JOSÉ RAMOS - ENXUGANDOGELO

“A cigarra é um inseto conhecido por todos, principalmente pela sua tremenda cantoria. Em algumas épocas do ano, o som é tão alto que chega a incomodar algumas pessoas.

Assim como outros animais, o canto é uma forma de comunicação, seja para atacar, avisar do perigo ou até mesmo para a reprodução. Este último é o motivo pelo qual as cigarras tanto cantam. Elas estão à procura de um parceiro, sendo que o responsável por todo o barulho é o macho”.

Ao todo, existem em torno 1500 espécies de cigarras, vivendo nos trópicos ou na bacia do Mediterrâneo, alimentando-se de seiva de plantas. Sua vida varia entre 4 e 17 anos, dependendo da espécie.

A cigarra – espécie homóptera da família cicadidae

A claridade do fim da tarde está terminando. O sol, importante rei, está se recolhendo no horizonte, para voltar no dia seguinte, mais forte e luminoso para sua tarefa e seu mister planetário.

Cansado da capina da tarde, ainda tenho forças para sentar sobre um dos cambitos, enquanto arrumo as ferramentas em lugar fácil para pegá-las de volta na manhã seguinte.

Ando e sento na ponta da calçada. Ao lado, Vovô limpa o cachimbo, preparando-o para enchê-lo de novo e dar uma cachimbada antes de ir banhar no açude.
Quase sussurrando, comenta comigo:

– Alimpamo um bom pedaço hoje. Amanhã a gente termina pela manhã, faz a coivara de tarde e taca fogo. Dois dias adispois, a gente começa a semear o milho e o feijão!

Como se ninguém falasse nada, escuto distante dali o cântico triste do vem-vem, ao mesmo tempo que algumas andorinhas, em rodopios pegam mosquitos.

Vovô, antes de levantar para ir ao açude, garante:

– A chuva não vai demorar muitos dias. Os mosquitos estão avisando!

Aquele diálogo com ares de monólogo conseguiu tirar minha atenção e nem percebi que a claridade ora embora. Silêncio total. E aquele silêncio inodoro, petulantemente traz consigo a impressão de algum cheiro.

E pergunto a mim mesmo: silêncio tem cheiro?

De jasmim?

De açucena?

Entre uma dúvida e outra, percebo o barulho imaginário de duas cortinas se abrindo como num teatro em que eu, sozinho, privilegiado, ouvia as características iniciais de um cântico coral. Cigarras, provavelmente aos milhares, em acordes mil garantiam o início da apresentação regida pela maestrina Natureza.

Perguntei a mim mesmo:

– Por que, e para que, ou para quem, as cigarras cantam?

Há quem afirme, provavelmente sem qualquer entendimento, que as cigarras cantam até morrer. Isso não é verdade. O cantar é, uma realidade, exclusiva dos machos, com o objetivo de atrair e envolver as fêmeas para o acasalamento.

“Tanto a fêmea quanto o macho possuem um órgão na região do abdome que funciona como se fosse uma caixa acústica. Entretanto, só no macho é encontrada uma membrana que produz movimentos que permitem a emissão do som. O som é tão alto que pode atingir cem decibéis.

Após a reprodução, as fêmeas botam seus ovos e morrem. Depois de saírem dos ovos, as jovens cigarras (ninfas) entram na terra e ficam lá até a época de reprodução. Elas alimentam-se da seiva retirada das raízes das plantas, enquanto aguardam o momento certo para cavarem túneis que as levem de volta à superfície. Algumas espécies de cigarras podem ficar até 17 anos enterradas, sendo um dos insetos que possuem a vida mais longa.

Chegada a época de reprodução, geralmente nos meses quentes do ano, elas saem e sobem nas árvores. Nesse momento elas sofrem metamorfose, transformando-se em insetos adultos. Os machos adultos iniciam, então, uma nova cantoria para atrair as parceiras”.

OBS.: Estes três parágrafos são de autoria de Vanessa Sardinha.

Cigarras em acasalamento

O coral continua cantando – com o objetivo proposto pela Natureza, e pelos machos! – e eu, absorto e embevecido, continuo “pregado” na ponta da calçada, tentando entender alguns segredos e privilégios de todos os seres vivos criados por Deus.

2 pensou em “O CORAL NOTURNO DAS CIGARRAS

  1. Valeu, Zé, por mais essa maravilha de cenário incutido na crônica: O CORAL NOTURNO DAS CIGARRAS.

    Sem querer, querendo, o mestre dá uma aula de biologia em suas crônicas.

    Meus parabéns!

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