VIOLANTE PIMENTEL - CENAS DO CAMINHO

Mais uma vez, estamos vivendo a Semana Santa. Mais uma vez, assistimos a paixão e morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, como também de outros Cristos, pessoas desvalidas, que apodrecem nas cadeias, sem defesa, e sem assistência digna.

O que vemos é que o mundo continua sob a opressão dos “poderosos”. Vemos o sofrimento dos mais fracos, com a perseguição e a tortura física e psicológica dos injustiçados.

A perseguição aos injustiçados e a opulência dos maus é chocante. Não se sabe até quando irá essa opressão.

Nossos antepassados, se pudessem voltar à vida, se assombrariam diante do turbilhão de maldades espalhadas pelo mundo atual, onde há um imenso palco, em que se desenrola a Paixão, não de um só Cristo, mas de inúmeros Cristos, que neste País, diariamente, são perseguidos, humilhados, torturados e crucificados.

O profano se sobrepuja às coisas santas. A igreja tornou-se um reduto de políticos, em época de campanha eleitoral, que se misturam aos verdadeiros cristãos.

Os costumes mudaram, mas a corrupção continua predominando.

A “caridade dos poderosos”, nesta Semana Santa, continua nas trevas. Só praticam o mal, perseguindo e desmoralizando pessoas e famílias inteiras.

Hoje, Sexta-feira Santa, não há respeito ao sofrimento de Cristo, salvo nos ritos religiosos. As operações para capturar infratores continuam ininterruptamente, transformando a Semana Santa num período mais do que profano. Um período de maus tratos ao ser humano, sofrimento, perseguição e humilhação.

A volúpia da perseguição vivida pelos podres poderes cada vez aumenta mais, e a mídia se delicia com isto, como se vê a olhos nus nos noticiários televisivos.

Tempos estranhos, estes que vivenciamos.

Mudando o rumo “desta prosa”, tento fixar meu pensamento num tempo distante e feliz, em Nova-Cruz (RN), terra abençoada, onde nasci e me criei, e onde hoje estão sepultados Francisco e Lia, meus inesquecíveis pais e de meus cinco irmãos. Vejo-me no tempo da minha infância e juventude, com a família toda reunida na Semana Santa, período esperado com ansiedade.

Ainda hoje trago na memória o calor humano da família toda reunida em Nova-Cruz (RN), e o clamor dos pedidos de esmolas, feitos por crianças, durante a Semana Santa, principalmente na Quinta-Feira Santa e Sexta-Feira da Paixão:

“ Uma esmolinha, pelo amor de Deus, pra minha mãe jejuar no dia de hoje!”

Esse apelo continua vivo na minha lembrança, e a saudade desse tempo feliz, quando ninguém tinha morrido, continua a mesma.

Hoje, vemos pessoas que podem comprar comida, mas não possuem a liberdade de ir e vir. Vivem sob a tirania daqueles que se sentem poderosos e que se acham no direito de tripudiar, humilhar e perseguir suas presas, na ânsia de crucificar e colocar uma pedra em cima daqueles que não se enquadram na cartilha traçada por eles, ao arrepio da lei.

Na época da minha infância e juventude, em Nova-Cruz, década de 60, na Quinta-Feira Santa e Sexta-Feira da Paixão, as esmolas eram de bacalhau e brote. Nessa época, bacalhau era produto de baixo custo, como também a qualidade era uma só, sem opção de um produto melhor. Na sala da nossa casa, ficavam um saco com brotes e outro com bacalhau, que minha saudosa mãe distribuía com os pedintes.

Na Sexta-Feira da Paixão, havia uma grande preocupação das famílias, de esconder suas galinhas dentro de casa. Os “biriteiros” de plantão costumavam furtá-las dos quintais nessa noite, e transformá-las em guisados, para lhes servir de tira-gosto.

O furto de galinhas, na noite da Sexta-Feira Santa, era uma tradição, fruto da cultura popular nordestina. Geralmente, os “gatunos” eram jovens conhecidos e de boa família, e faziam isso por brincadeira, às vezes compartilhada pelos próprios donos.

As comadres da minha mãe, que residiam na zona rural, traziam-lhe beijus de goma e coco de presente, cujo cheiro e gosto nunca esqueci.

A Semana Santa, para os adeptos da Igreja Católica, era uma época triste e sombria. Para começar, não havia aula durante essa semana. O martírio de Nosso Senhor Jesus Cristo era revivido com respeito. Não se ouvia música profana. Não se chamava nome feio, e quase não havia briga. Era um período de reflexão e esperança de um mundo melhor.

Na Quarta-Feira da Semana Santa, a chamada Quarta-Feira de Trevas, não se ouvia o apito do trem, pois ele não trafegava. Não havia entrega de leite dos currais, pois não se tirava leite naquele dia, sob pena de “em vez do leite, do animal jorrar sangue”. Ainda por cima, propagava-se o perigo de ficar entrevado, para aquele que tomasse banho na Quarta-feira de Trevas.

Esses medos faziam parte da crendice popular, nos recantos nordestinos mais atrasados. Mas Frei Damião, em suas Missões, desmistificou esse costume, comum na zona rural.

