CÍCERO TAVARES - CRÔNICA E COMENTÁRIOS

Para João Berto, fã dos cinco palhaços modernos de Guarulhos.

Mamonas Assassinas, vinte e cinco anos sem eles

No dia 2 de março de 1996 o Brasil assistia, estupefato, à tragédia mais chocante de sua história: a morte dos cinco palhaços modernos de Guarulhos no auge da fama num acidente aéreo na Serra da Cantareira.

Mamonas Assassinas, antes chamada de Utopia, foi uma banda brasileira de rock cômico formada em Guarulhos em 1989. Seu som consistia numa mistura de pop rock com influências de gêneros populares, tais como sertanejo, brega, heavy metal, pagode, forró, forrock, música mexicana, reggae, vira, bolero…

O único álbum de estúdio gravado pela banda, lançado em junho de 1995, vendeu mais de 3 milhões de cópias no Brasil, sendo certificado com disco de diamante comprovado pela Associação Projeto Brasileiro de Dança (APBD). Foi o disco de estreia que mais vendeu no Brasil e também o que mais vendeu cópias em um único dia: 25 mil cópias nas primeiras 12 horas após a execução das músicas Vira-Vira e Robocop Gay na 89 FM, Rádio Rock de Osasco, com sede em São Paulo.

Com um sucesso meteórico, a carreira da banda Mamonas Assassinas durou pouco mais de sete meses, de 23 junho de 1995 a 2 de março de 1996, quando o grupo foi vítima dum acidente aéreo fatal sobre a Serra da Cantareira quando vinha de um show no Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha, o que ocasionou a morte de todos os seus integrantes, causando grande comoção nacional. Passados mais de 25 anos da fatídica tragédia a banda ainda continua influenciando e inspirando gerações. O exemplo de João Berto, filho do editor Luiz Berto, é o exemplo cabal dessa influência positiva.

Em março de 1989, Sérgio Reis de Oliveira, que mais tarde adotaria o nome artístico de Sérgio Reoli, trabalhando na empresa de máquinas de escrever Olivetti, conhece Maurício Hinoto, irmão de Alberto Hinoto, que mais tarde adotaria o nome artístico de Bento Hinoto. Ao saber que Sérgio Reoli é baterista, Maurício decide apresentar o irmão, que toca guitarra. A partir daí, Sérgio Reoli conhece Alberto Hinoto e decidem criar uma banda. Na época, Samuel Reis de Oliveira, que mais tarde adotaria o nome artístico de Samuel Reoli, irmão de Sérgio Reoli, não se interessava por música, preferindo desenhar aviões. Contudo, ao ver Sérgio e Bento ensaiarem em sua casa, Samuel Reoli se interessou pela música e passou a tocar baixo elétrico. Estava formado, assim, o embrião da banda, com baixo, guitarra e bateria. Os três formaram o grupo Utopia, cantando “covers” de grupos como Ultraje a Rigor, Legião Urbana, Titãs, Paralamas do Sucesso, Barão Vermelho e Rush, entre outras.

O Utopia passou a apresentar-se na periferia da grande São Paulo. Durante um show realizado em Julho de 1990 no Parque Cecap, um conjunto habitacional de Guarulhos, o público solicitou que o trio executasse a canção Sweet Child of Mine, do Guns N’ Roses. Como desconheciam a letra, pediram a um dos espectadores que subisse ao palco para ajudá-los. Alecsander Alves, que mais tarde adotaria o nome artístico de Dinho, apresentou-se para cantar. Mesmo não sabendo a letra, mas com sua performance e embromação provocaram grandes risadas na plateia. E foi assim que, com sua desenvoltura escrachada, habilidade performática de palco, com deboche apimentado, garantiu o posto de vocalista da banda.

Em 1992, a banda conhece o produtor Rick Bonadio, apelidado de Creuzebek por Dinho e seu estúdio produz o vinil da Utopia, seu primeiro e único disco independente, composto por 6 músicas. Das 1.000 cópias produzidas, apenas 100 foram vendidas. O resto dos discos foram jogados no Index Librorum Prohibitorum do Doi Codi.

Nessa época o tecladista e poeta Júlio César, que passou a incorporar o nome artístico de Júlio Rasec, se juntou à banda por sugestão de Dinho seu amigo e estava formada, assim, a banda Mamonas Assassinas.

