JOSÉ PAULO CAVALCANTI - PENSO, LOGO INSISTO

Meu pai faria 100 anos em 2/2/2022. Para celebrar, segue coluna só com histórias dele, em livro que estou escrevendo (título da coluna).

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1. A brincadeira se repetiu, pelo menos, umas 15 vezes. Na mesa dr. José Paulo, como se fizesse discurso,

– Uma mulher inteligente tem o cérebro de uma galinha. Mas, quando é muito inteligente, o cérebro é de duas galinhas.

E calava. Ficávamos esperando, até que dona Maria Lia

– Lá vem você, de novo, com essa idiotice.

– Calma, Babaia. Calma. O seu cérebro é de três galinhas.

E os filhos ficavam ouvindo suas reclamações, por meia hora, todos rindo.

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2. Concorrência, no BNDES, para modelar a privatização da Rede Ferroviária Nacional. Ganhou o consórcio que integrávamos, liderado pelas maiores ferrovias do mundo – uma do Canadá, outra da Austrália. Era preciso dois currículos de nosso escritório, para o julgamento. Pedi que preparasse o dele. Na hora de enviar, fui conferir. Escreveu

– José Paulo Cavalcanti, advogado no Recife.

– Pai, é uma concorrência, por favor diga mais.

– Meu filho, profissão e destino. É tudo.

E não acrescentou nada. Acrescentei, sem que soubesse, os 34 trabalhos jurídicos que escreveu. E juntei o meu, então com 77 páginas, hoje com apenas 6 linhas. Prova de que ainda não estou no ponto.

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3. Professor de Direito Civil, na Universidade Católica, foi Paraninfo da turma de 1964 (o ano da Redentora). E pronunciou forte discurso, no Teatro Santa Isabel (11/12/1964), em defesa da Liberdade. Ensinar era, para ele, missão. Só que, no ano seguinte, informou à Universidade que não mais. Perguntei

– Mas pai, você gosta de dar aulas, e vai parar?

– Porque, meu filho, não faz sentido ensinar Direito em uma Ditadura. E assim se deu.

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4. Quando fui ministro da Justiça, insisti fosse passar alguns dias conosco. Desejava que conhecesse rotina para ele nova. Assistir as reuniões que fazíamos. Se fosse o caso, iria comigo aos encontros com o presidente da República. E nunca aceitou. Então pedi

– Venha, nem que seja para conhecer Brasilia. É uma bela cidade.

– Vou.

– Quando?

– Quando você não for mais nada, por aí.

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5. Duas frases que vivia repetindo:

– A mão aberta é um tapa, a mão fechada é um murro, e é a mesma mão.

– O homem é barro trágico, rareado de estrelas.

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P.S. Agora os leitores vão descansar, que o mar me espera. Até depois do Carnaval, se Deus quiser.

4 pensou em “CONVERSAS DE ½ MINUTO (16)

  1. ‘O homem é barro trágico, rareado de estrelas’. Alguns o são. Outros, ao contrário, são estrelas luzentes rareadas da tragicidade do barro. Sorte de quem com estes conviveu.
    No aguardo do livro.

  2. Essa quem me contou foi Izaias, ainda vivo, que frequenta a banca GLOBO na Avenida Guararapes, do jornalista José do Patrocínio, administrada pelos filhos Zeca e Orlando.

    Certa vez o pároco à frente da administração da Unica-(PE) convidou Dr. José Paulo Cavalcanti para lecionar uma matéria de Direito.

    Ele de pronto aceitou o convite do pároco. E foi sem acertar nada no setor administrativo.

    Final do mês, o responsável pelo RH o chamou para lhe pagar o salário de professor.

    Resposta do Dr. José Paulo Cavalcanti, segundo Izaias:

    – “Doe às Instituições de caridade. Eu tenho com que sustentar minha família.”

    Viva Dr. José Paulo Cavalcanti!

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