ROQUE NUNES – AI, QUE PREGUIÇA!

Ziad

Ziad Daud Ibrahim era comerciante de papelaria em Corumbá/MS e sua loja era bem movimentada porque fazia as vendas a crédito a todas as escolas públicas do município, na base do: quando entrar o dinheiro a gente corre aqui e paga. Naquela época eu adjuntava com a diretora da escola onde trabalhava e era o preferido para negociar com ele. Na sua língua arrevesada sempre dizia “brofessora Neuza non boa negociante, Ziad brefeve brofessor Roque”. Isso porque o velho gostava era de negociar, e não vender. E a negociação demorava horas, misturada com chá e pechincha. Seu filho, Sami era um amor de pessoa. Educado, fino, delicado. Alguns, na atualidade iriam dizer que era fresco, mas não. O rapaz era trabalhador e sabia conquistar fregueses. Casado, com um moleque de 4 anos que tinha o satanás no couro. Certa vez em uma negociação vespertina, vi o garoto ir para a rua. Seu Ziad, com um corpanzil de entulhar qualquer recinto, de dentro da loja grita: vilhinha, entra loja, entra senão babai dá a bunda! Olhei para o lado, disfarcei o sorriso e continuamos a negociar.

Eulâmpio

Eulâmpio foi meu aluno na sexta e sétima série do antigo primeiro grau – daí vocês já percebem que este caeté que vos fala já tá queimando óleo 45 e prafrentemente disso – Menino fora de tempo, atrasado em todas as situações, até para falar. Certa vez cobrei dele uma atividade de Língua Portuguesa que passara uma semana antes. Deu aquele sorriso idiotizado, escandindo cada ritmo do riso. Professor – numa voz que misturava batata assada e mingua na boca -, eu não fiz. Sai com minha mãe e esqueci. Isso porque eu pedira a atividade na quinta, e já estávamos na segunda-feira da semana seguinte. Coçou a cabeça, enfiou o dedo no nariz e foi sentar. Na última vez que o vi era assessor parlamentar de um vereador da Cidade Branca. Nesse momento me deu vontade de também sorrir com aquele olhar abobalhado que era a marca registrada de Eulâmpio com todos os seus professores.

Tio Vicente

Tio Vicente – saudoso e alegre tio – era loroteiro até não poder mais. Não pescava nem gripe, mas todo fim de semana era convidado pelos amigos para ir para a pescaria, só para ouvirem as lorotas dele, e meu irmão Heraldo atiçava ainda mais esse lado dele. Certa vez, na fazenda contamos que vimos um ninho de arichiguana – é um tipo de abelha preta que dá muito aqui no Centro Oeste. Produz um delicado mel claro, mas ferra doído -. Tio Vicente, de imediato disse que iria pegar essa colmeia. E planejou: iria montar em um cavalo, galopar, passar pela colmeia, laçar o tronco onde ela estava. Com a corrida, o tronco batendo no chão, espantaria as abelhas e ficaria só os favos de mel. Melhor dito, foi executado. Nós observando as peripécias dele. De fato, galopou, laçou o ninha e saiu correndo. Quando o laço deu o estirão, a cilha do cavalo arrebentou e o laço fez o efeito elástico. Titio voltou com a cela e tudo e bateu de costas no tronco onde estavam as abelhas, perdendo o ar. Voltou quinze minutos depois, todo ferrado e ameaçando surrar o primeiro moleque que risse dele.

Tio Coró

Tio Coró, também conhecido como Sebastião Siqueira da Cunha, tio por ter casado com minha tia era funcionário do Banco do Brasil, mas o que mais gostava era de caça, na época em que as pessoas se preocupavam mais com a manutenção da família do que em queimar mato enrolado em seda. Naquela sexta à noite, saiu ele e dois cupinchas que não se desgarravam e foram caçar cateto nas matas de São Vicente, a uns 80 Km de Cuiabá. Tio Coró tinha uma carabina 12 cano serrado. Dedé, amigo, compadre e cúmplice dele só relatou o seguinte: estavam no carro quando tio Coró viu um vulto correndo ao lado da pista. Sacou a sua carabina e lascou o tiro. O gatilho até pulou na alegria da pólvora. Mas, tio Coró esqueceu que a carabina tinha cano serrado e colocou a mão de apoio bem na boca do pau de fogo. O resultado foi dois dedos da mão esquerda a menos, uma corrida no pronto socorro e uma semana meu tio enchendo a paciência de minha tia, em casa, por causa do incidente.

Alvino

Outro que gostava de caça era o cunhado de meu irmão o Alvino. Meu saudoso irmão, Ronaldo contava que certa vez foram levar uma carga da cidade para o sítio de um senhor em que ele trabalhava de motorista, naqueles caminhões Mercedes, que o povo de má língua chama de muriçoca. Alvino levava a espingarda – e naquela época era muito comum, não tinha essa baboseira de porte e posse de arma – ao lado de seu banco. Meu irmão contava que Alvino viu um vulto correndo ao lado do caminhão, pediu para meu irmão segurar a direção, sacou a carabina e deu dois tiros no vulto que entrou no mato. Parou, desceu e foi ver o que havia abatido. Encontrou o estepe do caminhão que se soltara, com dois tiros na banda de rolagem, morto, mortinho da silva, em uma vala ao lado da rodovia.

2 pensou em “CAETICES II

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