João Pereira da Luz, conhecido no admirável universo do repente como João Paraibano (1952-2014), nasceu em Princesa Isabel, Paraíba. Foi um poeta e repentista paraibano, que viveu muitos anos em Afogados da Ingazeira no Sertão Pernambucano. João nunca frequentou escola, porém isso não constituiu empecilho de desenvolver o talento de elaborar seus criativos versos de improviso. Ele foi um dos principais repentistas do país, e participou de dezenas de festivais pelo Brasil inteiro.
João Paraibano é considerado por muitos apologistas e admiradores da cantoria, um dos maiores cantadores de repente no braço da viola. Sua grandiosidade ficava ainda maior quando o tema referia-se ao Sertão. Entretanto, foi um grande poeta cantando tantos outros conteúdos da abundante cultura popular de improviso. O repentista foi ganhador de vários festivais de violeiros, com três participações no Fantástico pela Rede Globo de Televisão, juntamento com o poeta Sebastião Dias.
O seu talento pode ser avaliado por estas estrofes selecionadas do seu vasto repertório:
Faço da minha esperança
Arma pra sobreviver
Até desengano eu planto
Pensando que vai nascer
E rego com as próprias lágrimas
Pra ilusão não morrer.
Tem noites que eu canto mal
Mas quando eu canto feliz
Deus me mostra o verso pronto
E eu digo ao povo que fiz
Que nem sempre a língua é dona
Das frases que a boca diz.
Poesia é a saudade
Da dor da separação
Nasce do pomar do peito
Pra fazer germinação
Peça da estrada que enfeita
O museu do coração.
Se alguém diz um verso meu
Aqui ou noutro lugar
Escuto, mas não escuto
Vendo a hora decorar
Temendo estragar o aço
Da máquina de improvisar.
João Paraibano só era conhecido e admirado entre os admiradores da cantoria de viola, que muita gente confunde com cordel. Na verdade, no Sudeste, quando se fala em poesia popular nordestina, é sobre cordel, hoje feito basicamente pela classe média, e comprado por turistas em bancas de revista. Enquanto o repente, poesia viva, paradoxalmente, se tornou uma manifestação de cultura popular diferente, que não segue modismos e geralmente não está na mídia. A homenagem nesse blog é bem merecida para quem fez versos tão bonitos quanto este: Se alguém diz um verso meu/
Aqui ou noutro lugar/Escuto, mas não escuto/Vendo a hora decorar/Temendo estragar o aço/
Da máquina de improvisar.
Messias,
Grato por seu comentários com observações importantes sobre a cantoria de viola. Concordo plenamente com suas conclusões diferenciando o cordel e o repente, que os menos desavisados podem confundir. Compartilho uma sextlha de João Paribano (1952 – 2014) que inspirou a extinta banda Cordel do Fogo Encantando, utilizando-a na música Chover (ou Invocação Para Um Dia Líquido) fazendo uma adaptação com uma das suas estrofes:
Quando esbalda o nevoeiro
Rasga-se a nuvem, a água rola
Um sapo vomita espuma
Onde o boi pisa e se atola
E a fartura esconde o saco
Que a fome pedia esmola.
Saudações fraternas,
Aristeu
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Nos últimos anos, perdemos grandes nomes da nossa poesia popular e repente. Para conviver com essas faltas, só mesmo engrandecendo e elevando cada vez mais o que os mestres nos deixam. A poesia de João Paraibano esteja sempre entre nós, pois não podemos esquecer sextilhas bem feitas quanto esta publicada nessa oportuna homenagem: Faço da minha esperança/ Arma pra sobreviver/Até desengano eu planto/Pensando que vai nascer/E rego com as próprias lágrimas/
Pra ilusão não morrer.
Vitorino,
É gratificante receber um sábio comentário sobre a ausência do genial João Paraibano (1952 – 2014). Ele deixou um belo legado poético, cujos versos estão na memória de quem gosta da poesia pura do Sertão. Aproveito esse espaço democrático do Jornal da Besta Fubana para compartilhar uma criativa estrofe desse poeta e repentista que partiu antes do combinado:
A juventude não dá
Direito a segunda via
Jesus pintou meus cabelos
No final da boemia
Mas na hora de pintar
Esqueceu de perguntar
Qual era a cor que eu queria
Saudações fraternas,
Aristeu
Parabéns pela excelente postagem, prezado Aristeu.
A rima e o improviso são as principais marcas do Repente ou Cantoria.
Gostei, imensamente, de conhecer a trajetória do poeta João Pereira da Luz, conhecido como João Paraibano. (1952 – 2014).
Considerado um dos maiores cantadores de Repente no braço da viola, o fato de nunca ter frequentado bancos escolares, não impediu que o seu talento aflorasse e ele se tornasse um dos mais famosos repentistas do Brasil.