Na Quinta-Feira Santa , quando se revive a traição de Judas durante a Última Ceia, sentia-se na cidade o clima de tristeza, Era o começo do martírio de Jesus, que carregaria sua Cruz até ser crucificado e morto.

Na Sexta – Feira da Paixão, Jesus estava morto e a imagem do seu corpo ficava em exposição na Igreja, durante todo o dia. Formava-se uma fila interminável, para que os fiéis o beijassem.

Nesse dia triste, eram praticados o jejum de carne e a abstinência de bebidas alcoólicas.

As rádios só transmitiam músicas sacras ou clássicas. Não se comercializava nenhuma mercadoria, em respeito ao sofrimento de Jesus Cristo, traído por Judas, em troca de 30 moedas.

Os clubes sociais e outros ambientes de entretenimento não funcionavam, em respeito à morte de Jesus Cristo.

O sábado de Aleluia revive a expectativa da Ressurreição de Jesus Cristo, o filho de Deus. A liturgia da Páscoa, ou passagem, ocorre pela madrugada.

A Páscoa Cristã é uma das festividades mais importantes para o cristianismo. De acordo com o calendário cristão, a Páscoa consiste no encerramento da chamada Semana Santa.

Nos dias de hoje, há diversos judas infiltrados nas multidões e vários Cristos estão vivendo seu Calvário, com uma imensa torcida para que sejam crucificados.

A adoração ao “vil metal”, ou seja, ao dinheiro, se sobrepuja ao sentimento cristão, e as igrejas se tornaram redutos políticos, procurados pelos podres poderes durante campanhas eleitorais.

Quando estava orando no Monte das Oliveiras, num jardim chamado Getsêmani, Jesus disse: “Pai, afasta de mim este cálice!” Isto ocorreu na noite em que Ele foi traído. Antes, Ele havia acabado de celebrar a última Páscoa com seus discípulos, e instituído a Ceia do Senhor, como uma ordem a ser observada por seus seguidores.

Ele partiu para o Monte das Oliveiras como de costume. Ali Ele pediu que seus discípulos vigiassem em oração. Ele se afastou um pouco deles com o objetivo de orar. A Bíblia diz que ali Jesus orou ao Pai intensamente.

Naquele momento, Jesus Cristo estava experimentando um estado de agonia tão extremo, que até o seu suor se transformou em gotas de sangue. O escritor de Hebreus, também descreve que naquele momento Jesus apresentou um grande clamor com lágrimas ao Pai (Hebreus 5:7). Ali ele estava vivendo os momentos finais antes da prisão que resultaria em sua morte. Foi justamente nesse contexto que Ele clamou:

“PAI, AFASTA DE MIM ESTE CÁLICE!”

2 pensou em “A SEMANA SANTA

  1. Violante,

    Excelente a sua crônica sobre a Semana Santa. Meus parabéns por fazer uma comparação entre o tempo de Jesus Cristo e os dias atuais com diversas injustiças, guerras em que os poderosos matam com o intuito de aumentar seus territórios e a cobiça por bens materias em que os fins justificam os meios.

    Na Semana Santa, devemos associar ao sofrimento de Cristo o mesmo que acontece com tantas famílias e pessoas violentadas em nosso tempo. Podemos dizer da violência armada, dos trágicos acidentes de trânsito, das doenças que causam morte, do surto da dengue, dos vícios que ceifam muita gente etc.

    Aproveito esse tema tão importante e atualíssimo para compartilhar um cordel do poeta popular alagoano José Pacheco da Rocha (1890 -1954) com a prezada amiga:

    OS SOFRIMENTOS DE JESUS CRISTO

    Oh! Jesus, meu redentor
    Dos altos céus infinitos
    Abençoai meus escritos
    Por vosso divino amor
    Leciona um trovador
    Com divina inspiração
    Para que vossa paixão
    Seja descrita em clamores
    Desde o princípio das dores
    Até a ressurreição.

    Dentro do livro sagrado
    São Marcos com perfeição
    Nos faz a revelação
    De Jesus crucificado;
    Foi preso e foi arrastado
    Cuspido pelos judeus
    Por um apóstolo dos seus
    Covardemente vendido
    Viu-se amarrado e ferido
    Nas cordas dos fariseus.

    Dantes predisse o senhor
    Meus discípulos me rodeiam
    E todos comigo ceiam
    Mas um me é traidor,
    Sobre a mão do pecador
    Meu corpo ao suplício vai
    Porém vos digo que ai
    Do homem que, por dinheiro,
    Transforma-se em traiçoeiro
    Contra o Filho do Deus Pai.

    Todos na mesa consigo
    Clamavam em alta voz
    Senhor, Senhor, qual de nós
    Vos trai, dos que estão contigo?
    Disse Cristo: – É quem comigo
    Justamente molha o pão
    E todos me deixarão
    Mas São Pedro respondeu:
    – Mestre, garanto que eu
    Não vos deixarei de mão.

