JOSÉ RAMOS - ENXUGANDOGELO

O pau que dá em Chico, dá em Francisco? Nem tanto. Poderia ser mas, hoje, por conta da diversidade cultural deste País continental, que tem as “porteiras” abertas para pessoas com diferença de raça, credo e entendimento, não há como acreditar em “tudo linearmente, com a mesma facilidade de entendimento e prática.”

E isso, aqui e alhures, em todos os polos do planeta, contando ainda com a mudança climática, a cultura de vida a facilidade e o alcance dos apoios que a tecnologia oferece e, no somatório, transforma num peso importante e decisivo para a nossa forma de vida.

A Antropologia + Sociologia que compõem as mais variadas formas de “políticas públicas e urbanas” mundo à fora, acabaram fazendo com que, o hoje, seja diferente do ontem, e esses dois, mais diferentes ainda, do amanhã. É arriscado apostar na perseverança das coisas – deixando de lado, claro, a questão da religiosidade.

Dito isso, continuo acreditando que, “tudo de bom, ou tudo de ruim” que de alguma forma nos encaminha para as boas ou más ações, tem uma nascente única: dentro de casa, na família e por conta da saturação dessa, se as coisas não caminharem bem; ou, também, dentro de casa, graças ao “domínio dos gestores domésticos”, se tudo acontecer como todos desejamos que aconteçam.

É ali, na família, onde tudo começa. O bom, ou o bem; e o mau ou o mal.

A infância atual caga para o mundo

A boa e apropriada terra, preparada e cuidada, vai produzir boa plantação e melhor colheita. Isso é fato. É bíblico. Não poderia ser diferente o resultado com o ser humano, cuidado e preparado na infância com boas maneiras e ações que levem à uma boa vida (nesse caso, a colheita). Entre esses bons e eficientes “cuidados” com a infância, entre os mais positivos está o “brincar”.

Trocentos anos atrás, por conta da falta de dinheiro e por melhor entendimento da vida, pais e mães até incentivavam os filhos para a brincadeira sadia e construtiva que proporcionasse melhor e frutífero convívio social – e isso produzia uma resposta social maravilhosa.

A brincadeira semeava a convivência. Criava não apenas os anticorpos da defesa humana, como edificava o convívio social para uma vida de Paz e harmonia, tanto em meio a família, quanto num futuro, fora dela. Mas, na construção de uma nova família – era o “crescei e multiplicai-vos”.

Os pais brincavam junto, ensinavam a brincar e a fabricar os próprios brinquedos, imaginando que, daquela forma, os filhos se apegassem mais ao que faziam, por aprenderem as dificuldades que enfrentavam.

Brincando de forma saudável para o convívio e disciplina

Haviam também, o apego ao local apropriado para brincar. E isso levou à disseminação da cultura de “encontro” sem enfrentamento. Pensava-se numa troca de experiências entre as diferentes classes socioeconômicas. Aí surgiram, por necessário, as tais cidades ou parques das crianças. Nada melhor que um domingo no parque.

O progresso social foi de encontro à descoberta da “ludoterapia” (se é que assim poderíamos chamar), um diferente forma de curar, brincando. Ou, integrar, brincando. Método ainda muito utilizado para aproximação e convivência dos Portadores da Síndrome de Down.

A necessidade de defesa que os corpos humanos passaram a demonstrar, levaram à necessidade da criação dos anticorpos – e até Vovó já sabia: meninos e meninas precisam brincar juntos, tendo contato direito com a Terra. No interior onde nasci, alguns teóricos passaram a chamar essa fase de “a festa das lombrigas”.

E, realmente foi algo factual. A bactéria da lombriga entrava junto com o anticorpo. Mais tarde, o purgante de óleo de rícino (mamona) expulsava as lombrigas e aumentavam o sistema imunológico pela permanência dos anticorpos.

O dia da lama proporciona o contato direto com a terra e os anticorpos

As crianças de ontem, claro, não eram anjos. Eram apenas “filhos” – e, ainda hoje, filho não tem defeitos. Principalmente para os pais, esses de hoje, completamente diferentes dos de ontem. Os exemplos, se são bons, serão absorvidos e repetidos. Os maus exemplos, da mesma forma. E aí nunca haverá absolvição.

Pegar uma cadeira pesada, colocá-la diante de um armário de parede, subir e dali retirar uma lata para subtrair uma colherada de leite em pó (que ficará grudado no céu da boca), muitos de nós fizemos. Pegar um grampo de cabelo feminino e tentar enfiá-lo na tomada da eletricidade, outros tantos também fizeram. E, quando muitos fizeram isso, não havia a tecnologia atual, tampouco o atendimento médico tinha a possibilidade da rapidez de hoje.

