DALINHA CATUNDA - EU ACHO É POUCO!

DEU NO X

MARCOS MAIRTON - CONTOS, CRÔNICAS E CORDEIS

O RESGATE DO GOLFINHO

Foto por Melissa Carseller, do site Pipa Aventura

Certa manhã, um golfinho parecia disposto a por fim à sua própria vida. Tomando impulso com a cauda, deslizou na crista de uma onda e lançou-se em direção à praia, dando claros sinais de que estaria decidido a chegar até a areia. Ali fatalmente morreria de desidratação.

Os estudos mais recentes no campo da zoologia não levam muito a sério a possibilidade de animais se suicidarem. Apesar de haver relatos a esse respeito, os biólogos consideram outras razões – como estresse, medo ou tentativa de fuga de um cativeiro – que gerariam situações nas quais há apenas a aparência de o animal ter tomado a decisão de se matar.

Especificamente quanto à ordem dos cetáceos, da qual fazem partes golfinhos e baleias, sempre chama a atenção quando grupos inteiros encalham em alguma praia. Mas também nesses casos as teorias mais aceitas afastam a possibilidade de suicídio, pelo menos nos moldes dos cometidos por seres humanos.

Alheio a essa discussão entre cientistas, aquele jovem golfinho – sim, era um jovem golfinho – parecia firme em seu propósito de deixar para trás o oceano, a família e seus amigos marinhos.

Provavelmente já conseguia ver a areia da praia, quando, nos últimos metros do fatídico percurso, acabou esbarrando em algo que o impediu de alcançar seu objetivo.

Era um homem, que, depois de caminhar um pouco pela praia, havia entrado no mar até o ponto onde a água chegava à altura dos seus joelhos. Olhava distraído para o horizonte, quando foi surpreendido com o impacto do golfinho contra suas pernas.

Ao ver o golfinho debatendo-se naquelas águas rasas, com o dorso já exposto ao sol, o homem o empurrou contra as ondas, para que pudesse voltar à segurança das águas mais profundas.

Mas o golfinho não ajudava. Quanto mais o homem o empurrava para dentro do mar, mais ele insistia em ir em direção à praia.

Ficaram nesse impasse: o golfinho se esforçando para chegar à areia e o homem lutando, com todas as suas forças, para o devolver às profundezas do mar.

Até que, depois de alguns minutos, quando os dois já estavam ficando exaustos, o golfinho apontou subitamente o nariz em direção às ondas e, movimentando a cauda com força, seguiu mar adentro.

Num instante, foi como se uma luz houvesse iluminado a mente daquele golfinho. Parecia ter reconhecido que todo aquele esforço de um estranho para o salvar só poderia ser um sinal de que sua vida valia mais do que lhe parecia. Ou, pelo menos, mais do que lhe parecera em um momento ruim.

Mais alguns segundos se passaram. O homem agora via o golfinho saltar por sobre as ondas e desaparecer entre espumas. Com o golfinho a salvo, resolveu voltar para casa.

Enquanto ainda caminhava pela areia da praia, o homem admirava a beleza do céu e aspirava o ar com mais força, para sentir o cheiro do mar. Ouvia o barulho das ondas e sentia o atrito da areia sob os seus pés. Estava feliz com o que acabara de realizar.

Mas estava sobretudo grato àquele golfinho.

É que, naquela manhã, aquele homem havia saído de casa decidido a entrar no oceano o máximo que pudesse, até não conseguir mais nadar de volta.

O encontro com o golfinho o havia impedido de por em prática o seu plano suicida.

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

JOSÉ ALVES FERREIRA – SÃO PAULO-SP

Um Cafuné na Cabeça, malandro, eu quero até de macaco (Leila Diniz)

Brigam Espanha e Holanda
Pelos direitos do mar
O mar é das gaivotas
Que nele sabem voar
Brigam Espanha e Holanda
Pelos direitos do mar
Brigam Espanha e Holanda
Por que não sabem que o mar
Por que não sabem que o mar
Não sabem que o mar, o mar
É de quem sabe amar
É de quem sabe navegar…

Os belos versos- e a frase – são atribuídos a Leila Diniz, moça a frente do seu tempo, risonha e maravilhosa, que incorporou todas as mulheres do mundo, no filme do mesmo nome e, morreu tragicamente em acidente de avião na Índia, nos princípios dos anos 70.

Virou música de Milton Nascimento, como pode testemunhar o grande Peninha, excelente conhecedor e pesquisador do assunto.

