ARISTEU BEZERRA - CULTURA POPULAR

Fui ao bairro do Recife, conhecido como zona boêmia da nossa querida cidade, e fiz uma visita ao busto de Ascenso Ferreira (1895-1965).

Ele foi um poeta de Palmares/PE, conhecido por integrar o movimento modernista de 1922 com uma poesia que destacava a temática regional de sua terra. Usava sempre um grande chapéu de palha, que o caracterizava.

Na representação esculpida do poeta, estão gravados os seguintes versos:

Sozinho de noite
Nas ruas desertas
Do velho Recife
Que atrás do arruado
Moderno ficou…
Criança de novo
Eu sinto que sou.

Resolvi homenagear o grande poeta e folclorista pernambucano, cujo a obra foi marcada por forte nostalgia do processo de transformação que ocorria na região açucareira, quando os engenhos desapareciam e em seu lugar surgia as usinas. Então, mentalmente, os versos saíram de forma simples, objetiva e prestando tributo a um poeta com senso agudo de ritmo.

Prezado Ascenso,
Continuamos a arruar…
Recife cada vez mais linda,
E a violência a se alastrar!
Vamos semeando versos,
Um dia o amor vai brotar!
Receba um grande abraço
Do poeta criança do lado de cá.

12 pensou em “HOMENAGEM A ASCENSO FERREIRA

    • Maurinojunior,

      Muito obrigado pelo comentárrio ilustrativivo do poema ‘Branquinha’. Uma verdadeira relíquia ouvir a voz de Ascenso Ferreira (1895 – 1965). Retribuo a gentileza enviando um dos belos poemas de Ascenso Ferreira (1895 – 1965).

      “Oropa, França e Bahia”

      (Romance)

      Para os 3 Manuéis:
      Manuel Bandeira
      Manuel de Souza Barros
      Manuel Gomes Maranhão

      Num sobradão arruinado,
      Tristonho, mal-assombrado,
      Que dava fundos prá terra.
      ( “para ver marujos,
      Ttituliluliu!
      ao desembarcar”).

      …Morava Manuel Furtado,
      português apatacado,
      com Maria de Alencar!

      Maria, era uma cafuza,
      cheia de grandes feitiços.
      Ah! os seus braços roliços!
      Ah! os seus peitos maciços!
      Faziam Manuel babar…

      A vida de Manuel,
      qque louco alguém o dizia,
      era vigiar das janelas
      toda noite e todo o dia,
      as naus que ao longe passavam,
      de “Oropa, França e Bahia”!

      — Me dá uma nau daquelas,
      lhe suplicava Maria.
      — Estás idiota , Maria.
      Essas naus foram vintena
      Que eu herdei da minha tia!
      Por todo o ouro do mundo
      eu jamais a trocaria!

      Dou-te tudo que quiseres:
      Dou-te xale de Tonquim!
      Dou-te uma saia bordada!
      Dou-te leques de marfim!
      Queijos da Serra Estrela,
      perfumes de benjoim…

      Nada.
      A mulata só queria
      que seu Manuel lhe desse
      uma nauzinha daquelas,
      inda a mais pichititinha,
      prá ela ir ver essas terras
      “De Oropa, França e Bahia”…

      — Ó Maria, hoje nós temos
      vinhos da quinta do Aguirre,
      uma queijadas de Sintra,
      só prá tu te distraire
      desse pensamento ruim…
      — Seu Manuel, isso é besteira!
      Eu prefiro macaxeira
      com galinha de oxinxim!

      “Ó lua que alumias
      esse mundo de meu Deus,
      alumia a mim também
      que ando fora dos meus…”
      Cantava Seu Manuel
      espantando os males seus.

      “Eu sou mulata dengosa,
      linda, faceira, mimosa,
      qual outras brancas não são”…
      Cantava forte Maria,
      pisando fubá de milho,
      lentamente no pilão…

      Uma noite de luar,
      que estava mesmo taful,
      mais de 400 naus,
      surgiram vindas do Sul…
      — Ah! Seu Manuel, isso chega…
      Danou-se de escada abaixo,
      se atirou no mar azul.

      — “Onde vais mulhé?”
      — Vou me daná no carrosé!
      — Tu não vais, mulhé,
      — mulhé, você não vai lá…”

      Maria atirou-se n´água,
      Seu Manuel seguiu atrás…
      — Quero a mais pichititinha!
      — Raios te partam, Maria!
      Essas naus são meus tesouros,
      ganhou-as matando mouros
      o marido da minha tia !
      Vêm dos confins do mundo…
      De “Oropa, França e Bahia”!

      Nadavam de mar em fora…
      (Manuel atrás de Maria!)
      Passou-se uma hora, outra hora,
      e as naus nenhum atingia…
      Faz-se um silêncio nas águas,
      cadê Manuel e Maria?!

