ARISTEU BEZERRA - CULTURA POPULAR

Mais vale um pássaro na mão que dois voando

Significa que é melhor ter pouco que ambicionar muito e perder tudo. É tradição de antigos caçadores. Eles achavam melhor apanhar logo ave que tinham atingido de raspão, antes que ela fugisse, do que tentar atirar nas que estavam voando e errar o alvo.

Sem papas na língua

Significa ser franco, dizer o que sabe, sem rodeios. A expressão vem da frase castelhana “no tener pepitas en la lengua”. Pepitas, diminutivo de papas, são partículas que surgem na língua de algumas galinhas, é uma espécie de tumor que lhe obstrui o cacarejo. Quando não há pepitas (papas), a língua fica livre.

Queimar as pestanas

Antes do aparecimento da eletricidade, recorria-se ao aparecimento de uma lamparina ou uma vela para iluminação. A luz era fraca e, por isso, era necessário colocá-las muito perto do texto quando se pretendia ler o que podia num momento de descuido queimar as pestanas. Por essa razão, aplica-se àqueles que estudam muito.

Quem não tem cão caça com gato

Se você não pode fazer algo de uma maneira, se vira e faz de outra. Na verdade, a expressão, com o passar dos anos, se adulterou. Inicialmente, se dizia “quem não tem cão caça como gato”, ou seja, se esgueirando, astutamente, traiçoeiramente, como fazem os gatos.

Lágrimas de crocodilo

O crocodilo, quando ingere um alimento, faz forte pressão contra o céu da boca, comprimindo as glândulas lacrimais. Assim, ele chora enquanto devora a vítima. Daí a expressão significar choro fingido.

Da pá virada

Um sujeito da pá virada pode tanto ser um aventureiro corajoso como um vadio. A origem da palavra é em relação ao instrumento, a pá. Quando ela está virada para baixo, é inútil não serve para nada. Hoje em dia, “pá virada” tem outro sentido. Refere-se a uma pessoa de maus instintos e criadora de casos ou a um aventureiro.

Testa de ferro

O Duque Emanuele Filiberto di Savoia, conhecido como Testa di Ferro, foi rei de Chipre e Jerusalém. Mas tinha somente o título e nenhum poder verdadeiro. Daí a expressão ser atribuída a alguém que aparece responsável por um negócio ou empresa sem que o seja efetivamente.

Como sardinha em lata

A palavra sardinha vem do latim sardina. Designa o peixe abundante na Sardenha, conhecida região da Itália. É um alimento apreciado e nutritivo, de sabor peculiar. As sardinhas, quando enlatadas em óleo ou em outro molho, vêm coladas umas às outras. Por analogia, usa-se a expressão popular sardinha em lata para designar a superlotação de veículos de transporte público.

Jurar de pés junto

A expressão surgiu das torturas executadas pela Santa Inquisição, nas quais o acusado de heresias tinha as mãos e os pés amarrados (juntos ) e era torturados para confessar seus crimes.

Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) foi historiador, antropólogo, advogado, professor universitário, jornalista e, principalmente, folclorista brasileiro. Era apaixonado pelas tradições populares, superstições, literatura oral e História do Brasil. Ele passou toda sua vida em Natal e dedicou-se ao estudo da cultura brasileira. Foi professor da Faculdade de Direito de Natal, hoje Curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), cujo o Instituto de Antropologia leva seu nome. O conjunto de sua obra é considerável em quantidade e qualidade: ele escreveu 31 livros e 9 plaquetas sobre o folclore brasileiro, em um total de 8.533 páginas, o que o coloca entre os intelectuais brasileiros que mais produziram. É também notável que tenha obtido reconhecimento nacional e internacional publicando e vivendo distante dos centros Rio e S&a tilde;o Paulo.

12 pensou em “DITADOS POPULARES EXPLICADOS POR CÂMARA CASCUDO

    • Assuero,

      Grato por seu formidável comentário. Os ditados populares são uma parte importante do linguajar de uma cultura, e descobrir a origem destas expressões nunca foi tarefa fácil para os estudiosos. Muitas vezes ocorrem expressões estranhas sem sentido, mas que são muito importantes para a longevidade da cultura popular. Compartilho a origem de um ditado popular explicado por Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) com o prezado amigo:

      Maria vai com as outras

      Dona Maria I, mãe de D. João VI (avó de D. Pedro I e bisavó de D. Pedro II), enlouqueceu de um dia para o outro. Declarada incapaz de governar, foi afastada do trono. Passou a viver recolhida e só era vista quando saía para caminhar a pé, escoltada por numerosas damas de companhia. Quando o povo via a rainha levada pelas damas nesse cortejo, costumava comentar: “Lá vai D. Maria com as outras”.