Mas, valem para colocar a situação nos dias de hoje; brigam congresso, judiciário e executivo, pelo direito de governar; mas poucos sabem como governar, ou, estão interessados em governar.

Mas o governo é do povo, que elegeu quem pode governar.

Infelizmente, os eleitos não sabem, tampouco querem governar; apenas querem mandar.

Aí melhor sair do poema…

Os eleitos buscam apenas prover ou defender sua prole ou entorno, seu ego ou outros instintos que talvez o Bob Jefferson tenha identificado no passado, quando denunciou o “mensalão”.

Detalhe: só o fez por que sentiu sua “batata assando” e matreiro “chutou o pau da barraca”, expondo um acordo que ficou implícito na tal mala de $ 5 milhões de alguma moeda que nunca apareceu ou, usada foi ou não e, ninguém mais quis saber; por que será?

De lá para cá, vivenciamos um escândalo a cada noticiário, ou mais, dependendo da mídia que nos informa ou da disposição da “Espanha e Holanda” de plantão.

Assim vamos nós, envoltos pelas brumas duras e asquerosas da impunidade, sem poder navegar ou melhor, poder pelo voto, governar, enquanto brigam…

JOSÉ DOMINGOS BRITO - MEMORIAL

OS BRASILEIROS: Carlos Gomes

Antônio Carlos Gomes nasceu em Campinas, SP, em 11/7/1836. Músico, maestro, compositor de ópera e o primeiro brasileiro reconhecido internacionalmente nesta área. De origem humilde, filho de Manuel José Gomes (conhecido como “Maneco músico) e Fabiana Jaguari Gomes. O pai com dificuldades em manter 26 filhos, formou uma banda musical. O irmão ajudou na formação do garoto, que naturalmente revelava uma atração pela música. É considerado o maior compositor lírico das américas.

Em 1854, aos 18 anos, fez a apresentação de sua primeira “missa”, com emoção e voz embargada, comovendo a plateia. 5 anos depois já era um concertista e professor de piano e canto, com predileção pelas óperas de Verdi. Em 1859, foi convidado pelos acadêmicos da Faculdade de Direito para fazer um concerto em São Paulo, e recebeu efusivos estímulos para que fosse se aperfeiçoar na Côrte. Era um sonho alimentado pelo rapaz, mas sem condições de realizar, devido a falta de recursos. Alojado numa “república” de estudantes, compôs o “Hino Acadêmico”, com letra de Bittencourt Rodrigues, que logo se tornou a “Marselhesa da Mocidade” substituindo antigos cantos dos estudantes. O hino foi o pontapé inicial em sua prodigiosa carreira artística e, certamente, a insistencia dos estudantes para que fosse ao Rio pesou decisivamente na viagem que realizou nas condições precárias em que foi realizada. No mesmo ano falou com o pai que voltaria à São Paulo para novos concertos, o que não era verdade. Mas confessou ao irmão, José Pedro, que planejava uma fuga. Viajaria de burro até Santos e de lá embarcaria de qualquer modo para o Rio de Janeiro. O irmão não acreditou e disse-lhe que voltaria de Santos mesmo; não teria coragem para tal aventura. O decidido rapaz retrucou: “Só voltarei coroado de glórias ou só voltarão meus ossos”.

Partiu de Santos no navio Piratininga, em 1859, sob aclamação dos estudantes e amigos rumo à Côrte. Levava consigo uma carta de recomendações a D. Pedro II e pedido de alojamento junto a familia de um amigo estudante em São Paulo. Logo que chegou escreveu ao pai, pedindo-lhe perdão pela fuga e revelando seus planos. O pai não só o pedoou como garantiu-lhe uma mesada mensal. Foi apresentado ao Imperador pela Condessa Barral e encaminhado a Francisco Manuel da Silva, diretor do Conservatório de Música e teve como primeiro mestre o famoso músico italiano Joaquim Giannini. Em 1860, na festa de encerramento do curso, foi programada sua apresentação. Não pode comparecer devido a um ataque de febre amarela. Pouco antes do maestro dar inicio à “cantata”, ele surge com a febre estampada no rosto e pede a batuta para dirigir sua peça. O resultado foi uma apoteose, toda a plateia em pé apludindo efusivamente. Ele não resistiu e caiu desmaiado. Ao saber do ocorrido, D.Pedro II condecorou-o com uma medalha de ouro.