Depois desse lamaçal um bom banho resolve tudo

O que se depreende atualmente no mundo infantil, é que as mudanças impostas pela convivência social, pelas intempéries ambientais, e, principalmente pelas falhas absorvidas pela educação doméstica com o reforço da deficiência da escolarização, é que, a criança de hoje é diametralmente oposta à criança de ontem – e tudo, repito, começou dentro de casa.

Numa culminância, não há como negar que, entre o céu e a Terra, existe algo além dos aviões de carreira. Se o mundo já não é mais o mesmo, e o ar é rarefeito por conta da falta de saneamento básico e uma absurda produção de lixo orgânico que, ao mesmo tempo contamina o ar, o lençol freático e o que dali evapora vai contaminar também a camada de ozônio, é evidente que, quem está entre o céu e a terra, usufruindo inclusive do alimento produzido nesse ambiente, se não tiver os anticorpos necessários, vai ser pego e contaminado por qualquer “gripezinha”.

20 pensou em “OS MENINOS DE ONTEM

  1. É isso meu caro Ramos: a tecnologia engoliu tudo. Hoje, o vídeo game substituiu barra bandeira, esconde-esconde, pega (na minha terra, toque), queimada, etc. Poses, poses e mais poses desnudas, não apenas das vestes, mas de moral também. Eu bloqueie uma garota de 14 anos pelas fotos que ela postava. Não sei se é um perfil falso, mas “na dúvida, não ultrapasse”.

    • Maurício: infelizmente, sou obrigado a confirmar isso que você escreveu, dizendo: tudo, repito, começa dentro de casa. Estamos num caminho sem volta. O ex-Ministro da Educação, Abraham, nos primeiros dias de assunção, bombardeou: “a juventude não vai para a universidade para estudar. Vai para fumar maconha e fazer sexo, como se não existissem outros lugares para fazer isso.” Falou mentira?

  2. Quando eu conseguir parar de aplaudir este brilhante texto, tentarei comentar algo.

    Dez minutos depois… Pronto, parei de aplaudir.
    Mas (benedicto mas), como poderia esperar Sancho algo diferente de um dos mestres fubânicos? Brasil, é aqui, no JBF, a casa que todos deveriam dar uma espiadinha. Os BBB (Big Brothers do Berto) são phodda!!!
    Gratíssimo fico, caro amigo Ramos por sua inteligência fubânica e seus textos que nos botam a pensar.
    Aproveitei seu texto e dei um pulinho em minha infância, que ficou perdida na poeira do tempo.
    Um beijo em seu coração.

  3. Pois é …..

    Uma das coisas que vejo como mais triste para a criançada, pelo menos nas grandes cidades, é a falta de “terra” e seus espaços na rua para as disputas suadáveis ……

    Era que lá cultivávamos as jogos com bolinhas de gude (buracos na terra), piões, buscavámos os pé de mamoma, os galhos de árvore perfeita para nossas forquilhas do bodoque (estilingue ou atiradeira) e as guerras contra os “inimigos” da rua de cima,,,,,,,,,,

    Ou, como lembrou bem Mauricio Assuero, os espaços para as brincadeiras (ou disputas saudáveis) de barra bandeira, esconde-esconde, pega-pega, queimada, acrescentando também o tradicional futebol e as brinacadeiras de taco…..

    O jogo de bafinha, das pedrinhas, tudo isso nos levava sempre a VALORIZAR os ganhos e perdas dos nossos bens mais valiosos, uma disputa saudável onde;
    – a derrota não passava impune, cobrada com gozações entre nós, a “boa” raiva e a vontade de treinar para a “revanche” e quem sabe conseguir a vitória final na “negra”
    – a vitória era comemorada com as inevitáveis bebedeiras de tubaína, crush ou cerejinha (brasileira e gostosinha)

    Hoje a derrota ou a própria quebra de recordes, nos jogos de videos game não traz consequencia nenhuma,….. Vitórias ou derrotas solitárias….. sem testemunhas…..

    A vitória porque não foi conseguida de maneira saudável, mas depois de inúmeros “resets” e a derrota muito menos pois nem é sentida …….. basta um novo “reset” ……..

    Videos com jogos violentos de guerra e de caçadas, deixa a “morte” como uma coisa banal e sem nenhum sentimento de perda pois são apenas “personagens” ou “desenhos” …..