  1. Muito bom o artigo homenageando o genial folclorista Luís da Câmara Cascudo. Autor de clássicos do pensamento brasileiro como Cinco Livros do Povo, História da Alimentação no Brasil, Vaqueiros e Cantadores e Literatura Oral, Câmara Cascudo é reconhecido como uma dos “pilares da construção da identidade brasileira”. Fiquei conhecendo a origem de Jurar de pés juntos.

    • Fernando,

      Agradeço o seu comentário com observações importantes sobre a obra de Luís da Câmara Cascudo (1898-1986). Aproveito para fazer um breve comentário de dois episódios importantes da biografia desse genial folclorista potiguar.
      Em 1941, Luís da Câmara Cascudo fundou a “Sociedade Brasileira de Folclore”. Em 1943 foi convidado pelo poeta Augusto Meyer, diretor do Instituto Nacional do Livro, para redigir o “Dicionário do Folclore Brasileiro”, publicado em 1954.
      Compartilho um ditado explicado por Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) com o amigo:

      Amigo da onça

      Este termo surgiu quando um caçador mentiroso, ao ser surpreendido sem armas por uma onça, deu um grito tão forte que o animal fugiu. Como quem o ouvia não acreditou, dizendo que, se assim fosse, ele teria sido devorado, o caçador, indignado, perguntou se, afinal, o seu ouvinte era seu amigo ou amigo da onça.

      Saudações fraternas,

      Aristeu

  2. Parabéns, prezado Aristeu, pela rica postagem, “DITADOS POPULARES EXPLICADOS POR CÂMARA CASCUDO!”

    Dos ditados populares explicados por Câmara Cascudo, o maior folclorista do Brasil ((1898-1986) , destaco:

    “Lágrimas de crocodilo

    O crocodilo, quando ingere um alimento, faz forte pressão contra o céu da boca, comprimindo as glândulas lacrimais. Assim, ele chora enquanto devora a vítima. Daí a expressão significar choro fingido.”

    Uma ótima semana, com muita saúde e Paz!

    • Violante,

      Grato por seu excelente comentário. Por ser um homem muito querido, Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) era constantemente abordado por pessoas, seja por escrito ou ao pé do ouvido, e acabava sendo um constante receptor de informações de toda a sorte, incluindo relatos de causos que embalaram o sono ou provocaram sustos em gerações e gerações. Como historiador, enriqueceu a sua obra com pesquisas sobre o homem no Brasil, deixando um precioso legado repleto de referências da sabedoria popular e da cultura brasileira.

      Câmara Cascudo trabalhou até os seus últimos anos de vida, tendo sido agraciado com dezenas de honrarias e prêmios. Morreu aos 87 anos. Até hoje, a sua obra é preservada e divulgada através do Instituto Câmara Cascudo (Ludovicus), que mantém o acervo do autor na mesma casa em que ele residiu por cerca de 40 anos na cidade de Natal.

      Compartilho um dos ditados populares explicados por esse genial folclorista potiguar com a prezada amiga:

      Comer com os olhos

      Segundo Câmara Cascudo, soberanos da África Ocidental não consentiam testemunhas às suas refeições, comiam sozinhos. Na Roma Antiga, uma cerimônia religiosa fúnebre consistia num banquete oferecido aos deuses no qual ninguém tocava na comida. Apenas olhavam, “comendo com os olhos”. Aliás, Cascudo dizia que certos olhares absorvem a substância vital dos alimentos.

      Desejo uma semana plena de paz, saúde e alegria

      Aristeu

      • Obrigada, Aristeu, por compartilhar comigo a origem do ditado popular “Comer com os olhos”, segundo Câmara Cascudo.
        Gostei imensamente! .

        A obra de Câmara Cascudo é genial. e muito vasta.

