JOSÉ DOMINGOS BRITO - MEMORIAL

Marcolino Gomes Candau nasceu em Niterói, RJ, em 30/5/1911. Médico, administrador, meio diplomata e um dos pioneiros da saúde pública no Brasil e no Mundo como diretor-geral da OMS-Organização Mundial da Saúde em seus primórdios (1953 a 1973). Nesse interim foi Ministro da Saúde do Brasil, no Governo João Goulart por 68 dias em 1962.

Diplomado pela Faculdade Fluminense de Medicina, em 1933, e hábil administrador, exerceu cargos de chefia em serviços de saúde em algumas cidades do interior. Em 1938 já ocupava um alto cargo na Secretaria de Saúde, ao mesmo tempo em que ministrava aulas na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Na ocasião pediu ao seu amigo Fred Soper, diretor da Fundação Rockfeller no Brasil, que lhe arrumasse uma bolsa de estudos na Universidade Johns Hopkins, nos EUA, mantida pela Fundação. Foi atendido e partiu junto com a esposa, em 1940, para fazer mestrado na área de saúde pública. Pouco depois os EUA entram na II Guerra Mundial e ele retorna ao Brasil para trabalhar no Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores, na Amazônia, cuidando dos “soldados da borracha”.

Sua competência no serviço levou-o à Superintendência do recém criado SESP-Serviço Especial de Saúde Pública, em 1947, uma agência bilateral (Brasil e EUA), para promover o saneamento da Amazônia e do Vale do Rio Doce, que produziam borracha, minério de ferro e mica, necessários à indústria bélica. Por essa época, a revista “Time” publicou uma reportagem onde aparece seu nome e elogios ao seu trabalho no SESP. Pouco antes, em 1945, ocorreu a Conferência de São Francisco, na Califórnia, que deu origem a criação da ONU-Organização das Nações Unidas. O Brasil e a China foram os únicos países a enviarem médicos para a Conferência, e o fato veio a causar uma mudança radical na saúde do Mundo. Numa conversa informal os médicos Geraldo de Paula Souza e Szeming Sze articularam a criação de uma organização mundial para cuidar da saúde, subordinada a ONU. A proposta foi submetida ao plenário e 3 anos depois estava criada a OMS-Organização Mundial da Saúde. Por essa época, Fred Soper deixa a representação da Fundação Rockfeller, no Rio de Janeiro, para dirigir a OPAS-Organização Pan-Americana da Saúde, em 1947, e mais tarde volta a se encontrar com Candau em Washington para lhe proporcionar novo salto em sua carreira profissional.

Enquanto comandava o SESP, presidiu o Congresso Brasileiro de Higiene; criou a Escola de Enfermagem de Manaus e passou a lecionar no Instituto Oswaldo Cruz, que foi integrado à Fundação Oswaldo Cruz. Em 1950 ingressou na OMS, por indicação de Geraldo de Paula Souza, onde veio assumir a diretoria da Divisão de Organização dos Serviços de Saúde. Após dois anos foi trabalhar com seu amigo Soper na OPAS, em Washington. Com sua habitual diplomacia, ficou encarregado de aprimorar as relações entre a OMS e OPAS. O objetivo era que a OPAS se tornasse uma representação da OMS nas Américas, sem perder sua autonomia.

Ficou 14 meses costurando esta aliança e, em março de 1953, voltou para Genebra para ocupar a diretoria-geral da OMS, numa eleição que contou o apoio de seu antecessor, o psiquiatra canadense Brock Crisholm. Na cerimônia de posse homenageou Geraldo de Paula Souza e contou com a presença do recém-eleito secretário-geral da ONU, o sueco Dag Hammarksjöld, de quem se tornou amigo. Os dois estiveram juntos na África, em 1960, na reestruturação do Congo, que se tornou independente da Bélgica. A OMS ainda engatinhava como organismo da ONU com a finalidade de promover a saúde nos países em desenvolvimento. Contava com um Comitê Executivo composto por 18 países, onde os EUA eram representados por Fred Soper, velho amigo de Candau.

Seus primeiros desafios foram enormes: combater a varíola, a malária e o uso do agrotóxico DDT na agricultura. Para combater a varíola, convidou Donald Henderson, do CDC-Centro de Controle e Prevenção de Doenças, dos EUA, para chefiar o programa, que foi um sucesso. Enquanto esteve à frente da OMS, ampliou de 81 países-membros, 1.500 funcionários e um orçamento de U$ 9 milhões para 138 países-membros, 4 mil funcionários e um orçamento de U$ 106 milhões. Hoje a OMS conta com mais de 7 mil funcionários atuando em 150 países. Candau conseguiu, também, que as diretorias regionais fossem designadas pelos países da região e não mais pela diretoria-geral. Outras conquistas foram alcançadas: definição de protocolos globais de tratamento e vacinação; controle de qualidade de medicamentos, planejamento familiar, cuidados com o uso da energia atômica etc., além da inauguração da nova sede em 1966.

Por um breve período, foi Ministro da Saúde a convite do governo João Goulart, em 1962. Permaneceu no cargo apenas 68 dias, até a queda do regime parlamentarista e retornou á diretoria-geral da OMS. Deixou o cargo em 1973 e alguns países queriam-no para um 5º mandato, mas ele recusou. “Estou velho e preciso dar lugar a uma outra geração”. No mesmo ano a 26ª Assembleia Mundial da Saúde prestou-lhe homenagem reconhecendo-o formalmente Diretor-Geral Emérito da OMS. Em seguida casou-se com Sita Reelfs, uma suíça-holandesa funcionária da OMS, com quem viveu mais 10 anos entre Genebra e Rio de Janeiro até 24/1/1983, quando veio a falecer vitimado por um câncer no pulmão. Como é o costume no Brasil relegar a memória de sua gente a um segundo plano, parece que Candau ficou num plano ainda mais distante, não obstante sua projeção internacional e sua contribuição à saúde no Mundo. Mesmo na Wikipedia consta apenas breve verbete traduzido do inglês.

Sua memória foi salva recentemente com um belo perfil biográfico, escrito por Paulo Lyra e publicado na revista Piauí, nº 171, de dezembro de 2020, de onde foram extraídas parte das informações para esta biografia concisa. O autor conclui o perfil escrevendo: “Em contraste com a sua projeção internacional, a informação sobre Candau no Brasil é quase inacessível”. Tal afirmação estaria mais correta se afirmasse que “é quase inexistente”. Um verbete mais completo sobre legado, em inglês, encontra-se no site do Royal College of Phisicians, que inicia dizendo tratar-se de uma das grandes figuras na medicina no século 20. Clique aqui para ler.

6 pensou em “OS BRASILEIROS: Marcolino Gomes Candau

  1. Excelente você trazer essas duas biografias, mostrando a enorme contribuição de dois brasileiros para o surgimento e consolidação da OMS, uma dos maiores e mais importantes organismos internacionais que existem (apesar do que dizem alguns boçais por aí…)

  2. Cabra bom!!! Queria ter um filho assim!
    A outra biografia referida é a do Dr. Geraldo de Paula Souza, que teve a ideia de criar a OMS, publicada domingo passado.

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