Décadas atrás, numa tarde chuvosa e melancólica, Zé de Vina, o bêbado mais falante de Natal, tal qual Vicente Celestino no filme “O Ébrio”, contava aos amigos de mesa de bar a verdadeira razão da sua tristeza e da sua solidão e porque tinha se tornado um ébrio:
– Já fui casado, já tive um lar, com uma esposa que era uma santa, e cinco filhos. Mas a minha irresponsabilidade e minha vida boêmia destruíram meu lar.
Os amigos de copo já sabiam da história de cor e salteado, mas, mesmo assim, gostavam de ouvir.
Durante o tempo em que fora casado, Zé de Vina esquecia que a esposa e filhos precisavam se alimentar. A prioridade do seu dinheiro era a boemia. Mesmo com família constituída, ele só tinha olhos para mesa de bar e mulheres de cabarés.
Depois de anos de discussões e promessas não cumpridas, Bernadete, a esposa, cansada de passar privações junto com os cinco filhos, e de ver o marido chegar de madrugada, embriagado e agressivo, tomou uma atitude desesperada, para escapar das garras de um casamento infeliz.
Numa certa madrugada, ao chegar em casa trocando as pernas, Zé de Vina a encontrou completamente vazia. A mulher havia se mudado, para lugar incerto e não sabido, com os filhos e os móveis. O susto que ele levou fez com que ficasse sóbrio, imediatamente. Sem rumo e sem prumo, saiu perambulando pelos bares e adormeceu no chão.
Desesperado por se ver sozinho, sem esposa e filhos e com a casa vazia, Zé de Vina mergulhou ainda mais na boemia. Pagara muito alto o preço de sua irresponsabilidade. Mas, reconhecia que fizera por merecer.
Os maus-tratos a que tinha submetido a família, durante os dez anos em que fora casado, não mereciam perdão.
Dias depois que a família o abandonou, chegou aos ouvidos de Zé de Vina que um rico “coronel”, dono de fazendas, viúvo e cheio de filhos, fizera de Bernadete sua “teúda e manteúda” e estava fazendo as vezes de pai para seus filhos, dando a todos uma vida sossegada e com conforto.
O “coronel” era um importante chefe político, um figurão, e contava com o respeito de todos na cidade.
Depois de descobrir o endereço do tal fazendeiro, Zé de Vina, foi até lá, na esperança de rever, não a mulher, mas os cinco filhos. Estava conversando com eles, quando desceu de um cavalo o tal coronel, de rebenque na mão e com um vozeirão estridente:
– Boa tarde, seu Vina!
Os companheiros de copo, mais uma vez, ouviam atentos, talvez pela vigésima vez, a narrativa de Zé de Vina, e aguardavam o desfecho.
Percebendo a curiosidade dos amigos, Zé de Vina concluiu a conversa, jocosamente:
– Quando eu vi o tipão que é o coronel, só fiz desengalhar meu honroso chapéu da galhada de chifres e respondi, educadamente:
– Boa tarde, coronel Homero! Que Deus guarde Vossa Senhoria e suas excelentíssimas famílias! Bernadete tem bom gosto…
Cara e Divina Violante, Zé da Vina, casado há 10 anos, com 5 filhos, não reconhecia em Bernadete uma bela e fogosa mulher que provavelmente era. Alcoólatra, saia com mulheres de cabaré, bebia todas e voltava tarde em casa, onde, não raro agia com violência com sua mulher e filhos.
Coronel Homero se aproximou da Bernadete, em um dia levou todas as suas coisas e filhos e se amancebou com ela, fazendo-a de teúda e manteúda.
É, não foi uma total libertação da Bernadete, mas acho que ela saiu ganhando.
Beijo, minha cara.
Obrigada pelo comentário generoso, prezado João Francisco!
Bernadete foi amada e idolatrada pelo coronel e soube ser sua companheira, sem se sentir escrava. Tirou na sorte grande, como também os cinco filhos que passaram a ter um pai de verdade..
Quando Zé de Vina viu o “tipão” que ela tinha arranjado, tremeu nas bases, e se conformou com os chifres. rsrs.
Beijo, amigo! Bom final de semana!
Vivi,
Magistral fecho: “Bernadete tem bom gosto…”
Por ser, ainda hoje, um cabra fascinado pela boemia ( com toda a vênia ao Nelson: ♫ ♬ ♩Boemia, aqui me tens de regresso / E suplicante te peço a minha nova inscrição / Voltei pra rever os amigos que um dia / Eu deixei a chorar de alegria, me acompanha o meu violão♫ ♬ ♩) e por ter encontrado nas noites de minha vida “personas” tão iguais ao seu protagonista, eis que também eu digo sobre a minha Quesli, que, apesar dos pesares, nunca me largou: “Quesli tem bom gosto…”.
