A SEMANA
A Semana de Arte Moderna de São Paulo de 1922, sem dúvida, representou um momento de reflexão sobre o que se deve entender por modernismo. Agora, chega-se ao seu centenário e, outra vez, novas reflexões vinculadas ao mesmo tema precisam ser formuladas.
A importância da Semana de Arte Moderna pode ser entendida pela quebra dos ares de morosidade e de conformismo reinantes em 1922, relativos às atividades culturais e literárias, as quais, de repente, pela ação e pela voz de alguns jovens, foram tidas como ultrapassadas e deveriam ser substituídas por outras iniciativas prenhes de novidades. Em muitos sentidos as novidades significavam mudanças efetivas no modo de entender e de fazer as várias manifestações da Arte.
No rol das diretrizes propostas pelos organizadores da Semana de Arte Moderna de São Paulo podem ser identificadas tendências e características que, em resumo, apontam para a fragmentação, a síntese, a busca de linguagem ancorada na chamada brasilidade, com afirmação de sentimentos nacionalistas; a presença de expressões irônicas, humorísticas e paródias; o foco no cotidiano; a preocupação crítica com obras erigidas no passado, inclusive nos campos histórico e cultural; a recorrência ao subjetivismo e a expressividade poética; o apego ao verso livre, etc.
A par desses focos, fica bastante claro que a ideia do que seja modernismo re-quer a mudança ou a adoção de medidas que impliquem surgimento de obras capazes de assinalar a presença de algo inovador. Essa expressão do novo, esse achado adequado à fruição por parte de seus destinatários gera, enfim, o fenômeno do modernismo.
A visão sobre os aspectos mais gerais da existência humana, a meu ver, não abole todas as formulações estéticas assentes. Algumas delas adquirem foro de permanência. A cultura, em verdade, não se apoia sobre a necessidade incessante de mudar. Entendo que esse afã reside mais na ideia de reexame de facetas que dizem respeito ao conhecimento humano. Daí, o progresso não poder se apoiar sobre a quebra absoluta de marcas ou de registros consagrados. Chegar à substituição do ultrapassado, creio, deve ser a medida acertada e equilibrada, porém, como ocorre nas regras consolidadas nas constituições que regem a forma de vida e de convivência de um povo, sempre são respeitados certos princípios ou entendimentos como “regras pétreas”.
Os modernistas brasileiros, apesar de todo o esforço, não conseguiram dar ao Brasil, sobretudo na visão de regiões singularíssimas e de forte expressão cultural que integram a nacionalidade, os roteiros de ações que traduzam o real cenário de um Brasil profundo, encontrado e entendido nos seus “grotões culturais e literários” ou “ilhas culturais”.
Por isso, Gilberto Freyre, com sua autoridade de iniciado na sociologia e na antropologia, ousou alertar, por meio das ponderações do chamado Movimento Regionalista de 1926, que o Brasil não era apenas São Paulo. As regiões deveriam encontrar seu lugar no mapa de um país com dimensões continentais. Com isso ficavam ressaltadas as dimensões regionalistas e as universais naquilo que fosse apresentado pelas diversas manifestações e peculiaridades culturais e artísticas.
Um dos exemplos dessa falta de visão mais abrangente para compreender o que representa um país com dimensões continentais não apenas na sua geografia física, foi dado por Oswald de Andrade, um dos líderes da Semana de Arte Moderna, que, em duas ocasiões, talvez por desconhecer ou não aceitar os procedentes argumentos de Freyre, preferiu aludir ao Nordeste com ressaibos de inveja ou de despeito. A primeira ocasião ocorreu quando Andrade se referiu aos romancistas nordestinos do ciclo de 1930 como sendo “pesados búfalos”, em clara oposição ao sulista Érico Veríssimo, romancista considerado leve como uma borboleta. Mais tarde, quando jornalistas foram a ele perguntar o que achava da morte do bandido Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, abatido pela polícia em 28 de julho de 1938, na Grota do Angico, em Sergipe, respondeu: “Não fizeram nada, porque Gilberto Freyre continua vivo”.
Esses breves indicadores ainda ecoam como resíduos que precisam ser afastados dos pontos defendidos pela Semana de Arte Moderna de São Paulo de 1922, os quais ressurgem como certa xenofobia aos nordestinos. Talvez, quem sabe?, um dia surja um Movimento de Arte Moderna com a ideia de que todas as Artes são, antes de tudo, brasileiras e não apenas paulistas.
Eu daria um ponta-pé na semana de arte moderna. Não se poderia admitir a exclusão de genios como por ex. Patativa do Assaré e Leonardo Bastião. E há milhares de outros, que como esses dois recitaram com métrica rigorosa e rimas de muita originalidade. Já o verso da tal Semana é a coisa mais chata que já vi..
Foi nessa bosta de Semana de Arte Moderna de São Paulo que se abriu o caminho para essa infame desconstrução esquerdopata – não só da arte.
A discriminação dos sulistas sempre existiu e nem é tão velada, assim.
Andrade se viu “doente” e ofuscado por talentos nordestinos. E isto a história comprovou. Não só pela grandeza de Gilberto Freyre, também tivemos os nordestinos Jorge Amado, Manoel Bandeira, João Cabral de Melo Neto, Raquel de Queiroz e Ariano Suassuna. Este, inclusive, ícone do nosso movimento cultural ARMORIAL. Registrei na minha coluna “Dado e Traçado” em 28 de outubro de 2021.
De forma indireta, foi tido como um movimento feito tipicamente por nordestinos. Foi o nosso movimento raiz, o Movimento Armorial.