Leandro Ruschel
Alguém ficou surpreso com a anulação das condenações de Marcelo Odebrecht, o personagem central do maior esquema de corrupção da história, desvendado pela operação Lava Jato?
Seus crimes nem são negados. Ele mesmo confessou e explicou em detalhes como bilhões de reais foram desviados e direcionados para uma elite completamente corrompida, em que poucos não se venderam. O esquema ultrapassou as fronteiras do Brasil, financiando amigos do regime em diversos países, incluindo ditaduras brutais.
Marcelo chegou ao ponto de explicar até como o ministro que agora anulou suas condenações tinha um codinome nas comunicações internas da empresa. À época, a revelação foi alvo de censura judicial.
O ministro que abriu um inquérito para investigar seus críticos, transformando-se em vítima, investigador, acusador e julgador, ao mesmo tempo, decidiu que o processo contra Odebrecht deveria ser anulado por “violações ao devido processo legal”.
Diego Escosteguy, jornalista que cobriu em profundidade a operação Lava Jato, resumiu: “a decisão de Toffoli que anula todos os processos da Lava Jato contra Marcelo Odebrecht é um deboche de repercussão internacional. Agride os neurônios de quem perde tempo analisando-a. Não há mais o que dizer juridicamente. Sobra o escárnio.”
Desde que Lula foi descondenado e alçado à presidência, ficou claro que a sociedade brasileira colapsou. É preciso reconhecer que falhamos como país. Quanto mais cedo os brasileiros bem-intencionados reconhecerem o colapso moral, político e legal do país, maior a chance de iniciarmos um processo de refundação e reconstrução.
O sistema deixou claro que está comprometido com a sua sobrevivência através da repressão. Antes, havia a corrupção, mas também a liberdade para falar dela e cobrar autoridades.
Agora, temos a corrupção associada à censura e à perseguição de quem expõe as mazelas do sistema. Ou seja, subimos um degrau no nível de bananismo latino-americano.
Enquanto Marcelo Odebrecht e José Dirceu têm penas anuladas, e Sérgio Cabral anda livre, leve e solto pelas ruas do Rio de Janeiro, do alto da sua pena de 400 anos de cadeia, Daniel Silveira segue preso por proferir ofensas contra os ministros, Filipe Martins está preso preventivamente por uma viagem que não realizou, assim como vários manifestantes que invadiram prédios públicos em protesto, condenadas a 17 anos de detenção em julgamentos sumários, ao arrepio de qualquer resquício de devido processo legal, acusado de “tentativa de golpe de estado”.
Milhares de brasileiros seguem censurados, num escândalo que chegou até mesmo ao Congresso americano. Agora temos o advogado-geral da União chegando ao ponto de processar críticos do regime por “ofensa à honra e à imagem” da União. A mensagem é clara: quem continuar apontando o dedo para o sistema será censurado, perseguido e preso.
Antes, éramos “apenas” um país corrupto e pobre. Agora, além disso, somos também uma ditadura escancarada.
Nada disso me impressiona. O que realmente gera espécie é o nível de tolerância do povo. Há três tipos de pessoas que silenciam ou apoiam o atual regime:
1- Os idiotas úteis: são aqueles que acreditam nas mentiras e manipulações promovidas pelo sistema, como a balela da “defesa da democracia” representada pela alçada do descondenado à presidência. Ou que ainda acreditam no “combate às fake news”. Foram décadas de lavagem cerebral promovida pela academia, pela cultura e pela imprensa, aparelhos da esquerda, que produziram tal degradação moral e intelectual.
2- Os aproveitadores: são aqueles que não têm escrúpulos e buscam apenas tirar alguma vantagem da anomia generalizada. Desde aqueles que buscam viver de bolsas sem nunca buscar um emprego, passando pelos servidores cuja principal tarefa é buscar atalhos para trabalhar o mínimo possível, com a maior remuneração possível, até altos empresários e autoridades que não cumprem suas funções, apenas buscam desviar recursos de todas as formas possíveis, sem esquecer dos ladrões comuns em busca da sua “cervejinha”.
3- Os omissos: pessoas que não buscam se beneficiar com o arranjo todo, mas não querem “confusão”. Baixam a cabeça e fecham os olhos para “tocar sua vida”, torcendo para que o sistema não atravesse o seu caminho em algum momento. Martin Luther King falava que o problema do mundo não residia primordialmente na ação dos maus, mas no silêncio dos bons.
Do outro lado dessa luta, temos milhões de brasileiros honestos, tanto na iniciativa privada quanto no setor público, que buscam fazer o que podem para mudar o deplorável estado das coisas.
É nesse grupo que reside a possibilidade de dias melhores. É um processo que iniciou em 2013. Parte da sociedade brasileira acordou e, por algum tempo, parecia que o Brasil caminhava para uma refundação, passando pela prisão e afastamento da vida pública dos piores corruptos e de um projeto totalitário de poder.
Infelizmente, não foi o caso. O sistema se reorganizou para retomar o controle da situação, protegendo os seus e iniciando uma perseguição contra os dissidentes. O projeto totalitário está sendo implementado de forma acelerada.
O único lado positivo dessa história toda: a situação é mais clara do que jamais foi.
Como afirmava Aleksandr Solzhenitsyn, “nós sabemos que eles estão mentindo, eles sabem que estão mentindo, eles sabem que sabemos que eles estão mentindo, sabemos que eles sabem que sabemos que eles estão mentindo, mas eles ainda assim estão mentindo”.