VIOLANTE PIMENTEL - CENAS DO CAMINHO

Certa vez, o Almirante Alberto Pimentel enviou, do Rio de Janeiro, um presente de aniversário ao seu pai, Professor Celestino Pimentel.

O portador, Adamastor Silva, era amigo da sua família e viajaria a Natal, alguns dias antes da festejada data natalícia.

O presente era um corte de casimira inglesa, azul-marinho, para confecção de um terno, cor predileta do seu pai.

Junto com o presente, o Almirante enviou-lhe uma carta de felicitações pelo seu aniversário (21/06), como costumava fazer.

Convém salientar que a roupa clássica do Professor Celestino Pimentel era terno azul-marinho, de casimira inglesa, com camisa branca de cambraia de linho e gravata.

Ansioso para saber se o pai havia gostado do presente, tio Alberto contava os dias, estranhando a demora de notícias dele.

Quatro meses depois do aniversário do pai, o Almirante resolveu lhe escrever, pedindo notícias. Na verdade, ele também queria sondar se o pai tinha recebido, ou não, o corte de casimira inglesa, presente de aniversário que lhe enviara por um portador idôneo, acima de qualquer suspeita.

O Almirante não quis se mostrar sentido pela falta de notícias do pai, depois da remessa do presente. Entretanto, como ele sempre respondia suas cartas rapidamente, e sempre agradecia os presentes que recebia, o silêncio foi estranho.

Alberto passou a se inquietar, chegando a fazer mau juízo do portador. Mas, comprovadamente, Adamastor era um homem acima de qualquer suspeita.

Nessa época, décadas de 50/60, o único meio de comunicação que havia era através dos Correios. Uma carta demorava mais de um mês para chegar ao seu destino.

O Almirante ficou meses aguardando a resposta da carta, que acusaria o recebimento do presente. Estranhou o esquecimento do pai e mil cogitações passaram pela sua cabeça. Sabia que o pai era muito atencioso. Jamais deixaria de responder à sua carta nem de agradecer seu presente.

Seis meses de espera da resposta da carta se passaram e nenhuma notícia do pai do Almirante. Não aguentando mais esperar, tio Alberto escreveu ao pai e procurou um jeito sutil de tocar no assunto do suposto extravio do presente.

Muito escrupuloso, não queria se mostrar sentido com o pai, pela falta de resposta da carta, nem queria insinuar que o presente pudesse ter sido surrupiado pelo portador, pessoa conhecida e, até então, idônea.

O Almirante Alberto, então, escreveu ao pai, dizendo-se muito decepcionado com o amigo Adamastor, pois sempre o tivera em alta conta, como um homem íntegro e honrado. Entretanto, o presente de aniversário do qual ele fora portador, com certeza, não foi entregue ao destinatário. Não queria fazer mau juízo de Adamastor, mas “diante de fatos, não há argumentos”.

Após receber essa carta, o Professor Celestino escreveu, imediatamente, ao filho, desfazendo o mal-entendido. e se desculpando pelo lapso de não haver agradecido, imediatamente, o presente.

O amigo Adamastor, portador do presente de aniversário do Professor Celestino Pimentel, estava completamente inocente nessa história. E o novo terno de Casimira Inglesa já tinha sido confeccionado pelo melhor alfaiate de Natal.

10 pensou em “CASIMIRA INGLESA

  1. Ah, Vivi,

    Estas “cenas” que jogas no caminho por onde passa meu caminhão… Me levas ao passado, ao menino que fui…

    Minha mãe Catharina era costureira de seu texto e a imagem me levaram ao passado, onde o menino Sancho, totalmente embevecido via pedaços de pano “igualinhos” ao da foto, virando moda…

    Ser criança é tão bom… Aproveito seu texto para mandar um beijo gigante a meu Nelson e minha Catharina… onde estiverem…

    Um ótimo final de semana á amiga.

    • Obrigada pelo comentário gentil, Sancho!

      As doces lembranças enternecem nossa alma…

      : “O coração alegre aformoseia o rosto; mas pela dor do coração o espírito se abate.” (:Provérbio 15:13)

      Olhar pelo retrovisor do tempo as boas lembranças do passado é muito salutar.

      Um ótimo fim de semana para você também, amigo!.

  2. Violante,

    Parabéns por elaborar uma excelente crônica sobre a ansiedade do Almirante Alberto Pimentel para saber se o pai tinha gostado do presente. o seu tio Alberto contava os dias, estranhando a demora de notícias do seu pai. Saber esperar é uma conquista que só poderá ser alcançada com o tempo, com a experiência e um paciente trabalho consigo mesmo. É uma grande virtude que nos protege e nos fortalece diante das adversidades. Isso permite que você lide com os maus momentos de uma forma tranquila. Gostei demais da conta do seu texto porque sou ansioso com o tempo da mesma maneira do seu tio Alberto, e tenho trabalhado para que esse traço fardo desapareça da minha vida; pois há um grande sofrimento em não saber esperar o tempro certo.

    Desejo um final de semana pleno de paz, saúde e felicidade

    Aristeu

  3. Obrigada pelo comentário elogioso, prezado Aristeu!

    Como você disse, “Saber esperar é uma conquista que só poderá ser alcançada com o tempo, com a experiência e um paciente trabalho consigo mesmo. É uma grande virtude que nos protege e nos fortalece diante das adversidades. Isso permite que você lide com os maus momentos de uma forma tranquila”.

