A PALAVRA DO EDITOR

Para manter coerência por vezes é preciso usar argumentos aparentemente contundentes, que parecem embasar nossas certezas, mas que na verdade, ao serem dissecados, esses argumentos revelam a fragilidade das nossas posições.

Estou dizendo isso para tratar do argumento de que Greta Thunberg, a adolescente que foi transformada em ícone pela defesa do meio-ambiente, é financiada por interesses escusos, de apropriação da Amazônia por grupos ou países interessados em tomar conta dessa extensa riqueza, com tudo o que ela oferece de água, minérios e produção vegetal.

Greta Thunberg defende a adoção de medidas capazes de brecar atividades humanas que contribuem para o aquecimento global, que levam ao desequilíbrio do clima, que modificam o regime de chuvas e ventos, que empesteiam o ar tornando-o irrespirável, tudo, enfim, que parece levar o mundo pelo caminho da catástrofe, vale dizer, à própria destruição total da vida no nosso Planeta Terra.

Embora não seja impossível que alguém queira se aproveitar do discurso da pirralha para algum proveito próprio e diferente das finalidades por ela visadas, parece absurdo que Greta esteja sendo financiada em sua luta contra, por exemplo, a destruição da Amazônia, exatamente para que “alguém” se aposse dela.

O raciocínio seria algo como o seguinte: Greta estaria dizendo (o que não coincide com seus discursos) que como o Brasil não está cuidando da Amazônia e, pelo contrário, até está pondo fogo nela, o mundo deve tomar a Amazônia do Brasil – para cuidar dela convenientemente? ou para explorar suas riquezas?

É claro que essa linha de raciocínio não se sustenta, o que leva os que nela acreditam a tentar reforçar seus argumentos com algum outro que pareça decisivo – e aí tocamos na questão que abordávamos inicialmente.

Trata-se da seguinte falácia: quando alguém defende a ação de Greta, o interessado em desmoralizá-la, consciente ou inconscientemente apegando-se à visão direitista de que o Brasil precisa avançar na exploração dos recursos da Amazônia em vez de deixar que os índios fiquem sentados em cima de toda aquela riqueza, usa o seguinte argumento:

– Então por que ela não falou uma única palavra sobre o derramamento de petróleo no mar?

Refere-se essa pessoa ao derramamento de óleo no oceano atlântico que causou imensos prejuízos à vida marinha e às costas brasileiras, para significar que Greta não está interessada em defender o meio-ambiente, tanto que não se pôs a condenar esse fato.

Segundo esse argumento, ficaria demonstrado que Greta só se interessa pelas queimadas, o que revelaria o tal compromisso e o seu financiamento por pessoas ou entidades com foco na Amazônia.

Ora, o derramamento de óleo no mar, de que tratamos, foi um fato isolado, acidental ou criminoso, não é uma prática como as queimadas ou como a destruição da floresta para a implantação de criação de gado ou plantação de soja.

Greta não precisa lutar contra o derramamento de óleo no mar como prática de navios visando a alguma inimaginável forma de destruir a vida marinha para se aproveitar economicamente do mar!

Por isso, o argumento dos anti-ecologistas não tem nada a ver; e visam, simplesmente, a desmoralizar Greta para que o símbolo contra a destruição do meio-ambiente seja anulado.

Greta não parece ser um gênio, nem uma menina-prodígio, no sentido de ser dotada de uma inteligência einsteiniana, mas é uma pessoa que luta por causa importante, mesmo não tendo sido capaz de responder a uma ou duas perguntas que lhe foram feitas em determinada reunião.

 

Greta não é uma criança, greta não é uma pirralha no sentido desvalorizante que certamente foi dado ao termo por quem assim a classificou – e insistir em diminuir sua importância tem a finalidade de diminuir a importância da causa que ela defende, para que a exploração econômica dos recursos naturais possa ser feita irresponsavelmente, sem preocupações com a saúde da Terra, com o bem-estar da população atual e com o futuro das próximas.

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