MAURÍCIO ASSUERO - PARE, OLHE E ESCUTE

Nesse debate sobre educação, corte ou contingenciamento de verbas para educação, etc. muitas manifestações, expressas de diversas formas, foram vistas por aí. Por isso, como um trabalhador na área de educação, pretendo abordar dois aspectos cruciais relacionados ao tema. O primeiro é sobre um cartaz que vi dizendo “O governo não dá educação porque a educação derruba o governo”. Perdi o sono com isso porque um fato tão relevante como a educação não pode se prestar como instrumento pontiagudo colocado no pescoço do governo, ou seja, se qualquer pessoa ameaçada tomaria medidas de proteção, então o governo ameaçado usaria a mesma medida. Raul Seixas dizia “pena eu não ser burro, não sofria tanto”, mas conhecimento impõe forma diferente de agir. Eu não posso alegar que cometi um crime porque desconhecia a lei, sendo eu formado no início médio ou com doutorado. Manter pessoas burras até faria sentido se o objetivo fosse se perpetuar no poder, mas aqui temos eleição a cada quatro anos e não me parece ambiente para um estado de exceção.

Esse ponto de vista me pareceu extremamente grosseiro porque, mesmo no âmbito de governos totalitários, a questão da educação sempre foi uma temática intensa na defesa do governo. Em Cuba, por exemplo, a política de Fidel era que o estado se responsabilizava pela criança dando-lhe tudo da educação básica até a universidade. A pesquisa deles na área de câncer de pulmão gerou um join venture entre cubanos e americanos (pasmem!). Na, então, União Soviética, Yuri Gagari foi o primeiro homem no espaço, fato que colocou os Estados Unidos na corrida espacial e fez Armstrong ser o primeiro homem a por os pés na lua. As contas para isso foram feitas por cientistas de diversas formações, ou seja, pessoas que tiveram, diga-se, uma extraordinária educação.

Parece-me, portanto, muito pobre essa noção de que ao educar-me, passarei a ser uma séria ameaça ao governo. Creio que meu conhecimento deveria ser colocado a serviço das necessidades do meu país. Na minha sala de aula me convenço de que faço isso porque transmito aos alunos o conhecimento básico para que eles se tornem profissionais capacitados no mercado ou sigam a carreira acadêmica enfrentando uma pós graduação. É isso que a gente sente quando leva um aluno para a defesa de uma tese ou de uma dissertação.

O segundo ponto diz respeito à escolha entre educação básica e educação superior. Certamente, educação básica de qualidade significa uma educação superior ou técnica, também, de qualidade. Deficiências da base se propagam, inevitavelmente, pelo ensino superior e daí tem-se um grande número de reprovações, repetências, etc. em diversos cursos. A escolha do investimento na educação básica ou superior, não pode ser palco, ou ficar ao sabor, de ideologias absurdas. Existem técnicas científicas que auxiliam na tomada de decisão dentre as quais cito programação linear e análise de multicritério. Vamos a um exemplo: George Joseph Stigler, economista americano, lançou um problema relacionado a dieta de soldados. A ideia era saber como fornecer um conjunto mínimo de vitaminas dentro de uma especificada quantidade ração. O problema foi publicado no Times e daí surgiu essa linha de pesquisa denominada Pesquisa Operacional. Com ela eu posso dizer qual a quantidade mínima de nutrientes que uma pessoa deve receber, ou dizer quantas pessoas e máquinas deverão ser usadas num sistema de produção para a produção ser máxima, ou lhe dizer quais as ações que você colocar num portfólio para maximizar seus lucros.

Quem faz avaliação de investimento sabe que os méritos são fundamentais para decisão, ou seja, calcule-se valor presente líquido, taxa interna de retorno, relação custo/benefício e o tempo de retorno. É esse parâmetro que eu quero chegar: tempo de retorno. Compare o tempo de retorno com um investimento feito em cada um desses segmentos. Na educação básica nós vamos esperar os 9 anos de primeiro grau, mais três anos de ensino médio, mais uns quatro anos de ensino superior. Temos 16 anos de espera, no mínimo, considerando que não houve abandono ou repetência.

Investimento no ensino superior gera pesquisa. Lógico que a qualidade de algumas pesquisas, alguma teses ou dissertações, é plenamente refutável, incluo aqui a de Alexandre de Morais. Nem ele seguiu o que defendeu. Eu quero falar de coisas palpáveis como:

a) O vírus HPV é responsável por 80% dos casos de câncer de colo de útero e se não fosse o trabalho de pesquisadores não haveria vacina para reduzir a taxa de contaminação e o número de óbitos;

b) Albert Sabin evitou que milhares e milhares de pessoas fossem usuários de muletas e cadeiras de rodas. A certeza que ele tinha na sua pesquisa era tanta que ele injetou o vírus nele para convencer sobre a necessidade de produção em série;

c) Gerar energia limpa não significa botar um catavento na porta de casa ou uma lâmina de vidro para esquentar ao sol. Precisa pesquisa para conduzir a energia gerada para consumo ou para distribuição;

d) O celular que você usa, hoje, inclusive para fazer ligações telefônicas, é fruto de pesquisas em softwares. Hoje, tem alternativas de transformar texto voz em texto, fato que beneficia, por exemplo, a Polícia Federal que na precisa fazer transcrição das conversas gravadas nas escutas telefônicas;

Poderia enumerar várias questões que fortalecem a ideia de que o investimento no ensino superior traz retorno que beneficiariam os investimentos na educação básica. Tem desvios? Sim! Não quero defender aqui as teses esdrúxulas das experiências pessoais de sexo grupal, animal, homossexual, etc. em banheiros públicos. Então, ao invés de condenar os bons pela ação dos ruins, devemos definir critérios.

Finalmente, o trabalho de pesquisa feito na universidade tem como destino a sociedade. No mundo todo, existe parceria entre sociedade e universidade. As empresas se desenvolvem por que tem um cientista doido pensando na solução do seu problema. Sem pesquisa, o futuro é incerto e insustentável. Se você quiser saber como resolver uma equação do 3º grau do tipo x³ + bx² + dx + d=0, estou à disposição.

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