravou em 1964. A letra falava da saga de uma família que, depois de perder todas as crenças, troca a seca por São Paulo “para viver ou morrer”, mas com uma certeza: de um dia voltar Compartilho o famoso poema de Patativa do Assaré com a prezada amiga:
.A TRISTE PARTIDA – Patativa do Assaré
Setembro passou, com oitubro e novembro
Já tamo em dezembro.
Meu Deus, que é de nós?
Assim fala o pobre do seco Nordeste,
Com medo da peste,
Da fome feroz.
A treze do mês ele fez a experiença,
Perdeu sua crença
Nas pedra de sá.
Mas nôta experiença com gosto se agarra,
Pensando na barra
Do alegre Natá.
Rompeu-se o Natá, porém barra não veio,
O só, bem vermeio,
Nasceu munto além.
Na copa da mata, buzina a cigarra,
Ninguém vê a barra,
Pois barra não tem.
Sem chuva na terra descamba janêro,
Depois, feverêro,
E o mêrmo verão
Entonce o rocêro, pensando consigo,
Diz: isso é castigo!
Não chove mais não!
Apela pra maço, que é o mês preferido
Do Santo querido,
Senhô São José.
Mas nada de chuva! tá tudo sem jeito,
Lhe foge do peito
O resto da fé.
Agora pensando segui ôtra tria,
Chamando a famia
Começa a dizê:
Eu vendo meu burro, meu jegue e o cavalo,
Nós vamo a São Palo
Vivê ou morrê.
Nós vamo a São Palo, que a coisa tá feia;
Por terras aleia
Nós vamo vagá.
Se o nosso destino não fô tão mesquinho,
Pro mêrmo cantinho
Nós torna a vortá.
E vende o seu burro, o jumento e o cavalo,
Inté mêrmo o galo
Vendêro também,
Pois logo aparece feliz fazendêro,
Por pôco dinhêro
Lhe compra o que tem.
Em riba do carro se junta a famia;
Chegou o triste dia,
Já vai viajá.
A seca terrive, que tudo devora,
Lhe bota pra fora
Da terra natá.
O carro já corre no topo da serra.
Oiando pra terra,
Seu berço, seu lá,
Aquele nortista, partido de pena,
De longe inda acena:
Adeus, Ceará!
No dia seguinte, já tudo enfadado,
E o carro embalado,
Veloz a corrê,
Tão triste, o coitado, falando saudoso,
Um fio choroso
Escrama, a dizê:
– De pena e sodade, papai, sei que morro!
Meu pobre cachorro,
Quem dá de comê?
Já ôto pergunta: – Mãezinha, e meu gato?
Com fome, sem trato,
Mimi vai morrê!
E a linda pequena, tremendo de medo:
– Mamãe, meus brinquedo!
Meu pé de fulô!
Meu pé de rosêra, coitado, ele seca!
E a minha boneca
Também lá ficou.
E assim vão dexando, com choro e gemido,
Do berço querido
O céu lindo e azu.
Os pai, pesaroso, nos fio pensando,
E o carro rodando
Na estrada do Su.
Chegaro em São Paulo – sem cobre, quebrado.
O pobre, acanhado,
Percura um patrão.
Só vê cara estranha, da mais feia gente,
Tudo é diferente
Do caro torrão.
Trabaia dois ano, três ano e mais ano,
E sempre no prano
De um dia inda vim.
Mas nunca ele pode, só veve devendo,
E assim vai sofrendo
Tormento sem fim.
Se arguma notícia das banda do Norte
Tem ele por sorte
O gosto de uvi,
Lhe bate no peito sodade de móio,
E as água dos óio
Começa a caí.
Do mundo afastado, sofrendo desprezo,
Ali veve preso,
Devendo ao patrão.
O tempo rolando, vai dia vem dia,
E aquela famia
Não vorta mais não!
Distante da terra tão seca mas boa,
Exposto à garoa,
À lama e ao paú,
Faz pena o nortista, tão forte, tão bravo,
Vivê como escravo
Nas terra do su.
Desejo uma semana plena de paz, saúde e alegria
Aristeu
Obrigada, Aristeu, por compartilhar comigo este belíssimo poema, do grande poeta Patativa do Assaré, e por ele musicado.
“A Triste Partida” se eternizou, também, na voz do inesquecível Luiz Gonzaga, que, por coincidência, também perdeu um. olho, mas já adulto.
Patativa do Assaré foi um predestinado!!! Conheceu muito sofrimento, mas chegou ao mais alto patamar da cultura popular!!! ,
Adorei o poema!
Para você também, uma semana plena de paz, saúde e alegria!
Violante