        Seu amor pelo Rio grande do Norte fez com que ele nunca aceitasse ocupar cargo público fora de Natal tendo recusado convites importantíssimos, inclusive no Rio (RJ) e São Paulo (SP)..
        Era muito amigo do meu avô materno, Professor Celestino Pimentel, que o sucedeu como Diretor do Colégio Estadual Ateneu Norte-Riograndense, a convite dele.

        Desejo a você também uma semana plena de paz, saúde e alegria!. .

  3. É considerado um dos mais importantes escritores e estudiosos da cultura popular brasileira, com destaque para o nosso folclore. Era apaixonado pelas tradições populares, superstições, literatura oral e história do Brasil. O Jornal da Besta Fubana presta um trubuto a esse historiador, antropólogo, advogado, professor universitário, jornalista e, principalmente, folclorista brasileiro que era um observador de detalhes. Sua percepção do cotidiano do povo brasileiro o tornou uma referência não só do folclore no sentido de ter a sensibilidade de valorizar as lendas populares, mas principalmente de considerar as cantorias e danças brasileiras como expressões de um saber legítimo e fascinante. Tive a oportunidade de conhecer a origem do ditado popular: Dá pá virada.

  4. Grande Aristeu: aprendi finalmente o significado de “papas na língua” e “queimar as pestanas”. Obrigado por mais essa. Como dizem os gringos, “living and learning”, ou seja, vivendo e aprendendo.
    Tenha uma excelente semana.
    Magnovaldo

    • Magnovaldo,

      É gratificante receber seu ótimo comentário. Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) foi um folclorista, historiador, professor e jornalista brasileiro. Ele é considerado um dos mais importantes pesquisadores das manifestações culturais brasileiras.
      Aproveito esse espaço democrático do Jornal da Besta Fubana para compartilhar um ditado popular explicado pelo mestre Câmara Cascudo:

      Com a corda toda

      Antigamente os brinquedos que possuíam movimento eram acionados torcendo um mecanismo em forma de mola ou um elástico, que ao ser distendido, fazia o brinquedo se mexer. Ambos os mecanismos eram chamados de “corda”. Logo, quando se dava a “corda” totalmente num brinquedo, ele movia-se de forma mais agitada e frenética. Daí a origem da expressão.

      Saudações fraternas,

      Aristeu

  5. Messias,

    Muito obrigado por seu comentário com considerações importantes sobre Luís da Câmara Cascudo (1898-1986). Acrescento um brevíssimo comentário para adicionar as suas observaçõe sobre esse genial pesquisador potiguar. Em 1954, foi lançado o seu trabalho mais importante como folclorista, o Dicionário do Folclore Brasileiro, reconhecido no mundo inteiro. No campo da etnografia, publicou vários títulos importantes, como Rede de Dormir, em 1959, e História da Alimentação no Brasil, em 1967. Mais tarde, veio Geografia dos Mitos Brasileiros, com o qual recebeu o Prêmio João Ribeiro da Academia Brasileira de Letras (ABL).

    Antônio Gonçalves da Silva, mais conhecido como Patativa do Assaré (1909 – 2002), fez uma homenagem em versos para Câmara Cascudo e compartilho com o prezado amigo:

    CÂMARA CASCUDO

    Eu já fiz chapéu de palha,
    Fiz bodoque, fiz cangalha,
    Carrepeta e berimbau,
    Fui menino prazenteiro
    Correndo pelo terreiro
    Em meu cavalo de pau.

    Luís da Câmara Cascudo
    Con seu profundo estudo,
    Sobre o folclore tratou,
    Na cultura popular
    Foi o maior potiguar
    Que o Rio Grande criou.

    Contava tudo a miúdo
    Porque sabia de tudo,
    Conservava nos arquivos
    Populares tradições,
    Lendas e superstições
    E costumes primitivos.

    Do folclore foi patrono,
    Ergueu ali o seu trono
    Com o dom que Deus lhe deu,
    Não há em nosso universo
    Quem possa dizer em verso
    O que ele em prosa escreveu.

    Eu não tenho competência
    Para fazer referência
    Sobre o seu grande saber
    Falando de coisa antiga,
    Por mais que o poeta diga
    Falta ainda o que dizer.

    Acho ser ignorante,
    Muito ousado, petulante,
    Atrevido e linguarudo,
    Um matudo agricultor
    Falar sobre o professor
    Luís da Câmara Cascudo.

    Saudações fraternas,

    Aristeu

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *