Antigamente, no tempo dos neandertais, todo mundo era pobre. Ninguém tinha carro, smartphone ou casa própria (no máximo, uma caverna). Mas o homo sapiens aprendeu que unindo trabalho e inteligência, é possível produzir coisas, e que estas coisas melhoram a vida, e que por isso são chamadas coletivamente de “riqueza”.
Mas olhando o presente, não é difícil perceber que alguns lugares são mais ricos e outros são mais pobres. Especificamente, nós brasileiros somos mais pobres do que os moradores de vários países. Por quê?
1. PORQUE SOMOS BURROS
Essa não precisa explicar muito, é só olhar nossos números em qualquer ranking internacional. Acontece que nossa cultura (herança ibérica) enxerga os diplomas como um equivalente moderno dos antigos títulos de nobreza, e os acadêmicos e bacharéis são valorizados não pelo que sabem, mas pela quantidade de títulos e diplomas que ostentam. A missão de nosso sistema educacional não é produzir ou transmitir conhecimento, mas separar nobres dos plebeus, ou seja, definir quem pertence à classe que só tem privilégios e quem pertence à classe que só tem obrigações.
O resultado é óbvio: sem estudar português, somos deficientes em escrever e interpretar textos, o que dificulta a transmissão do conhecimento. Sem estudar matemática, não sabemos usar raciocínio lógico para resolver problemas e não sabemos avaliar idéias e propostas de forma objetivamente (o tal do “povo cordial”, que pensa com o coração e não com o cérebro). Sem estudar história, não entendemos o mundo em que vivemos e continuamos a acreditar em utopias e repetir erros que já foram cometidos muitas vezes. Sem estudar ciências, não sabemos produzir coisas, o que nos torna meros consumidores daquilos que povos mais inteligentes produzem.
2. PORQUE NÃO TEMOS CAPITAL
Bens de capital são coisas que facilitam nosso trabalho e aumentam a produtividade. Quem tem um trator produz mais alimentos do que quem só tem uma enxada. Quem tem uma máquina de costura produz mais roupas do que alguém que costura à mão. E assim por diante.
Um exemplo prático: uma pessoa que mora em um país rico chama alguém para consertar um vazamento ou uma porta emperrada. O profissional chegará de botas, capacete, e com tantas ferramentas penduradas no cinto que parece uma árvore de natal. Graças a estas ferramentas (e ao seu conhecimento) ele fará o serviço de forma rápida e bem-feita. Na mesma situação no Brasil, o “profissional” (aspas obrigatórias) chegará de camiseta e havaiana, trazendo uma chave de fenda espanada e um martelo com o cabo frouxo. E, portanto, o serviço vai demorar mais e talvez não fique bom.
Porque não temos capital? De certa forma, é um círculo vicioso: a pessoa produz pouco porque não pode comprar ferramentas, e não pode comprar ferramentas porque produz pouco. Mas há um elemento externo nesse círculo: de tudo que a pessoa ganha, o governo fica com uma parte, e na hora de comprar a ferramenta, a pessoa tem que pagar uma ferramenta para ele e outra para o governo. Aí fica difícil. (A tarifa média de importação no Brasil é a maior da América Latina, dados do Banco Mundial. Em todo o mundo, ficamos atrás apenas de Camarões, Etiópia e Chade, pelo critério da média simples/não-ponderada. Já falei sobre as consequências do protecionismo: não podemos comprar produtos bons, e os fabricantes locais não precisam se esforçar nem reduzir preços, já que não têm concorrência.)
3. PORQUE MUITO DAQUILO QUE PRODUZIMOS É DESPERDIÇADO
Em lugares pobres, as coisas são feitas sem planejamento. Muitas vezes, de improviso. Quase sempre atendendo a alguma necessidade específica e urgente ou a algum interesse pessoal. Claro que o resultado é desperdício.
Em países de “primeiro mundo” a pavimentação das rodovias é projetada para durar cinquenta anos. Aqui, ano após ano joga-se asfalto sobre uma base inadequada apenas para vê-lo ir embora na primeira chuva. Países ricos planejam a longo prazo, países pobres como nós empilham um “quebra-galho” em cima de outro. Se é necessário fazer uma obra de cem milhões, corta-se vinte porque o orçamento sempre está curto. O resultado são oitenta milhões jogados fora, porque o problema continua, e logo em seguida começa-se a planejar gastar mais cinquenta para remendar a obra inadequada onde economizaram vinte.
Vou contar uma historinha que ouvi de um fornecedor de minha ex-empresa. Ele estava em outro cliente, onde a equipe de manutenção estava sofrendo para trocar uma peça de difícil acesso em uma máquina de um milhão de dólares. Na hora de remontar a peça, ao invés de recolocar os cinco parafusos, colocaram só quatro. Esse meu conhecido estava observando junto com um funcionário de outro setor, que estava indignado: “bando de incompetentes! Se os alemães colocaram cinco parafusos, é porque precisa de cinco parafusos!”. Mas como não era assunto do setor dele, não podia fazer nada. Trocada a peça, colocaram a máquina para funcionar. Duas horas depois, a peça recém-trocada quebra e danifica várias outras. Máquina parada por dois dias, dez mil reais em peças, perda de faturamento estimada em mais de cem mil reais, fora a insatisfação dos clientes com os pedidos atrasados. Por um parafuso que “dava muito trabalho” para recolocar.
4. PORQUE ENQUANTO OS OUTROS ESTÃO TRABALHANDO NÓS ESTAMOS PARADOS NA FILA
Isso é algo que me intriga desde meus dezoito anos, quando abri minha primeira conta no banco. A quantidade de pessoas que passam horas e mais horas sem produzir nada porque estão paradas em uma fila é um incrediente importante da nossa pobreza. O tempo não é infinito. Cada hora que uma pessoa perdeu em uma fila é uma hora improdutiva que jamais será recuperada. Pior ainda é pensar que boa parte destas filas é inútil, serve apenas para cumprir uma obrigação completamente dispensável que alguém (geralmente o governo) inventou. Pelo que me lembro, meu recorde pessoal aconteceu a muitos anos atrás, para conseguir uma segunda via de um documento no detran: foram nove filas e três horas e meia de espera para conseguir um papelzinho que a rigor nem precisaria existir.
Enquanto em outros países as pessoas usam seu tempo para produzir riqueza, nós usamos nosso tempo para cumprir rituais que não sabemos por que ou para que existem. Enquanto eles estão construindo máquinas, fazendo projetos, pesquisando tecnologias, nós estamos preocupados em “pagar uma guia”, “pegar um carimbo”, “pedir um alvará”, “dar entrada num requerimento”, “conseguir autorização”, “reconhecer firma”, “tirar certidão”, “protocolar a solicitação” e “anexar cópia autenticada do rg, cpf e comprovante de endereço”.
5. PORQUE QUANDO ALGUÉM DIZ ONDE ERRAMOS, AO INVÉS DE PARAR DE ERRAR PREFERIMOS FICAR OFENDIDOS COM QUEM DISSE