Aos poucos, os integrantes começaram a perceber que as palhaçadas e músicas de paródias que faziam nos ensaios para se divertirem eram mais bem recebidas pelo público do que covers e músicas sérias. Gradualmente, foram apresentando nos shows algumas paródias musicais, com receio da aceitação do público. O público, porém, aceitava muito bem as músicas escrachadas. A Utopia percebeu que a chave para o sucesso da banda estava no seu rumo e tocou em frente.

Segundo o jornalista, historiador e tradutor Eduardo Bueno, o Peninha, na biografia autorizada “MAMONAS ASSASSINAS – BLÁ, BLÁ, BLÁ”, lançada em 1996 pela Editora L£PM Editores, a gravação do primeiro e único disco com a formação Mamonas Assassinas foi toda feita no estúdio do produtor Rick Bonadio, o Creuzebek, que monitorava passo a passo os trejeitos dos integrantes da banda a mão de ferro, não permitindo qualquer seriedade nas atitudes de suas diatribes, só zoeiras, escrachos, deboches, molecagens, com as músicas compostas seguindo o mesmo tom debochado, escrachado, zombaria, gozação, cômico, brincalhão, carnavalização.

Muita gente se pergunta como a banda Mamonas Assassinas conseguiu atingir tanto sucesso entre todas as faixas etárias e sociais da nossa população, unindo criança, adolescente, marmanjos, pais e avós no mesmo balaio com músicas “politicamente incorretas” que não deveriam tocar em rádios, por conta dos palavrões, e mesmo sendo formada pelos mesmos integrantes do “fracassado” grupo Utopia, e como se tornaram ídolos do público infantil.

Segundo a crítica especializada, a fórmula de sucesso do grupo estava calcada em letras de humor escrachado e músicas ecléticas, de apelo pop, que parodiavam estilos diferentes, como rock, heavy metal, brega e até o vira português, entre outros. Para Rafael Ramos, outro produtor musical que descobriu os Mamonas Assassinas, “tinha muita coisa estourando na época, mas ninguém fazia algo tão engraçado. O que veio depois era cópia. Eles eram muito carismáticos, autênticos e, além disso, chegaram antes de muita gente”.

Outra questão levantada é qual o legado deixado por eles, já que as letras de suas músicas eram apelativas – como a de Robocop Gay, que sofreu duras críticas de grupos LGBTs – e mesmo sofrendo duras críticas da mídia especializada, e mesmo sendo tachados de ridículos e palhaços da música pela crítica especializada.

Para muitos, a alegria e o humor irreverentes, marcas do comportamento de seus jovens integrantes, liderados pela comédia natural do vocalista, aliado a letras irreverentes, figurinos exóticos e performance estilo pastelão, foi o legado deixado pelo grupo.

Os Mamonas Assassinas foram os maiores heróis de carne e osso que o Brasil já teve. Heróis em cima do palco, onde tocavam sem reclamar até três vezes por noite. Heróis fora do palco, nas nossas casas, onde nos alegravam com suas músicas escrachadas e suas piadas debochadas e escrotas, conseguindo, com isso, unir crianças, adolescentes, pais, mães e avós no escracho politicamente incorreto.

Segundo Rick Bonadio, “eles fizeram sucesso sendo eles mesmos, palhaços, escrachados, debochados, inteligentes, adolescentes, originais.”

Mamonas Assassinas- Robocop Gay

O que realmente aconteceu no acidente com os MAMONAS ASSASSINAS?

15 pensou em “MAMONAS ASSASSINAS E A TRAGÉDIA QUE CHOCOU O BRASIL

    • Jesus de Ritinha de Miúdo,

      Interessante a coincidência:

      Meu filho, Luis Antonio, que estuda Biologia na Católica e a irmã dele, Mariana, vêm na mesma direção desde que tomaram conhecimento da existência dos Mamonas Assassinas.

      É raro um dia em que eles não ouçam os Mamonas Assassinas.

      Eles vieram como um meteoro e como um meteoro se foram, mas deixaram uma semente: O CD Mamonas Assassinas, que até hoje uni filhos, pais e avós…

      Quem não sorri com as estripulias escrachadas do grupo até hoje? Principalmente os da nossa geração?

      Seu lance genial: serem autênticos.

  1. Ciço,

    Very, very beautiful!., como cantaria Dinho…

    Atenção, Creuzebek: a Baixaria Continua!

    Totalmente inspirado em seu texto irei hoje à noite, já que estarei no litoral paulista, correr “Pelado em Santos”. Sozinho? Claro que não, pois minha vizinha, que faz “striptease” para Sancho ao entardecer, estará de carona.

