CARLOS EDUARDO SANTOS - CRÔNICAS CHEIAS DE GRAÇA

Maristelo de Holanda Melo, de Glória de Goitá, leitor, atento do JBF, me lembra que o título de nossa coluna literalmente perdeu a graça.

E dá justa “marretada”:

Suas histórias, quase todas, têm sido sérias demais. Cadê a graça?

Dantes, eu me deliciava com suas presepadas, suas histórias hilariantes.Agora, na verdade, aprendo alguma coisa ou tomo conhecimento de fatos históricos. Mas, o pitoresco dos seus conteúdos desapareceu.

Gosto de certas “lapadas” dos que me honram com suas leituras; isto porque não escrevo para mim e sim para o público. Tenho o intuito de agradar e se assim não o fizer, estou saindo de um caminho que preciso rever.

De fato, Maristelo tem razões!

Aproveitando, atendo ao leitor com uma história real acontecida num dos gabinetes do Palácio do Planalto.

Na década de 80, quando participei, como Secretário-geral da Campanha de Integração Social da Hanseníase, fui à Brasília, compondo uma Comissão de representantes de instituições beneficentes, de vários estados, a fim de entregar um memorial ao Governo Federal, com reivindicações.

Tínhamos o intuito de evitar que se escrevesse em documentos do serviço público a palavra “lepra”, razões da propagação da simples doença dermatológica hanseníase, (antigo Mal de Hansen) razão de nossa Campanha. Tínhamos a certeza de que se tratava de um “Estigma Cultural”, conforme titulei um dos meus livros dedicados a essa causa.

Outra reivindicação era que os Ministérios promovessem a difusão dos novos métodos de cura,, por todos os meios possíveis, da simples doença dermatológica, para a qual havia medicamentos simples, fornecidos pelos Postos de Saúde de todo o País.

Evitar-se-ia a causa de tantos estragos ao corpo humano, como o fizeram as denominações de “lepra” e “morfeia” o fizeram, mesmo trancafiando os doentes nos antigos leprosários, hoje apenas Hospitais de Dermatologia Sanitária.

D. Maria Izabel de Oliveira Rocha, funcionária do Escritório de Pernambuco na Capital Federal, se encarregou de obter as audiências, dentre elas uma com o Ministro Chefe-de-Gabinete do Presidente João Baptista Figueiredo, Leitão de Abreu.

Éramos 15 pessoas. Não sabíamos se o Gabinete do Ministro seria ou não suficiente para tanta gente. Mas isto não foi nada!

Fomos chegando e nos ajeitando diante da mesa do Ministro, porque só havia dois divãs e três cadeiras. Resultado, ficamos todos de pé. E toca o ilustre a demorar. Mas a Secretária, educadíssima, nos acalmava, oferecendo um cafezinho e informando, por mais de uma vez, que ele estava numa sala contígua e logo viria. Soubemos depois que na verdade a sala contígua era um wc.

Às 11h15 aparece o Ministro, cidadão distinto, de idade já avançada, ainda enfiando, discretamente, o resto do cinturão nas calças, passando o lenço no rosto para tirar o suor e pedindo desculpas.

Imaginei que houvesse saído de um “momento de esforço para defecar”…

Na verdade, deveria ter acabado de “despejar o barro”, por isso, a respiração ligeiramente ofegante. Afirmara, porém, que a razão de sua demora fora ter sido aquele, um dia, de várias audiências.

Eu, como Secretário, apresentei os Representantes da Campanha. O cientista Abrahão Rotberg, Presidente de Honra da Campanha e criador da terminologia “Hanseníase”, iniciou a apresentação para a entrega das reivindicações, palavreados que não demoraram mais de cinco minutos.

Em seguida, o Ministro deixou claro que iria colaborar com a nobre Campanha da Hanseníase. Como bom gaúcho, puxou conversa sobre o tema, a fim de melhor se assenhorar da petição.

Cabe salientar que além de atendimento a todos os pleitos contidos em nosso Memorial, graças à participação posterior do Governador de Pernambuco, Dr. Marco Antônio de Oliveira, Maciel foi criada a Lei 8830/81, que além das medidas profiláticas concedeu uma Pensão Especial para os mutilados pela doença hanseníase. No primeiro lote foram beneficiadas 830 famílias de ex-doentes.

Mas, voltemos ao pitoresco da reunião.

Num instante toca o telefone e a Secretária interrompe a reunião, pedindo licença aos presentes para o Ministro atender ao Presidente da República.

Nesse momento, ouvi certo murmúrio seguido de discretos sorrisos por parte de senhoras que estavam atrás de mim. Foi quando indaguei: 

“Qual é a graça? ”

O Ministro está com a braguilha desabotoada!…

3 pensou em “BRAGUILHA DESABOTOADA

  1. Excelente! Kkk. A “marretada” desferida pelo zeloso leitor Maristelo de Holanda Melo foi deveras oportuna, pois fustigou a verve eminentemente humorística do nosso querido escritor Carlos Eduardo Santos, de quem tenho a honra de ter sido colega no vetusto Banco do Brasil. As crônicas do Carlos Eduardo são verdadeiras histórias do Brasil, escritas com refinamento e mescladas com o mais fino humor. Seu vasto saber, no entanto, não surgiu de um piscar de olhos; pelo contrário, é fruto de uma vida de muito estudo e de uma vasta e rica experiência literária. Escreve desde os cueiros. Parabéns ao Maristelo, o fustigador. Parabéns ao sagrado colunista fubânico, Carlos Eduardo Santos, que nos brinda com crônicas hebdomadárias provindas de uma mente tão brilhante, tão privilegiada. Abraços desde Fortaleza. Boaventura Bonfim.

  2. Caro Dr. Boaventura,

    Esse seu generoso coração é um Baú de Sílvio Santos cheio de bondades prontas para serem doadas independente de sorteios do Baú da Felicidade..

    Muito grato,

    Carlos Eduardo

  3. Não há de que, Caríssimo Carlos Eduardo! Meu despretensioso comentário é apenas reconhecimento do valor que já lhe é intrínseco.
    Sua higidez, em plena senectude, é sublime exemplo para juventude contemporânea. Um forte abraço, Boaventura.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *