VIOLANTE PIMENTEL - CENAS DO CAMINHO

Antero, ainda menino, ingressou no seminário, por imposição da mãe, que era muito carola. Missa diariamente, batina, orações, confissão, comunhão, pregações sobre a fé, esperança e caridade, rezas em Latim, no começo empolgaram o menino, que se sentia num pedacinho do Céu. Depois a empolgação diminuiu.

O Seminário Menor é aberto a jovens com idade entre 11 e 17 anos.

Betânia, 40 anos, viúva há dois anos, semanalmente frequentava a Capela do Seminário São Bento, para se confessar ao Padre Tiago. Desabafava com ele suas mágoas, angústias e dores, pela morte do marido, além das tentações e desejos, que o falecido, nas suas noites de insônia lhe provocava. A mulher confessava ao Padre sua culpa, por não se conformar com a solidão, sentir falta dos carinhos do marido e gostar dos sonhos eróticos que tinha com ele.

O Padre já havia decorado os pecados que a viúva vinha lhe confessar semanalmente. As penitências que lhe aplicava, inclusive orações para que Nossa Senhora do Desterro desterrasse da sua cabeça os maus pensamentos, não eram cumpridas.

A assiduidade com que a viúva ia se confessar na Capela do Seminário chamava a atenção das pessoas, e as más línguas já diziam que a viúva estava assediando o Padre.

Certa vez, Antero, o seminarista que ingressou no Seminário contra a vontade, acordou triste, com crise de saudade de casa e da sua liberdade. Visivelmente deprimido, depois do almoço, afastou-se dos colegas e foi meditar sozinho na Capela do Seminário, fora do horário previsto para meditação, o que não era permitido. Depois de algum tempo, avistou o austero Padre Tiago adentrar à Sacristia. Temendo ser visto pelo Padre, o seminarista escondeu-se no confessionário. O Padre se retirou e antes que Antero saísse do confessionário, Dona Betânia, a viúva, frequentadora habitual das confissões, ajoelhou-se no confessionário e falou:

– Estou aqui de novo, Padre Tiago, para me confessar. Pequei novamente.Não consigo me controlar mais e continuo pecando, desejando sexo e não sei mais o que fazer.

O seminarista entrou em pânico, ao perceber que estava desrespeitando as regras do Seminário. A primeira era ter entrado na Capela para meditar, fora do horário permitido. A segunda, foi se sentar no Confessionário. E agora, aconteceu o pior: estava ouvindo uma confissão, coisa que não cabia a um seminarista. A mulher não parava de falar, e Antero temia o escândalo que ela daria, ao notar que não era o Padre Tiago que estava no confessionário.
Horrorizado e ouvindo os “pecados” da mulher, o seminarista ficou em silêncio. A viúva, estranhando, perguntou:

– Está ouvindo, Padre Tiago? Parece que o senhor está cochilando!!!

O seminarista tossiu e logo resolveu falar:

– Minha senhora, procure logo um homem para se casar, antes que caia em pecado mortal! Eu não sou Padre Tiago. Sou um seminarista.

Antero saiu do confessionário, sob os insultos da viúva, que deu um verdadeiro escândalo na Capela do Seminário, acusando-o de se passar por Padre Tiago.

O caso foi submetido à apreciação de um Conselho, tendo à frente o Reitor do Seminário, resultando na expulsão do seminarista.

4 pensou em “A CONFISSÃO

  1. Violante,

    É indiscutível que sexo é bom. Biologicamente falando, nossos corpos foram construídos e programados para sentir prazer e um deles é o sexual. Na relação sexual, duas pessoas se unem de forma íntima e partilham um prazer mútuo e profundo. Se é bom e traz prazer, então pode ser praticado. Antero utilizou o bom senso para instruir a viúva.
    O celibato já provocou a saída de muitos padres da vida religiosa, pois é é uma prática comum entre alguns religiosos, que abdicam os “prazeres mundanos” para se dedicar exclusivamente a servir a Deus. Acredito que Antero dificilmente iria conseguir manter o voto do celibato porque ingressou no seminário por vontade materna. Parabéns pela crônica abordando um assunto tão delicado!

    Saudações fraternas,

    Aristeu

  2. Obrigada pelo gratificante comentário, prezado Aristeu Bezerra! Antigamente, era comum o menino do interior, de família simples, entrar no Seminário, forçado pela mãe. Cursava o Seminário Menor (de 11 a 17 anos) e, às vezes, até o Seminário Maior, até que descobria que não tinha vocação para padre. Então, saía do Seminário, com uma ótima formação moral. .
    Antero estava nesse dilema, quando foi expulso do Seminário, em virtude do incidente ocorrido. Talvez ele já estivesse pensando em sair. “Deus escreve certo, por linhas tortas”, diz o ditado popular.

    Um abraço e uma ótima semana!

    Violante

  3. Cara Violante. Havia também casos, não tão raros, de meninos que iam para o Seminário porque os pais não tinham condições de realizar o desejo deles de adquirirem uma sólida instrução. E quando eles já tinham conseguido o que queriam, deixavam o Seminário. Não tinham um pingo de vocação para a batina. Sou testemunha de mais de um desses seminaristas residentes na minha Canindé. Um abraço.

  4. Obrigada pelo comentário, prezado Francisco Sobreira!

    Realmente, anos atrás, o Seminário era a “tábua de salvação”, para que as famílias sem recursos financeiros pudessem dar aos filhos uma boa educação. Isso era muito comum nas cidades do interior, como Nova-Cruz (RN), minha terra natal..
    Conheço casos de seminaristas pobres, que cursaram até o Seminário Maior, deixando o Seminário às vésperas de alcançarem o diaconato. Saíram do Seminário com instrução sólida e excelente formação moral. A vocação para padre passava muito longe.

    Um abraço.

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