Em 4/9/1861 foi executada sua primeira ópera – Noite no Castelo – no Teatro da Ópera Nacional. Dá-se nova apoteose e o Imperador, de novo, condecorou-o com a comenda “Imperial Ordem das Rosas”. Dois anos depois surge outro sucesso com a segunda ópera: Joana de Flandres, encenada em 1863. Em seguida foi agraciado com uma viagem à Europa, concedida pela Empresa de Ópera Lírica e o Governo Imperial. O Imperador queria que ele fosse para a Alemanha para estar com o grande Wagner, mas a Imperatriz D. Teresa Cristina, sugeriu-lhe a Itália. Embarcou em 8/11/1863, levando uma recomendação de D. Pedro II para o rei Fernando, de Portugal, que o apresentasse ao diretor do Conservatório de Milão, Lauro Rossi.

Encantado com o talento do rapaz, Rossi tornou-se seu tutor e passa a recomendá-lo no métier musical da cidade. Em 1866 recebeu o diploma de mestre e compositor. Passou a compor óperas: “Se sa minga”, em dialeto milanês, estreada no Teatro Forssetti e “Nella luna”, no Teatro Carcano, ambas com livreto de Antonio Scalvini, prolongando sua permanência em Milão, onde casou-se com Adelina Péri. O sucesso foi se consolidando e no ano seguinte, flanando pela Praça del Duomo, encontrou um garoto vendendo um folheto e apregoando: “Il Guarani! Il Guarani! Storia interessante dei selvaggi del Brasile!”. Era uma tradução do romance de José de Alencar, que serviu de base para compor a famosa ópera “O Guarani”.

Procurou Scalvini, que ficou fascinado pela história, e pouco depois concluíram a obra. Segundo os críticos não é sua maior ou melhor obra, mas foi a que o tornou conhecido em todo o mundo. A estreia se deu em 19/3/1870, seguida de apresentações na Europa e EUA. Consta que na noite da apresentação, Giuseppe Verdi estava presente e comentou: “Este jovem começa de onde eu termino!”. Em 2/12/1870, aniversário de D. Pedro II, a ópera estreou no Rio de Janeiro. Outras apresentações ocorreram nos dias seguintes, quando conheceu André Rebouças. Tornam-se amigos e viajam para a Europa no ano seguinte. Neste período viveu alguns anos na Itália, quando a saúde começou a dar sinais de alerta. Sofria de um câncer na boca. O desejo de retornar ao seu país ficou mais acentuado e esteve por aqui em algumas ocasiões.

Seu desejo era ser nomeado para o cargo de diretor do Conservatório de Música. Na época foi proclamada a República, em 1889, e seu amigo e protetor D. Pedro II foi exilado, causando-lhe grande mágoa. Nesta época compôs o poema sinfônico Colombo, incompreendido pelo grande público. Após tantos perrengues, foi aliviado com um convite de Lauro Sodré, governador do Pará, para organizar e dirigir o conservatório do Estado. Antes, porém, voltou à Itália para mais uma temporada e despedida dos filhos. Retornou ao Brasil, passando por Lisboa e teve sua primeira intervenção cirúrgica na língua, em abril de 1895, sem resultados animadores. Em maio foi recebido pelo povo paraense em festa, mas com a saúde agravada. Sua condição econômica também sofreu um abalo e o governo de São Paulo providenciou uma pensão mensal de 2 contos de réis (2 mil cruzeiros), que garantiu a manutenção do tratamento até 16/9/1896, quando veio a falecer.

No ano anterior foi criado o Conservatório Carlos Gomes, posteriormente denominado Instituto Estadual Carlos Gomes, mantido pelo Governo Paraense. Em 1986 o Instituto passou a ser mantido pela Fundação Carlos Gomes, cuja missão é difundir a educação musical como instrumento de socialização e inclusão social e promover o estudo da música no Estado do Pará. Logo após o falecimento e exéquias, durante 3 dias, O governo paulista solicitou ao governo paraense o translado de seu corpo, que foi sepultado no monumento-túmulo, na Praça Antônio Pompeu, em Campinas. Em 1936, O centenário de seu nascimento, foi comemorado em grandes solenidades em todo o País e 20 anos depois foi criado o Museu Carlos Gomes, em Campinas, reunindo documentos e seus pertences, afim de manter a memória do grande compositor e maestro. Em 2017 seu nome foi inscrito no “Livros dos Heróis e Heroínas da Pátria”.

Dentre as diversas biografias do músico, consta o romance biográfico, publicado por Rubem Fonseca em 1994, O selvagem da ópera, que veio a se tornar novela dirigida por Maria Adelaide Amaral e produzida pela Rede Globo.