    A ansiedade do Almirante Alberto, por não ter recebido resposta da carta enviada ao seu pai junto com um corte de Casimra Inglesa, seu presente de aniversário, poderia ter tomado proporções graves, no momento em que ele passou a duvidar da idoneidade moral do portador, pessoa reconhecidamente íntegra. Ainda bem, que a nova carta que enviou ao pai, agora através dos Correios, foi respondida rapidamente. E as dúvidas do Almirante foram dirimidas. O presente tinha sido entregue em tempo hábil, e o portador estava completamente inocente.. I

    O excesso de ansiedade altera a frequência cardíaca, a respiração, provoca sudorese e dá a sensação de cansaço.
    A ansiedade pode ser normal e é um indicador de doença subjacente, somente quando os sentimentos se tornam excessivos, obsessivos e passam a interferir na vida cotidiana.

    Desejo a você também, um final de semana pleno de paz, saúde e felicidade!

  4. Querida Vivi,

    Após terminar sua maravilhosa crônica, mais uma pérola que entra para os anais de CENAS DO CAMINHO, lembrei-me do personagem Rubin “Huerricane” Carter, que foi condenado injustamente por uma tribunal racista que o deixou mofando na prisão por mais de 30 anos! O extraordinário filme The Hurricane narra essa injustiça com muita competência, que encontrou em Bob Dylan a sensibilidade de fazer uma letra magnífica narrando esses fatos escabrosos e dando nome aos bois.

    É triste saber que isso aconteceu na maior democracia do mundo, como tantos outros casos mais escabrosos ainda!

    Pois bem, o “condenado” mister “Carter não aceitou a usar o uniforme de prisioneiro pois não havia cometido nenhum assassinato. O que precisou da interferência humana de um soldado branco para amenizar a DOR de Rubin “Erricane” Carter.

    Se não assistiu a esse filme ainda, peço-lhe o favor de assisti-lo. Você vai chorar por umas horas de emoção.

    Paz, amor, harmonia e esperança em toda família.

    Você, como sempre, linda demais no que escreve.

  5. Obrigada pela delicadeza de suas palavras, querido colunista Ciço Tavares!

    Vou procurar assistir esse extraordinário filme de que você falou..
    Deve ser chocante o drama vivido pelo personagem Rubin “Huerricane” Carter, que foi condenado injustamente por um tribunal racista, que o deixou mofando na prisão por mais de 30 anos”.
    A coisa pior do mundo é a injustiça.

    O Almirante respeitava muito o pai e não o quis repreender por não ter agradecido o presente. Usou de um arrodeio, insinuando ” de mentirinha”, que o presente pudesse ter sido surrupiado pelo portador, coisa impossível de acontecer. O pai, que detestava injustiça, ao ler a insinuação, mais que depressa agradeceu o presente e defendeu o portador, pessoa acima de qualquer suspeita.

    Uma ótima semana, com saúde, alegria e Paz!

    • Um apelo a Vivi,

      Assista a “THE HURRICANE!”. Você não vai se arrepender porque é um filme dramático, bem feito, sem apelação, típico padrão hollywoodiano.

      As interpretações são impagáveis, a começar pelo ator principal – Denzel Washington, com uma direção seguríssima do veterano diretor Norman Jewison.

      Mas o que mais impressiona no filme foi a genialidade de Bob Dylan, que não leu o processo, estupidamente racista e preconceituoso, e com apenas matérias de jornais e dados colhidos com o condenado injustamente, escreveu uma OBRA-PRIMA, a letra “HURRICANE!”

      Tudo que disse na letra fora confirmado no confronto com os fatos e ele ganhou TODOS OS PROCESSOS MOVIDOS CONTRA ELE!

      Gênio é Gênio!

      Um apelo, Vivi! Compre um lenço para enxugar as lágrimas!

  6. Obrigada pela dica, querido Ciço Tavares! Vou assistir .esse famoso filme.

    Os lenços já estão a postos. Você avisando, o impacto será menor…

    Grande abraço!

  7. Encantadora crônica da Lady do JBF.

    A quebra da confiança é sempre traumática. É pura ansiedade e desgaste. Felizmente não houve este problema. Houve, sim, uma demora injustificada do pai do Almirante em responder a missiva.

    O importante é que tudo terminou bem para todos. Como dizia Fernando Sabino “No fim tudo dá certo, e se não deu certo é porque ainda não chegou ao fim”.

  8. Obrigada pela gentileza do comentário, prezado Marcos André!

    A ansiedade em excesso pode provocar cogitações, injustas e fantasiosas. Foi o caso do Almirante Alberto.
    Mesmo conhecendo, de longas datas, o portador do presente do seu pai, diante da demora do costumeiro agradecimento, por um momento ,chegou a imaginar que não tivesse sido entregue.

    Ainda bem, que ao receber a nova carta do filho, o velho professor lembrou-se que não havia agradecido o presente nem respondido a carta .que o acompanhou.
    E cuidou de lhe escrever imediatamente, dirimindo todas as dúvidas…

    Gostei muito da frase de Fernando Sabino citada por você::

    “No fim tudo dá certo, e se não deu certo é porque ainda não chegou ao fim”.

    Uma ótima semana!

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