Por óbvio minha sogrinha querida não concorda em nada e vive sempre a aconselhar: “Larga esse traste, Quesli. Não esqueça que a empresa cocoleira está em seu nome. Dê um pé nos fundilhos do cabra e vá curtir a vida”.
Quesli sempre amorosa e a perdoar: Mãe, ele não sabe o que faz”.
I vamu qui vamu, Vivi
Um beijão e um ótimo final de semana à querida amiga
Ao menos Zé da Vina reconheceu um alento para seus filhos e a mulher.
O álcool é uma droga “lícita” que costuma até enfeitar muitos lares com seus bares esmeradamente decorados.
O grande drama é que o alcoólatra nem sempre “consegue” reconhecer o problema e já não se sente necessariamente infeliz, destrói a felicidade de toda sua família aos poucos.
Deve ter brindado até os fins dos seus dias…
Obrigada pela gentileza do comentário, prezado Marcos André!
Bernadete teve sorte de arranjar um benfeitor rico, que a aceitou com o “kit” de cinco filhos..
E Zé de Vina, quando viu o “tipão” que era o “coronel”, deve ter adorado os chifres!!! rsrsrs
Bom final de semana!
Obrigada pelo comentário gentil, querido cronista Sancho Pança!.
Nem todo boêmio é mau marido. O que acaba o casamento são os maus tratos e a agressividade.
Décadas atrás, entrando pelo século passado, os casamentos não duravam, mas se arrastavam, por falta de coragem das mulheres para enfrentar a vida. Saíam da dependência financeira do pai para a do marido, tornando-se verdadeiras escravas..
Com a evolução dos costumes, a mulher passou a competir com o homem no mercado de trabalho, e até na política. Hoje, a conversa é curta e a mulher não se sujeita mais à submissão total ao marido. Encontra-se no mesmo patamar social do homem.
Bernadete viveu numa época muito atrasada, em que a mulher era uma verdadeira escrava. Com cinco filhos ainda crianças, a solução que ela encontrou foi se amasiar com o tal “coroné”..
“Felizes para sempre”.
Um beijão e um ótimo final de semana para você também, querido amigo!
Violante,
Excelente crônica sobre a boemia e o alcoolismo. Boêmio é um adjetivo qualificativo, substantivo masculino, que pode ter um significado pejorativo, quando relacionado a uma pessoa pela forma como ela leva a vida – de forma despreocupada, sem limites ou regras.
Embora também possa significar uma pessoa que opta por levar uma vida alegre, livre e hedonista. Em resumo, uma vida onde o prazer é o bem supremo.
No Brasil, o termo boêmio é bastante conhecido, porém, de forma estereotipada. Pois os boêmios são vistos como pessoas que gostam de facilidades, burlar leis e regras pelo próprio interesse, além de viver de festas.
Como exemplo, temos o escritor Machado de Assis, que levou uma vida boemia, e o sambista e compositor Zeca Pagodinho, que é visto pela mídia brasileira, como a imagem do típico boêmio brasileiro.
O alcoolismo ou a dependência química do álcool, faz com que essa pessoa pense obsessivamente e se comporte compulsivamente. A pessoa não consegue parar de cogitar em consumir a bebida e quando o faz, é de maneira descontrolada, muitas vezes levando a outras consequências. O excesso de álcool no cérebro leva a efeitos psíquicos como redução da concentração, da atenção, da memória recente e da capacidade de julgamento. E é por isso que depois da farra você pode até se esforçar, mas muitas vezes não se lembra da noite anterior.
O alcoolismo é uma doença que deve ser tratada, pois além de prejudicar o viciado leva a dissolução da família como foi muito bem descrita nesse artigo. Parabéns, cara amiga, por abordar um problema atualíssimo de forma leve e bem-humorada.
Desejo um final de semana pleno de paz, saúde e felicidade
Aristeu
Obrigada pelo gratificante comentário, prezado Aristeu.
Gostei imensamente da sua explanação sobre a boemia e o alcoolismo.
Seu comentário enriqueceu o meu texto.
Realmente:
“O alcoolismo ou a dependência química do álcool, faz com que essa pessoa pense obsessivamente e se comporte compulsivamente.”
Não há como se confundir o alcoólatra crônico, que bebe diariamente e altera o humor, tornando-se irresponsável com relação à vida e à família, com a pessoa que bebe socialmente, e com moderação. sem alterar o comportamento..