    Em verdade deixarás
    Nessa noite, sem tardar,
    Antes do galo cantar
    Três vezes me negarás
    Pedro com gestos leais
    Disse em voz compadecida
    És-me a morte preferida
    Mas não serei teu contrário
    Ainda que necessário
    Me seja perder a vida.

    Estava tudo benquisto
    Com Pedro dizendo igual
    Até na hora fatal
    Da prisão de Jesus Cristo,
    Então quando se deu isto
    Pedro a espada puxou
    Num fariseu despejou
    Um golpe tão desmedido
    Que destampou-lhe o ouvido
    Quando a orelha voou…

    Ouviu a voz sublimada
    De Cristo em reclamação
    Dizendo em repreensão
    Pedro, guarda a tua espada,
    Deixa, não promovas nada,
    Porque tudo é permitido
    Não sejas enfurecido
    Não tentes e nem te alteres
    Pois se com o ferro feres
    Com ele serás ferido!

    Depois da tropa chegada
    Jesus foi interrogado
    Bastantemente acusado
    e Pedro viu da calçada
    quando veio uma criada
    perguntando com rigor
    – Tu és acompanhador
    do que está preso aqui?
    Pedro disse: eu nunca vi
    nem conheço esse Senhor.

    E assim continuou
    de quando em vez a negar
    antes do galo cantar
    3 vezes Pedro negou
    depois então se lembrou
    do que Jesus tinha dito
    amargo e bastante aflito
    derramou pranto no chão
    porque fez a transgressão
    do que disse a Jesus Cristo.

    Jesus além da prisão
    bofetes e pontapés
    ainda diziam: tu és
    réu da crucificação
    e procuravam razão
    para o tal cruel transporte
    uma testemunha forte
    com legalidade pura
    que lhe desse a desventura
    passando a pena de morte.

    O sacerdote indagou
    perante os fariseus
    tu és o Filho de Deus
    disse Jesus Cristo: – Eu sou
    em breve verão que vou
    pra meu pai Celestial
    eis a voz sacerdotal
    pra que testemunha mais
    do que as blasfêmias tais
    da boca do mesmo tal.

    E rasgando-lhe o vestido
    cuspiram as faces divinas
    logo das mãos assassinas
    foi espancado e ferido
    nas cordas foi envolvido
    atado de braço e mão
    no outro dia então
    ordenou Poncio Pilatos
    dizendo aos insensatos:
    – Dai-lhe crucificação.

    Pilatos bem que sabia
    quase com realidade
    que por inveja ou maldade
    deu-se essa algozaria
    mas Jesus nada dizia
    Pilatos quis revogar
    mas não podia falar
    a tantos que lhe cercavam
    que lhe pedindo gritavam:
    – Mandai-o crucificar.

    Sob o poder dos ingratos
    escribas e fariseus
    Jesus o Filho de Deus
    foi entregue por Pilatos
    os mais horrendos mal tratos
    cada um deles fazia
    Jesus a cruz conduzia
    golpe de sangue lançava
    do peso que carregava
    quando topava caía.

    Do seu vestido brilhante
    brutalmente lhe despiram
    depois noutro lhe vestiram
    de púrpura agonizante
    uma coroa infamante
    de espinhos tecida a mão
    pra fazerem mangação
    na cabeça lhe botando
    todos gritavam zombando
    viva o rei da nação.

    Um algoz lhe espancou
    com uma cana pesada
    que com esta bordoada
    sua cabeça sangrou
    seu sangue se derramou
    lavando-lhes os ombros nus
    e marchando em passo truz
    para em Gólgota chegar
    aonde ia se findar
    morto e pregado na cruz.

    Jesus depois de cravado
    ouviu-se os gemidos seus
    clamando Deus oh! Meu Deus
    porque fui abandonado
    e viu-se o astro nublado
    trevas pelo mundo inteiro
    um centurião fronteiro
    disse verdadeiramente
    este homem é inocente
    filho de Deus verdadeiro.

    Desejo uma Semana Santa com paz, saúde, harmonia e a inspiração de sempre!

    Aristeu

  2. Obrigada, Aristeu, pela gentileza do comentário e por compartilhar comigo o belíssimo e emocionante cordel OS SOFRIMENTOS DE JESUS CRISTO, do poeta popular alagoano José Pacheco da Rocha (1890 – 1954).
    Gostei imensamente!
    O período da Semana Santa me traz muita saudade dos dias idos e vividos, quando as famílias se reuniam, num clima de seriedade e respeito, revivendo a Paixão e Morte de Nosso Senhor Cristo.
    O jejum e abstinência eram religiosamente cumpridos, conforme os costumes pregados pela Igreja Católica.
    Hoje em dia, a Semana Santa continua respeitada nas Igrejas, mas a maior parte das pessoas aproveitam o período para o lazer. Para a juventude, a Semana Santa é um período de festas.
    Os tempos mudaram e o sentimento da caridade está muito esquecido nos dias atuais. Predominam as injustiças, as guerras, a ganância e a violência, o que a mídia nos mostra, 24 horas por dia.

    Desejo também a você e sua família uma Semana Santa com muita saúde, e Paz, e uma Feliz Páscoa!

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