      De madrugada, na praia,
      dois corpos o mar lambia…
      Seu Manuel era um “Boi Morto”,
      Maria, uma “Cotovia”!

      E as naus de Manuel Furtado,
      herança de sua tia?

      — continuam mar em fora,
      navegando noite e dia…
      Caminham para “Pasárgada”,
      para o reino da Poesia!
      Herdou-as Manuel Bandeira,
      que, ante a minha choradeira,
      me deu a menor que havia!

      — As eternas naus do Sonho,
      de “Oropa, França e Bahia”…

      Saudações fraternas,

      Aristeu

  1. O artigo é uma homenagem a um grande poeta pernambucano. A poesia de Ascenso ganhou espaço na música popular. “Trem de Alagoas” foi musicado por Heitor Villa-Lobos. A cantora e compositora paulista Inezita Barroso também agregou uma melodia a esse texto.
    Conterrâneo de Ascenso, o cantor Alceu Valença adaptou esse mesmo poema, em 1975, na composição “Vou Danado pra Catende”. Essa música encontra-se em vários discos do compositor, entre os quais a coletânea Novo Millennium, de 2005. Outro poema musicado por Valença foi “Maracatu”, cujos versos, à simples leitura, trazem à mente o ritmo afro-brasileiro que lhe dá nome. A música saiu originalmente no LP Cavalo de Pau, de 1982.

    • Messias,

      Muito obrigado pelas informações sobre os poema de Assenso Ferreira (1895 – 1965) gravados gravados por músicos famoso. Retribuo a gentileza compartilhando um poema do famoso poeta pernambucano Ascenso Ferreira (1895 – 1965)

      CINEMA

      MAS D. Nina,
      aquilo é que é o tal de cinema?

      — O homem saiu atrás da moça,
      pega aqui, pega acolá,
      pega aqui, pega acolá,
      até que pegou-la.

      Pegou-la e sustentou-la!
      Danou-lhe um beijo,
      danou-lhe beijo,
      danou-lhe beijo!…

      Depois entraram pra dentro de um quarto!
      Fez-se aquela escuridão
      e só se via o lençol bulindo…

      ………………………………….

      Me diga uma coisa, D. Nina:
      isso presta pra moça ver?!…

      Saudações fraternas,

      Aristeu.

  2. Muito bem lembrado o tributo ao excelente poeta e folclorista Ascenso Ferreira. A poesia de Ascenso Ferreiro é marcada pela presença de personagens do povo, costumes e festas populares.
    Sobre o trabalho de Ascenso escreveu Manuel Bandeira: “Os poemas de Ascenso são verdadeiras rapsódias do Nordeste, nas quais se espelha amoravelmente a alma ora brincalhona, ora pungentemente nostálgica das populações dos engenhos e do sertão. Ascenso identificou-se de corpo e coração com o homem do povo de sua terra (…)”

    • Vitorino,

      Gostei demais da conta da transcrição das palavras de Manoel Bandeira sobre Ascenso Ferreira (1895 – 1965). Aproveito a ocasião para compartilhar um poema do talentoso poeta de Palmares:

      Filosofia

      (A José Pereira de Araújo – “Doutorzinho de Escada”)

      Hora de comer — comer!
      Hora de dormir — dormir!
      Hora de vadiar — vadiar!

      Hora de trabalhar?
      — Pernas pro ar que ninguém é de ferro!

      Saudações fraternas,

      Aristeu

  3. Desculpe-me o erro de digitiaçao. Eu estava ouvindo uma história sobre como Ascenso Ferreira encontrou no carnaval mais um gênio da raça. É o seguinte: O jornalista, radialista, escritor, servidor público, compositor e poeta pernambucano Ascenso Carneiro Gonçalves Ferreira (1895-1965) se espantou quando viu “O Gênio Da Raça’’ que não era Rui Barbosa. Veio a inspiração e poema alegremente surgiu:

    O GÊNIO DA RAÇA

    Eu vi o gênio da raça!!!
    (Aposto como vocês estão pensando que eu vou
    falar de Rui Barbosa).
    Qual!
    O Gênio da Raça que eu vi
    foi aquela mulatinha chocolate
    fazendo o passo de siricongado
    na terça-feira de carnaval!..

    • Neide,

      Errar é humano, principalmente, quando estamos em uma pandemia. Vamos passar para o seu excelente comentário. Gosto demais da conta da obra poética de Ascesnso Ferreira (1895 – 1965) pelos versos bem-humorados. Compartilho
      O poema desse talentoso vate de Palmares/Pe que conta em versos uma viagem para Catende no “Trem das Alagoas” e o grande desejo de chegar. O trovador passeia pelo som do sino, do apito, da paisagem que o trem atravessa. Fala de quem fica, do que fica, e segue viagem através da cultura nordestina. Esse belíssimo poema foi musicado pelo maestro Villa-Lobos e depois inspirou Alceu Valença.