    Óbvio que este tipo de disputa não pode forjar caráter, bons pensadores, bons raciocinios, valorização do trabalho, do esforço pessoal e de valores que realmente valem ……
    Lealdade, verdade, comprometimento com o grupo, honestidade, compaixão, gratidão e outros

    Infelizmente não tenho a capacidade de organizar minhas escritas de forma leve e coerente para concluir que sem o esforço mental, ou físico, ou do espírito não é possível dar o devido valor ao que efetivamente tem valor ………. e assim vivemos e viveremos …..
    – Reclamando do que não temos
    – Sem valorizar em vivermos e agradecermos o que temos
    – Valorizando aquele que tem em oposição aquele que é ……..

    Difícil o futuro para os que não tem, se não foram forjados pelos que são……..

    Grande José Ramos ……….
    Enxugando gelo …. Que triste ….!!!!

    • Perfeito… Era o chão de terra batida e a sujeira na criança e na roupa (coitadas das mães, que naquela época não possuíam a modernidade das máquinas de lavar) que nos fazia “crescer”. Todo dia era pura alegria… Psicólogo? Nunca nem vi.

      • Sancho: conheci mães que preferiam isso (lavar a roupa na pedra, batendo com um cacete) a serem obrigadas fazer visitas nas cadeias ou casas de correção que não corrigem nada.

  4. Temos bons quando se podia pular em uma poça de água da chuva . Hoje não da nem para andar descalço que a dona da pensão dá bronca . Jose Ramos a muitas colunas atrás mostrou enlatados que faziam a festa da criançada principalmente nas cestas de natais. Saudades da Cica . Arthur lembrou da Crush e da Cerejinha que tomávamos gelada e com groselha . Tudo muda , não tem jeito, o tempo é rápido demais.

    • Joaquim: com certeza, o tempo “avua” mais rápido que avião da Varig ou da Cruzeiro do Sul. E, como o tempo passa rápido, às vezes a gente precisa tentar aproveitá-lo da melhor forma. E foi isso que aconteceu, ontem, comigo. Tivemos alguns problemas no bairro onde moro, com situações que prejudicaram o fornecimento de energia elétrica. Após uma improvisada recuperação a corrente ficou alternando em fases. Preocupado que a energia fosse e não voltasse mais ou demorasse voltar, deixei de revisar o texto da coluna, como faço costumeiramente. Aproveito, agora, este comentário em resposta ao “Seu Quincas”, para pedir desculpas. Li pela manhã e constatei vários erros, principalmente de concordância, que teriam sido corrigidos se tivesse havido a necessária revisão. Peço desculpas!

  5. Valeu, querido amigo do coração, Zé Ramos.

    Relembrei de minha inesquecível infância vivida nos arredores do bairro Santo Antônio, em Carpina, Pernambuco.

    Eram tempos felizes.

    Tempos de pura leveza espiritual, onde a alma brincava sem levar em conta o tempo. O tempo para nós era o somatório da inocência com a alegria.

    Suas crônicas são excelentes por nos trazerem o máximo dessa pureza existentes no interior.

    Parabéns, Amigo do coração!

    • Cícero, isso é coisa de quem um dia foi criança. Criança feliz, criança que apanhava, criança que obedecia, criança que estudava. E, para não fugir à regra daquele tempo, criança que também brigava na rua.

  6. Caro José Ramos vc me transportou para a minha e inesquecível infância. Fiz quase tudo descritp nesta excelente crônica. Eu gostei demais.

  7. Prezado Escritor José Ramos:

    Estou encantada com este texto, “OS MENINOS DE ONTEM”. Aliás seus escritos são geniais.

    Concordo com tudo o que você disse, principalmente no que se refere à responsabilidade da família, na formação do caráter dos filhos. É da família que partem os exemplos a ser seguidos.

    Os meninos de antigamente eram mais felizes do que os de hoje, porque naquela época não havia sobre eles a influência perniciosa do progresso tecnológico, faca de dois gumes. Os pais eram a principal fonte de informação que eles tinham, além das aulas ministradas pela Professora primária.
    E os “psicólogos” eram os próprios pais, que também eram seus melhores amigos..

    Atualmente, o costume dos pais que tem boas condições financeiras, é, logo cedo, colocar as crianças em creches, para poderem trabalhar, As crianças convivem mais com as “tias” das creches e com as Babás, do que com eles. Logo cedo, as crianças tem celular e computador, para não os incomodar. E o diálogo entre pais e filhos torna-se cada vez mais raro.

    Um grande abraço, querido amigo! Muita Saúde e Paz!

    Violante Pimentel Natal (RN)

    • Violante: por isso que, o pau que dá em Xico, nem sempre dá em Francisco. Linearidade não deveria existir nas propostas das políticas públicas, porque somos contingentes diferentes pelas culturas dos nossos antepassados – vindos de diferentes lugares. Aproveito para enviar abraços para Diana e meu “médico preferido”. Para você, o desejo de saúde e Paz para a nossa amizade.

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