CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

Quando Gerônimo acertou o pagamento da pousada no Recife, Seu Manoel, o proprietário, pediu-lhe um favor: Levar de carona à Maceió, Lilian, sua jovem sobrinha. Gentil, ele disse ser um prazer, embora gostasse mais de dirigir solitário nas estradas. Partiram pelas três e meia da tarde. A jovem acomodou-se a seu lado no banco da frente, não o cumprimentou. Tinha um “walkman” grudado ao corpo e os fones no ouvido. Constantemente ouvindo música durante a viagem numa pose de quem estava fazendo um favor ter sua companhia. Gerônimo sentiu um desconforto com o comportamento pedante da jovem. Lilian era graciosa como qualquer moça. Corpo bem formado, sua pele rosada contrastava sob a blusa de malha branca, desenhada com motivos modernos, cobrindo seios abundantes. Seu rosto suave, cabelos castanhos, uma bela jovem, pena ser tão soberba, pensou Gerônimo, enquanto analisava a sua companhia acidental.

A viagem transcorreu monótona, sem diálogo, a moça só ouvia música e gesticulava como se estivesse dançando. Esgotado o repertório do “walkman”, Lilian retirou os fones do ouvido e sem pedir licença, ligou o rádio do carro, procurou um som jovem, ficou a ouvir calada. Gerônimo ainda tentou conversar alguma coisa, desistiu diante do mutismo da moça. Com duas horas de viagem bateu uma chuva grossa persistente. Gerônimo parou num posto de combustível para abastecer e lanchar. Depois do lanche, pela primeira vez Lilian falou.

– “Deixe, que a minha conta eu pago. Faço questão de não lhe dar despesas.”

Gerônimo respondeu brincando.

– “Na próxima você paga”.

Depois de dirigir mais 15 minutos ainda sob um intenso temporal, encontrou uma fila de carros parados. Gerônimo perguntou a um guarda rodoviário o que havia acontecido, ele respondeu que o aterro da cabeça de uma pequena ponte estava com problemas devido à enxurrada, o D.E.R. proibiu a passagem pela ponte. Estava perigoso enfrentar um desvio até Maceió àquela hora, escurecia. Aconselhou a dormir em Palmares e continuar a viagem no outro dia pela manhã, quando a ponte estivesse liberada. Gerônimo perguntou a opinião de Lilian. Ela fez um gesto com os ombros, como se dissesse tanto faz. Ele precavido voltou até o posto. Recomendaram um hotel na cidade.

Acertou na portaria, pediu dois quartos. A chuva não parava, marcou com Lilian para jantarem no próprio hotel às 19:30 h. Quando Gerônimo desceu na hora combinada, Lilian já havia jantado, subia as escadas para seu quarto, sem sequer dar um boa-noite. Ele não entendia aquela grossura. Jantou, recolheu-se cedo. Deitou-se de pijaminha bermuda esperando o sono. Relâmpagos cortavam o ar e trovões ribombavam incessantemente, custou a dormir. Ainda não era meia-noite quando foi despertado por fortes batidas na porta de seu quarto, a voz aflita de Lilian pedia, desesperada: “Por favor, abra aqui. Abra a porta!” Gerônimo deixou a cama num salto. Abriu a porta, Lilian entrou correndo, enrolada no cobertor, deitando-se na cama, confessou com voz trêmula morrer de medo de trovão. Gerônimo surpreso e fascinado pelo encanto da moça, agora humilde, buscou confortá-la, mandou que ela dormisse à vontade; ele dormiria na outra cama. Foi surpresa e emoção para o sessentão, quando ela puxou-o pelo braço pedindo: “Vem para perto de mim cara!”

Ela levantou o lençol, estava nua. Ao mesmo tempo em que o abraçou. Lilian, tremendo, levantou o rosto beijando voluptuosamente seu “motorista” na boca.

A noite longa transcorreu com muita chuva, muitos trovões e muitos ais. A louca ninfeta sabia tudo do amor, perfeita nos carinhos e na hora certa.

Dia seguinte, quando Gerônimo acordou, Lilian não estava na cama. Olhou para o céu pela janela, o tempo havia melhorado, mas continuava chuvoso. Tomou banho, arrumou a mala e desceu. Quando saiu do café, Lilian estava pronta sentada numa poltrona com a mala, esperando a partida.

Entraram no carro, a jovem tomou a mesma posição, calada como se nada tivesse acontecido. Não cumprimentou o companheiro de amor da noite de raios e trovões. Durante a viagem o fone não saiu do ouvido. Nem sequer disse um “obrigado” quando ele a deixou num edifício no bairro da Pajuçara.

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