Na Pensão de D. Berta, no Recife, como em várias outras que funcionavam na Boa Vista, eram acolhidos rapazes que vinham do interior de Pernambuco e estados vizinhos para fazer cursos superiores no Recife.
Eram hóspedes, entre outros, nomes que se fizeram notáveis na cena pernambucana. Capiba, Carnera e Ariano Suassuna, que estudavam Direito; João, Marcos e Bráulio Baraúna, cursavam Medicina.
Grande galhofeiro, Carnera sempre zoava dizendo que Bráulio não seria bem sucedido na especialidade de proctologia dado ao avantajado tamanho de seu dedo indicador.
Bráulio diplomou-se e Instalou seu consultório, tornando-se renomado na especialidade. Mas, à boca pequena, se tornou conhecido como o “Terror do Edf. Ouro Branco”, em face das conversas que ouviam pelos corredores e no elevador.
Quando havia alguma questão mal resolvida entre eles, o adversário soltava o impropério; que representava uma praga infernal:
– Que um dia o satanás te dê uma hemorroida tratada por Dr. Bráulio!…
Certa feita fui acompanhar um parente que fizera cirurgia de hemorroida. À medida que as pessoas iam saindo do gabinete e passavam pela Sala de Espera observávamos que as fisionomias estavam carregadas de sofrimento. Como se todas esperassem um sacrifício.
Naqueles anos da década de 50 se medicava os pacientes pôs-operados de hemorroida, com a aplicação de nitrato de prata. Um medicamento terrível. Ardia que só pimenta, quando entrava no ânus, segundo os pacientes.
A temida caixinha do remédio e os bastões que eram introduzidos nos ânus
Na sala de espera, todos estavam circunspectos, calados e apavorados. Era o estágio mais tenebroso da cura das hemorroidas: a aplicação do nitrato de prata. Era muito incômodo: o cirurgião enfiava o dedo indicador levando ao ânus um pouco de pomada e em seguida empurrava o bastão medicinal. Para alguns, algo desmoralizante.
Observei que havia um senhor moreno, bem forte, que estava inquieto e trêmulo, com quem fiz certa camaradagem, mas fiquei surpreso quando ele se dirigiu a um dos pacientes que deixara o gabinete do médico.
– Amigo, perdoe a pergunta, mas… ardeu muito?…
De tão sofrido, o infeliz balançou a cabeça afirmativamente, ainda com os olhos lacrimejando.
Naquele momento Abílio me disse que estava quase “cagando fino”, de tanto medo. E ainda lhe incomodava a “dor moral” de levar dedo no fiofó. Foi mais além, na confidência. Falou-me que quando saia de casa, “operação” que fez na maior moita, evitando que o assunto de sua cirurgia não viesse cair nos ouvidos da vizinhança, deu-se a merda.
Ao entrar no táxi, apareceu um conhecido, aposentado, daqueles velhotes chatos, que lhe indagou por que estava mancando, ao que Abílio informou ter sido uma má jogada no basquete; um adversário deu uma cotovelada seu ovo.
A Sala de Espera foi se esvaziando. Chegada sua vez, o afro-nordestino mudou de cor. Entrou quase empurrado pela esposa. Lá dentro, demorou um bocado a conversa preliminar com o médico, a fim de acalmar o homem, que transfigurado, tinha os olhos fixos na mão do médico; principalmente no “dedão” direito, segundo me disse a enfermeira.
Depois se ouviu um silêncio aterrador, o que me fez imaginar seu sofrimento suportando o “dedão” do Dr. Bráulio, sem um único gemido. Ao sair e vê-lo suando mais do que tampa de chaleira, fui eu quem indagou muito discretamente:
– Seu Abílio, ardeu mesmo como pimenta?
– Ardeu que só a bexiga; mas suportei porque sou macho!…
Boas narrativas. Muito engraçado só de imaginar.
Eu me lembrei de uma história de Agildo Ribeiro sobre doenças venéreas. Ele deu um entrevista a Jô que é hilária
Caro Maurício, não pude divulgar mas o personagem foi o cronista.
Um abração sabatino.
Vichi ! E saber que dizem que pimenta no…………… Será que não existe uma maquina computadorizada para fazer este serviço? Seria por assim dizer “mais humano” .
Caro Dr. Joaquim Francisco. Que bom saber que o senhor leu uma das minhas crônicas. Nos conhecemos quando lhe entrevistei para o livro VALE DO SIRIJI e de outra feita quando fui à Prefeitura em Comissão e o senhor decidiu salvar a Lagoa do Araçá, na Imbiribeira, de um aterro. Ao ler seu nome sempre me lembro do grande líder que foi seu pai. Abraços.