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

VITOR MIRANDA – SÃO PAULO-SP

a Banda da Portaria lança Vida para fechar esse ano difícil com leveza e poesia.

a letra é uma parceria entre Alice Ruiz e o poeta Vitor Miranda, que faz parte da banda.

foi musicada pelo vocalista e compositor João Mantovani e produzida pelo baixista Daniel Doc.

para completar a banda, o guitarrista Daniel Nakamura e o baterista Telo Ferreira. todos os cinco atuam no videoclipe que conta com participações especiais.

um ano novo cheio de vida pra todos nós!

A PALAVRA DO EDITOR

NASCIMENTO DO MENINO

De repente, num dia qualquer de um final de dezembro, completou-se o tempo da parição. O casebre era rústico, de taipa e chão de barro batido. No apertado quintal, duas árvores e um pedaço de jornal velho que noticiava estrondoso baile de carnaval, gastos alibabásticos, desbunde total, os vários sexos em desvairamentos faraônicos, desprezadas as criancinhas famintas da localidade.

A dor apertando mais. Calor brabo, três da tarde, um domingo. Ao lado do magro colchão de palha estendido no chão do único dormitório, a Elisabete, prima também descendente de Aarão, aguardava o instante maior. Possuía tanta bondade que até o seu filho João iria anunciar a Boa Nova, há muito já profetizada por santos homens já desencarnados, que pregavam a libertação de todos. Com Maria – a prima parturiente – e os demais familiares, acreditava que um dia os famintos seriam cumulados de bens e os maus ricos despedidos de mãos vazias. Lembrando-se do dito pelo Papa Francisco em 2019 – “O cardeal Martini, na sua última entrevista dada poucos dias antes de morrer, disse palavras que nos devem interpelar ‘A Igreja ficou atrasada duzentos anos. Como é possível que não se alvorace? Temos medo? Medo, em vez de coragem? No entanto, a fé é o fundamento da Igreja. A fé, a confiança, a coragem … Só o amor vence o cansaço.’” –, que orgulhava-se de pertencer a uma população sul-americana ansiosa por um desenvolvimento social mais justo.

Elisabete também sabia que só blá-blá-blá não resolveria problema algum, a solução sempre adviria da organização e da união de todos para a concretização dos sonhos acalentados. Segundo ela, proclamando muitos estavam, embora ficassem restritos aos sonhos, não aceitando críticas nem propostas novas , partindo para os desaforos como se todos fossem moleques de rua, sem a serenidade das lideranças consolidadas.

A parteira chegara. Os panos e as toalhas, fervidos em caldeirão sobre carvão, a postos. As contrações ampliadas, embora a felicidade muito atenuasse as dores sentidas. Em minutos, Emmanuel exteriorizou-se rapidamente, sendo logo envolto em faixas e deitado numas palhas doadas pelos da redondeza, solidariedade presente e sempre atenta aos gritos de fome e de angústia dos desempregados, das prostitutas, dos negros e índios de todos os gêneros, que terão prioridade de ingresso na Festa de Encerramento e dos chacinados por uma violência desenfreada, efeito maior de uma injustiça cinicamente mantida pelos que controlam um sistema financeiro há muito instalado na contramão da História.

Sadio, Emmanuel chegara. Foi circuncidado no oitavo dia e apresentado ao Chefão de Tudo, conforme recomendava uma cartilha muito lida: “Todo macho que abre o útero será consagrado ao Senhor”. E dos muitos testemunhos, o de Simeão, um velho estivador aposentado por invalidez, foi o que calou mais fundo: “Esse Menino foi colocado para a queda e para o soerguimento de muitos”.

A aparência luminosa do garoto contagiava. Os vizinhos vibraram com a chegada do Filho da Maria. E prometiam ser d’Ele companheiros de Vida, para a difusão de um amor sem preconceitos, sem opressores, sem ódio e sem medo, onde ninguém fosse menos que ninguém, sem consumismos desenfreados, num agir corajoso e viril, fruto indispensável de uma evangelização essencialmente libertadora para os futuros que já chegaram.

PS. Um Feliz Natal para todos aqueles que depositam irrestrita confiança nas promessas do Emmanuel. E para os demais, independentemente de credo religioso, também filhos muito amados da Criação. E para a Rejane, companheira muito amada, facho de luz do meu caminhar, que verá o 2021 mais humano e solidário. Sem pandemias nem idiotices presidenciais. Um ano novo bem mais arretado.

PENINHA - DICA MUSICAL