JOSÉ RAMOS - ENXUGANDOGELO

Idoso dando continuidade à vida

Era apenas o início de mais um dia, como tantos outros. Mas, o frege naquela casa fazia parecer que ninguém dormira – o barulho causado pela movimentação da preparação da filharada para começar mais um dia de trabalho e sustentação da roça. Era assim, na casa de Doroteu e Alice.

A casa, ainda desarrumada, tinha uma porção de quartos e camarinhas. Meninos e meninas dormiam no mesmo aposento, uns nus e outros vestidos, pois, maldade das ideias estava distante dali e todos se respeitavam.

Café servido e tomado. Tapiocas, cuscuz, leite de cabra, macaxeira cozida, batata doce e até carne assada faziam o “breakfeast” da família numerosa de Dodô de Alice – era assim que Doroteu, casado de papel passado com Alice, era conhecido por aquelas paragens. Guaiúba, mais precisamente. Hoje, Região Metropolitana de Fortaleza.

Eis que os tempos mudaram. Os meninos cresceram, casaram e tiveram que procurar seus destinos. As meninas não foram diferentes, embora Maria Alice, a caçula, tenha feito peraltices com alguém sem-futuro, no que resultou numa prenhês indesejada.

Todos da Guaiúba viram o crescimento e o esfacelamento natural daquela família. Eis que Maria Alice, por conta dos dotes físicos avantajados, não demorou muito para conseguir um novo interessado – que assumiria, também, o “bruguelo” que não era seu filho biológico. Mas, isso era o menos importante para quem pensava em “desfilar” pela cidade com aquele monumento de mulher.

Alice encantou-se. Com os filhos todos em novas vidas, o passar do tempo mostrou para Dodô de Alice, a solidão. Momento inevitável para quem vive. Por amor à quem lhe ajudou na construção da vida e da família, Dodô de Alice decidiu que sua cama seria transformada num catre, e não seria mais dividido com outra mulher. Reuniu os filhos e decidiu que a casa da Guaiúba seria de Maria Alice. E assim foi feito.

Dodô de Alice partiu para uma nova vida, não tão nova, porque solitária. Num terreno que ainda era parte da propriedade da família, nas proximidades do Açude Novo, resolveu fazer a sua própria moradia. Não demorou muito e, numa semana, um casebre foi erguido. Varas nas paredes sustentariam a rede armada. Um pote com água, era a única “mobília” decorativa do ambiente, com o enfeite de uma caneca de alumínio. Num canto, um fogão com “duas bocas” tocado a lenha, para cozinhar o feijão e o que mais houvesse.

Dodô de Alice ainda conseguiu superar aquela solidão que a vida lhe impôs, por pelo menos dez anos. Nesse período, em duas oportunidades teve a presença de alguns filhos e muitos netos – sempre no dia 29 de fevereiro, data do seu aniversário. Nesses dias, o almoço que regava o encontro, era organizado e servido debaixo de uma frondosa mangueira, onde ele, caprichosamente, esculpiu com um canivete, dois corações unidos pela flecha do cupido, com os dizeres: Dodô e Alice!

* * *

A NUDEZ QUE A CHUVA DESENHAVA

Banho de chuva e o prazer dos olhares

Vila Pasteur, uma das três vilas que ficava na “Baixa da Égua”. Morador mais antigo daquela vila, Messias ao concluir sua moradia, lembrou de atender um pedido das crianças, e construiu no alto da frente da casa, um jacaré. É, um jacaré – que é como todos denominam aquela manilha de cerâmica colocada no alto e na frente da casa, para o escoamento das águas da chuva. É certo que as chuvas eram escassas, mas não custava nada atender o pedido das crianças.

O tempo passou, e mais vizinhos chegaram e construíram suas casas, separadas umas das outras por pequenos muros altos nas laterais e baixos nas frentes – forma de garantir a manutenção da amizade dos vizinhos.

As crianças de Messias, nascidas do ventre de Divanira, eram três: Carla, Ana Carla e Carla Ana. As três, chegaram para se juntar à Monalisa, fruto de outro relacionamento amoroso de Messias.

Monalisa era estudante universitária e pretendia, um deia, se tornar Odontóloga. Em casa, preferia os livros, principalmente os didáticos relacionados à sua futura profissão.

Os “meninos e os homens” da vizinhança afirmavam que, Monalisa, se fosse possível fazer uma comparação, nada ficaria devendo à Sônia Braga, nos mais tentadores anos da juventude da atriz, que a televisão e as telas do cinema mostraram para nosso deleite.

Perfeita, a Natureza às vezes impõe castigos aos humanos. Houve tempo em que chuva era algo raro naquela Vila Pasteur. Ainda bem que, quando chovia, chovia forte e por vários minutos. Permitia um bom banho debaixo do jacaré da casa de Messias – um prêmio para os meninos e a confirmação para os rapazes, de que, “quem espera, sempre alcança”.

Vestida de chitão e uma minúscula calcinha, Monalisa, como qualquer deusa, se punha a banhar debaixo daquele jacaré. Nenhum rapaz aparecia (todos, literalmente todos, se escondiam atrás das portas e janelas), para ver Sônia Braga no corpo de Monalisa. Quanto mais chovia, mais o vestido colava no corpo, desenhando e esculpindo a beleza natural de uma fêmea.