      TREM DE ALAGOAS

      O sino bate,
      o condutor apita o apito,
      Solta o trem de ferro um grito,
      põe-se logo a caminhar…
      – Vou danado pra Catende,
      vou danado pra Catende,
      vou danado pra Catende
      com vontade de chegar…
      Mergulham mocambos,
      nos mangues molhados,
      moleques, mulatos,
      vêm vê-lo passar.
      Adeus !
      – Adeus !
      Mangueiras, coqueiros,
      cajueiros em flor,
      cajueiros com frutos
      já bons de chupar…
      – Adeus morena do cabelo cacheado!
      Mangabas maduras,
      mamões amarelos,
      mamões amarelos,
      que amostram molengos
      as mamas macias
      pra a gente mamar
      – Vou danado pra Catende,
      vou danado pra Catende,
      vou danado pra Catende
      com vontade de chegar…
      Na boca da mata
      há furnas incríveis
      que em coisas terríveis
      nos fazem pensar:
      – Ali dorme o Pai-da-Mata
      – Ali é a casa das caiporas
      – Vou danado pra Catende,
      vou danado pra Catende
      vou danado pra Catende
      com vontade de chegar…
      Meu Deus ! Já deixamos
      a praia tão longe…
      No entanto avistamos
      bem perto outro mar…
      Danou-se ! Se move,
      se arqueia, faz onda…
      Que nada ! É um partido
      já bom de cortar…
      – Vou danado pra Catende,
      vou danado pra Catende
      vou danado pra Catende
      com vontade de chegar…
      Cana caiana,
      cana rôxa,
      cana fita,
      cada qual a mais bonita,
      todas boas de chupar…
      – Adeus morena do cabelo cacheado !
      – Ali dorme o Pai-da-Matta !
      – Ali é a casa das caiporas
      – Vou danado pra Catende,
      vou danado pra Catende
      vou danado pra Catende
      com vontade de chegar…

      Saudações fraternas,

      Aristeu

  4. Parabéns, prezado Aristeu, pela bela postagem, sobre o poeta e folclorista Ascenso Ferreira (1895 – 1965).
    Estou encantada com a história de vida dele, como também com a beleza do busto erguido em sua homenagem, na zona boêmia do Recife, onde estão inseridos versos belíssimos do cultuado poeta.
    Seus versos, em homenagem a esse grande poeta e folclorista, são lindíssimos.. Gostei imensamente!.

    Muita Saúde e Paz, e uma ótima semana!

    • Violante,

      Grato por suas generosas palavras. Muitas vezes a inspiração acontece em horas inesperadas. Isso ocorreu de uma maneira rara e exatamente como foi descrita no artigo. Compartilho um poema de Ascenso Ferreira (1895 – 1965), que ratifica seu amor pelas raízes da brasilidade no Nordeste, com a prezada amiga:

      HISTÓRIA DA PÁTRIA

      Plantando mandioca, plantando feijão,
      colhendo café, borracha, cacau,
      comendo pamonha, canjica, mingau,
      rezando de tarde nossa Ave-Maria,
      Negramente…
      Caboclamente…
      Portuguesamente…
      A gente vivia.

      De festas no ano só quatro é que havia:
      Entrudo e Natal, Quaresma e Sanjoão!
      Mas tudo emendava num só carrilhão!
      E a gente vadiava, dançava, comia…
      Negramente…
      Caboclamente…
      Portuguesamente…
      Todo santo dia!

      O Rei, entretanto, não era da terra!
      E gente pra Europa mandou-se estudar…
      Gentinha idiota que trouxe a mania
      de nos transformar
      da noite pro dia…
      A gente que tão
      Negramente…
      Caboclamente…
      Portuguesamente…

      (E foi um dia a nossa civilização tão fácil de criar!)
      Passou-se a pensar,
      passou-se a cantar,
      passou-se a dançar,
      passou-se a comer,
      passou-se a vestir,
      passou-se a viver,
      passou-se a sentir,
      tal como Paris
      pensava,
      cantava,
      comia,
      Sentia…

      A gente que tão
      Negramente…
      Caboclamente…
      Portuguesamente…
      Vivia.

      Uma semana plena de paz, saúde, alegria e harmonia

      Aristeu

  5. Belíssimo, este poema “HISTÓRIA DA PÁTRIA”, de Ascenso Ferreira. Obrigada por compartilhar comigo, poeta Aristeu Bezerra! Adorei!

    Um abraço.

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