    É a véia banguela, a Gyrtrudi Hundentessó, que irá me acompanhar, certamente, nuamente e taradamente, no auge de seus 78 anos; ligeira “quineim” gazela manca, correrá atrás de Sancho gritando e cantando:

    Sancho,
    Sua careca é “da hora”,
    Seu corpão barrigudão,
    Seu nariz bem grandão,
    Seu peruzinho miudinho,
    Tão me deixando louca.
    Meu docinho de coco,
    Esses seus bagos de coco
    Tá me deixando côca.

    Você me deixa doidona!!!
    Meu coquinho verdinho!
    Vem “midá” um beijinho
    Em meus peitos caídos
    Eu te I love youuuuu!
    (perai que tem mais um pouquinho de “u”)
    uuuuuuuuuuuu…

    (e tome “u”)
    uuuuuuuuuuuu…

  2. Boa e marcante lembrança, Mestre Ciço!

    Marcou época e uma geração.
    Foi um daqueles fenômenos musicais que só ocorre de tempos em tempos.

    Atingiu um público de 8 a 80 anos.
    Até a geração atual sabe, na ponta da língua, as letras do fulgurante grupo.

    • Estimadíssimo Marcos André M. Cavalcanti (ou Marcos André).

      Realmente os Mamonas Assassinas marcou (ou marcaram) uma geração.

      Somente os gênios é que nos surpreendem com as suas revoluções. Ainda bem que os Mamonas Assassinas foram para a nossa alegria.

      Qual o adolescente não se sentiu inserido naquelas estripulias mamônicas?

      Abraçaço, estimado amigo.

      Feliz 2022 para o amigo e família. Quem sabe se um dia eles não se encarnem em alguns genes para a nossa alegria?

  3. Caro Cícero

    Já que você botou os “Mamonas” em pauta, sou obrigado a falar. Na época saquei a relevância do fenômeno, do impacto… e fiz um “clipping” de todas as matérias relevantes da imprensa. Deu 40 boas matérias, que encadernei numa espiral. Mandei cópias para os pais dos rapazes prestando solidariedade; dei algumas pra uns amigos; pensei em publicá-las, mas não encontrei suporte.

    Minha irmã morava no Parque Cecap, de Guarulhos. Moro perto do local. Sei que é pouco adequado ao surgimento de bandas de música, de rock e até de músicas infantis, como fizeram os Mamonas.

    O fato de você estar falando agora na “Tragédia que abalou o Brasil” confirma a importância daquele fenômeno musical. Com isso você inaugura a comemoração do 25 anos dos Mamonas, um quarto de século, boa oportunidade de homenagear.

    Parabéns

    • Caríssimo Brito,

      Feito você, eu sou fã incondicional dos Mamonas Assassinas, e sou ainda hoje!

      Quando vi e ouvi aquela explosão de talento no ar, invadindo a mídia, os lares e as lojas de discos de todo o Brasil, saquei imediatamente que estávamos diante de um fenômeno musical anormal., sem pareia.

      Quem viveu aquele 1995, por apenas seis meses, percebeu que aquilo era um momento que não acontece a qualquer momento.

      Mas um fato me chamou a atenção da época em que o jornal O Globo, era “O Globo”, jornal sério e bem arrumadinho, foi a manchete com que eles se despediram dos cinco palhaços modernos de Guarulhos:

      “ADEUS, MENINOS.”

      Essa foi a manchete do jornal do dia seguinte.

      O fenômeno Mamonas Assassinas foi tão estrondoso, arrebatador, que no dia seguinte à tragédia todos os jornais do Brasil a manchete era a mesma, com exceção de O Globo, que foi mais inteligente.

      Abraçaço, amigo! Feliz 2022!

    • Não há de que, meu querido e inteligente jovem João Berto.

      Você, além de ser talentoso universalmente, tem bom gosto musical. Bom gosto que certamente vem de família. Dom Berto e Dona Aline são os responsáveis.

      Os Mamonas Assassinas foi um fenômeno raríssimo de inteligência musical que uniu um país inteiro por meio da música.

      Bebês no bucho da mãe, crianças, adolescentes, pais, mães, avós e avôs cantavam e saracoteavam pelados em santos sem ligar para o politicamente correto. Tudo era festa com os mamonas assassinas. Todos se uniam nas suas maluquices musicais.