Um final de semana pleno de paz, saúde e felicidade para você também!
Excelente história essa de Zé de Vina, Bernadete e o coronel Homero, Violante Pimentel, queridíssima Vivi.
Hilária, engraçada, cômica, divertida, apoteótica. A gente rir e não percebe que está rindo.
Por que é que em todas as histórias de bêbado a mulher é quem mais sofre pela ausência do marido farrista, cachacista?
No caso de Bernadete ela encontrou um gentlemen em sua vida, mesmo sendo casado, disposto a enfrentar o bebarrão com todas suas fanfarronices etílicas, o ex Zé de Vina.
Zé de Vina teve muita sorte em Bernadete ter encontrado um homem que a amasse, a sustentasse e os filhos!
Imagine os milhares de casos que já houve, a mulher toma conhecimento, sofre calada, ninguém toma conhecimento, e quando ela procura uma satisfação do marido beberrão, ele lhe pergunta na maior cara de pau:
– Está te faltando alguma coisa em casa, Bernadete?
Xêreçaço, querida, com ótimo final de semana para você e família.
P:S: Ainda não assisti a o filme indicado pela Diva O Último Lance, por que meu filho não baixou, mas, em compensação já assisti por 11 vezes The Hurricare.
A cena da absolvição proferida pelo Juiz Federal anulando os dois julgamentos do Tribunal Racista de Nova Jersey, é apoteótica.
Obrigada pelo comentário gentil, querido cronista Ciço Tavares!
A sorte ajudou Bernadete a encontrar o tipão de homem, como o coronel,, que além de se apaixonar por ela e amparar seus filhos, enfrentou Zé de Vina, que se conformou com os chifres.
Por sinal, Zé de Vina . deve ter adorado os chifres…rsrsrs.
Vou assistir novamente HURRICANE, para rever o apoteótico julgamento.
Grande abraço, querido amigo! Um excelente final de semana!.
A sentença do Juiz Federal Sarokim (interpretado magnificamente polo americano Rod Steiger), que anula os dois julgamentos racistas, preconceituosos e revanchistas da Corte de Nova Jersey, paga assistir a “The Hurricane” centena de vezes se preciso for.
Tem o lado da solidariedade dos três voluntários canadenses que, alem de acolhem o rapazola Lesra Martin, se inteiraram do caso, se comovem e se propõem a fazer, de graça, aquilo que muitos artistas, advogados, detetives particulares tentaram e não conseguiram: anular as provas falsas, colhidas criminosamente.
E o júri? Formado por pessoas escandalosamente brancas?
Mais para mim, depois de assisti ao filme por várias vezes a conclusão a que cheguei foi que a turma poderosa dos bastidores do ringue não aceitavam um negro com o poder que o “Erricane”, Rubin Carter, tinha, com as suas lutas fulminantes.
Xêraçaço, querida, com um ótimo final de semana.
Querido cronista Ciço Tavares:
Sua conclusão sobre a natureza do filme “The Hurricate” é muito viável.
Você diz:
“…….. a conclusão a que cheguei foi que a turma poderosa dos bastidores do ringue não aceitavam um negro com o poder que o “Erricane”, Rubin Carter, tinha, com as suas lutas fulminantes.”
Carter foi preso em 1967, plena primavera das contestações pró-igualdade de direitos nos EUA. Sua prisão Inspirou passeatas e até uma canção clássica de Bob Dylan..
Há uma corrente que diz, que o veterano diretor Norman Jewison elegeu a saga de Carter para encerrar sua trilogia sobre o racismo nos EUA.
A trilogia é composta pelos filmes:
“No Calor da Noite”, Oscar de melhor filme de 1967, é até hoje um eficiente drama policial sobre o choque entre um detetive negro (Sidney Poitier) e o xerife branco (Rod Steiger) numa cidadela sulista. Algo supervalorizado, sobretudo devido à empatia de Sidney Poitier, no auge da carreira.
Quase duas décadas mais tarde, Jewison repetia a fórmula em “A História de um Soldado” (1984), sobre uma investigação semelhante por um militar negro (Howard Rollins Jr.) numa base sulista durante a Segunda Guerra.
Rubin Carter, é um personagem com uma complexidade de raro potencial estético.
O roteiro minimiza o trabalho de seus advogados americanos, em favor da militância de três canadenses de bom-coração.
Grande abraço!.
Eureca, Divina Vivi,
E assim, dois colunistas do JBF escreveram uma resenha primorosa sobre a trilogia do racismo, dirigida pelo competente diretor Norman Jewison.
Verdade, colunista Ciço Tavares! ,Que beleza!!!
Bom domingo!