Dessa forma, participou de inúmeros festivais pelo Brasil afora, sempre com sucesso.
Achei genial, ele ter sido ganhador de vários festivais de violeiros, com três participações no Fantástico, pela Rede Globo de Televisão, juntamente com o poeta Sebastião Dias.
Também gostei muito, dos versos do grande repentista João Paraibano, postados por você.
O Repente ou Cantoria, manifestação artística que faz parte da identidade da região Nordeste, somente na última quinta-feira, 11.11.2021, foi reconhecido como patrimônio cultural do Brasil, durante reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
O pedido de registro do Repente ou Cantoria, havia sido formalizado em 2013, pela Associação dos Cantadores Repentistas e Escritores Populares do DF e Entorno.
Desde então, o Iphan iniciou o processo de registro, que inclui a descrição da arte e a documentação, inclusive com registro audiovisual, formando um dossiê.
Enquanto a Literatura de Cordel, desde 19.09.2018, foi reconhecida pelo IPHAN, como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro, somente agora, em 11.11.2021,o Repente ou Cantoria, arte/irmã do Cordel, foi também reconhecido.
O Cordel, hoje, está na televisão, nos programas de rádio, nas novelas, nas escolas com as crianças, e, brevemente, com certeza, o Repente também ganhará esses espaços.
Bom feriado, com muita saúde e Paz!
Violante,
Agradeço seu excepcional comentário enfatizando que, o repente foi reconhecido, na última quinta-feira (11.11.2021), como Patrimônio Cultural Brasileiro, durante a 98ª reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, órgão vinculado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Referência para a região Nordeste, também conhecido como cantoria, o estilo reúne métrica nos versos, rima e oração.
A rima no repente corresponde a identidade sonora no fim dos versos. A métrica é a técnica de improvisar e as características da linguagem, como quantidade de versos, modalidade das estrofes e acentuação. A oração é a coerência e a qualidade do conteúdo.
O seu texto complementou brilhantemente o meu artigo sobre o poeta e repentista João Paraibano (1952 – 2014), então, retribuo sua gentileza compartilhando uma sextilha quando o genial cantador de viola completou 25 anos na arte da cantoria:
Andei vinte e cinco anos,
Nesta estrada tão sofrida.
Cheia de espinhos e flores,
Ressaca, sono e bebida;
Tapando o rosto da morte,
Mostrando a feição da vida.
Desejo uma semana plena de paz, saúde e felicidade
Aristeu
Aristeu,
Lendo tua coluna me dei conta do quanto nossa história é rica em tudo que enobrece a cultura do nosso País. Coisas de grande valor que se eterniza para nossas gerações. Parabéns.
Poesia é a saudade
Da dor da separação
Nasce do pomar do peito
Pra fazer germinação
Peça da estrada que enfeita
O museu do coração..
Grata.
Carmen.
Obrigada, Aristeu, por compartilhar comigo esses belos versos, do grande e saudoso repentista João Paraibano, ao completar 25 anos na arte da Cantoria! Adorei!
Uma semana cheia de paz, saúde e felicidade, para você também!
Carmen,
É sempre um prazer receber comentário de quem aprecia a poesia pura dos repentistas. Fazer repente é necessário talento, perseverança e se atualizar com as notícias. O cantador de viola é sempre solicitado a glosar os mais diversos assuntos de forma improvisada. Isso diferencia do poeta de bancada que senta e tem tempo para elaborar suas estrofes rimadas.
Aproveito a ocasião para compartilhar um poema de João Paraibano (1952 – 2014) com a prezada amiga:
MINHA INFÂNCIA
Minha infância foi na casa
De três janelas da frente
A cruz de palha na porta
Lata de flor no batente
Um jumento dando as horas
E um galo acordando a gente.
Catei algodão de ganho
Matei preá na coivara
Levei queda de jumento
Derrubei enxu de vara
De vez enquanto uma abelha
Deixava um ferrão na cara.
Rodei mais de um cata-vento
Feito de lata amassada
Pegava mosca na mão
Depois matava afogada
Presa num lençol de nata
De um caldeirão de coalhada.
Até rolinha eu criava
Em gaiola de palito
Piei mocotó de cabra
Quebrei perna de cabrito
O meu passado na roça
Foi pobre mais foi bonito.
Fiz capitão na bacia
De feijão verde e farinha
Quando o angu estava feito
Mãe saía da cozinha
Subia em cima da cerca
Dava um grito papai vinha.
Vi em oco de cortiço
Abelha entrando e saindo
Me escondi por trás de cerca
Para ver vaca parindo
E roubei açúcar da lata
Quando mãe estava dormindo.
Um cinto de couro cru
Pai nunca deixou de ter
Mais educou cinco filhos
Sem precisar de bater
Bastava um rabo de olho
Para a gente lhe obedecer.
Saudações fraternas,
Aristeu