Distantes, todos torciam para que Monalisa “lavasse o cabelo”, pois significaria demorar mais tempo debaixo do jacaré, expondo uma nudez que só a imaginação consegue desenhar e descrever. Muitos caíam em depressão, quando a chuva parava, acabando com o privilégio. Sem que se soubesse definir, se nua ou molhada, Monalisa, após deliciar os olhares dos rapazes, entrava rápido. Eu, como se dirigisse uma cena de um filme, digo: corta!

16 pensou em “A SOLIDÃO INEVITÁVEL E O AMOR ETERNO

  1. O maior barato do conto do grande memorialista OLIVEIRA é que, a sua Monalisa RIA ao se deleitar com os pingos de chuva que escorriam debaixo do jacaré.

    P.S.: – Por que a Gioconda ďo Da Vinci na RIA, hein?!?!?!

    • Altamir: claro que ninguém conseguiu comprovar a afirmação, mas alguns diziam que, Monalisa ria com a boca, mostrando os dentes alvos e perfeitos, e se deleitava em gozo por debaixo da peça íntima, molhadinha duas vezes.

  2. Lá no meu sertão, chuva sem foi sinônimo de alegria e banho de chuva era um deleite. A gente era inocente, mas já admirava um peitinho durinho sob a roupa molhada.

    • Beni, imagine aquele mamilo espalhado, apontando sempre na horizontal! Espalhado, molhado e sem sutiã! Affffmaria!

    • Marcos: obrigado conterrâneo. Banho de chuva é sempre bom! Quando íamos pra Guaiúba, ou Pacatuba, minha Avó não deixava a gente banhar na chuva, dizendo que era arriscado cair raio, por ser pé de serra!

  3. Affffmaria! escreveu JoséRamos.

    Affffmaria, repetiu Sancho ao ler o gostoso texto e de ter entrado na chuva com Monalisa de meu amigo Ramos. Êita que esses colunistas fubânicos são de deixar ancho até o Sancho.

    “Ganho meu precioso tempo” lendo essa gente fubância, que se espalha nas colunas e comentários e sinto essa cumplicidade gostosa, essa alegria de ler tal texto e poder dizer que José Ramos é daqueles que fazem a prosa ficar, a cada texto mais gostosa.

    Beijo em vosso coração, grande amigo

  4. Ramos, como se dirigisse uma cena de um filme, disse: corta!
    Sancho espera que o diretor Zé nos proporcione uma trologia de série tão inspiradora para nossa imaginação…

    • Sancho: esse comando “corta”, foi providencial. Será que tinha alguém querendo descascar a mandioca logo debaixo da chuva? Sexo explícito, na chuva, não pode!

  5. Zé Ramos dessa vez eu vou juntar pra dizer zeramos! Corta o quê homem de Deus. Grita de novo ação! Traz um carro pipa e deixa o banho continuar.

    • Assuero: kkkkkkkkkkk banho de chuva é muito bom né siô! A menina vestia um vestido velhinho, calcinha que parecia fio dental, sem sutiã!………affffmaria! Sou cardíaco siô! Num posso nem pensar nisso. Aliás, naquilo!

  6. Zé Ramu, meu camarada, tu és um craque que nos embriaga com tuas crônicas maravilhosas.. Um craque no futebol, sua história de vida e um craque na amizade que sabe conquistar, mesmo à custa de “matracadas” na cabeça dos amigos de fé, irmãos e camaradas, que mesmo longe do convívio diário dessa gazeta escrotíssima e tão amada por todos nós, não deixa de -quando em vez- vir espionar os causos de tanta gente boa que conheceu e de quem se tornou fã. Ou “fão”, como diz o outro temendo ser confundido, kkkk Aceito de bom grado as “matracadas” vituais, mas a matraca de jatobá, a de verdade, tocada nos bumba-meu-boi do Maranhão, no sotaque mais musical do mundo, continua guardada como relíquia. E a tua Prefeitura lá na Lua, como é que vai ? São Jorge já se aposentou, né ? E as meninas que mandaste buscar de foguete, diretamente lá do Ceará, para vosso deleite de povoar o Satélite que estimula os sonhos dos poetas ? Abraço forte, mermão !!! Eu não sou fantasma, ainda não, mas apareço puraqui, puralí, puraculá, como diz
    nosso querido Jessier Quirino !”

    • Fredão, bom saber que continuas entre nós. Nestes tempos sombrios, isso para os que consideramos, é um prêmio. Bomtivê, irmão-parceiro. Agradecido pelo comentário.

    • Fred: chavesse não, amigo! É só uma camisa. Tirou, lavou e guardou ou jogou fora, muda tudo. Esse, sinceramente, também me engabelou. Fico pensando: se ele “sacaneou” o mequetrefe do Lula, por que o colegiado do TRF-4 confirmou, reconfirmou e ainda aumentou o castigo? Deixa pra lá! Coisas que só o sapo cururu vai conseguir destrinchar um dia.

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