      De Norte a Sul; de Leste a Oeste, os Mamonas Assassinas deitaram e rolaram levando a todos os lares alegria, descontração, diversão e gargalhadas.

      Abraçaço.

  4. Parabéns pelo belíssimo texto, querido Cícero Tavares,

    A lacuna deixada pela banda “Mamonas Assassinas” até hoje não foi preenchida. Por isso, ainda faz sucesso e os componentes são lembrados com saudade e amor.
    “Você me deixa doidjão”. “Mina, teu cabelo é da hora..” Frases suaves e amorosas, que se integraram à linguagem dos jovens.

    Na manhã de um domingo fatídico, 2 de março de 1996, logo cedo, liguei a televisão “baby” (10 polegadas), ouvi a notícia do acidente que tinha ocorrido pela madrugada com os “Mamonas Assassinas” e fiquei paralisada. Diana, minha filha, ainda dormia e eu não tinha com quem falar. Abri a porta do quarto dela e, com a voz embargada, só consegui dizer: “Caiu um avião, Diana!” E ela, sonolenta: -Por que a senhora está chorando? Minha resposta: Porque os Mamonas estavam nele e morreram todos!!!.

    Esse domingo, para nós, e para o Brasil, foi um dia de juízo. Houve uma verdadeira comoção nacional. .Sentimos a tragédia, como se conhecêssemos de perto, Dinho e os outros componentes da banda..
    A nossa “fita cassete”, dos Mamonas, continua perfeita.

    Eles jamais sairão da nossa memória. Pobres crianças, que só transmitiram alegria!!!

    Grande abraço!

  5. Querida Vivi ( Sancho é genial até para criar diminutivo! Kkkkkkkkkkkkkk.

    Quando tomei conhecimento, pela CBN, da fatídica tragédia logo cedo. Por volta das 12:30 horas, fiquei perdido como cego em tiroteio no oeste.

    A partir dali não consegui dormir mais e comecei a torcer para que aquela fatídica notícia agourenta não fosse verdade, não passasse de um sonho.

    Quando a Rede Globo (que na época tinha decência) e o SBT (SBTesteira, como diz Zé Simão) começaram a dar como certa a tragédia e que não havia sobrevivente, eu, apreensivo, angustiado e chorando, comecei a questionar:

    “Meu Deus, por que eles? Por quê? Por quê?

    E me silenciei qual Tibicuera, quando o Pajé o renegou dizendo que não tinha sustança para lutar.

    Também feito a nobre cronista, fiquei na deprê e permaneci assim por mais de três meses.

    Até hoje não me sinto CURADO da fatídica tragédia! (pleonasmo?) Prefiro dizê-lo repetido.

    Abraçaço e feliz 2022 a queridíssima amiga, responsável pela publicação das melhores crônicas do JBF!

    E para toda sua família e entes queridos e amados.

    • Eu faço parte nessa suruba, Assuero.

      Quando eu não puder ir por as coisas tornam-se perigosas, eu convenço Maria ir no meu lugar.

      Forte abraço, grande professor.

      Um feliz 2022 ao nobre professor e os seus entes queridos.

      Os Mamonas Assassinas são uma lenda que marcou a história da Música Popular Brasileira sem bossanovismo – um saco elitizado!

  6. Obrigada pelas palavras solidárias e gentis, querido cronista Cícero Tavares.!

    Com o passar dos anos, tornei-me fatalista. Não podemos questionar os desígnios de Deus nem penetrar nos seus mistérios..
    Queremos uma resposta para a fatalidade, mas é impossível. Somos pobres seres viventes, e não conseguimos entender o sentido da vida.

    E assim caminha a humanidade…

    Saudades e Preces para os Mamonas! Eles nos deixaram um legado de alegria e bom humor, , num cenário de amor e esperança.

    O tempo de Deus não é o mesmo que o dos homens. A Bíblia diz que “um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos é como um dia” (2 Pedro 3:8; cf. Salmo 90:4)..

    Grande abraço, querido amigo! Um Venturoso Ano Novo, para você e sua família! Muitas realizações, Saúde e Paz!

    • Obrigada pela gentileza de suas palavras, querido Cícero!

      Que os “meninos”, que apareceram como um cometa e deixaram um rastro luminoso e permanente, descansem em Paz, à espera da Ressurreição!
      Forte abraço, de coração, para você também e sua família!

      FELIZ ANO NOVO!!!

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