PEDRO MALTA - A HORA DA POESIA

MUDEZ – Francisca Júlia

Já rumores não há, não há; calou-se
Tudo. Um silêncio deleitoso e morno
Vai-se espalhando em torno
Às folhagens tranquilas do pomar.

Torna-se o vento cada vez mais doce…
Silêncio… Ouve-se apenas o gemido
De um pequenino pássaro perdido
Que ainda espaneja as suas asas no ar.

Ouve-me, amiga, este é o silêncio, o grande
Silêncio feito só de sombra e calma,
Onde, às vezes, noss′alma,
Penetrada de mágoas e de dor,
Se dilata, se expande,
E seus segredos íntimos mergulha…
Prolonga-se a mudez: nenhuma bulha;
Já se não ouve o mínimo rumor.

Esta é a mudez, esta é a mudez que fala
(Não aos ouvidos, não, porque os ouvidos
Não conseguem ouvir esses gemidos
Que ela derrama, à noite, sobre nós)
À alma de quem se embala
Numa saudade mística e tranquila…
Nossa alma apenas é que pode ouvi-la
E que consegue perceber-lhe a voz.

Escuta a queixa tácita e celeste
Que este silêncio fala a ti, tão triste…
E hás de lembrar o dia em que tu viste
Perto de ti, pela primeira vez,

Alguém a quem disseste
Uma frase de amor, de amor… ó louca!
E que, no entanto, só mostrou na boca
A mais brutal e irônica mudez!

Francisca Julia César da Silva Münster, Eldorado Paulista-SP (1871-1920)

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

RENATO VAZ – PETROLINA-PE

Seu Editor:

Alegre o meu final de semana.

Bote essa aí no ar, por favor.

É sobre a vinda do Mito aqui ao nordeste.

Obrigado.

DEU NO X

JESUS DE RITINHA DE MIÚDO

LOUCA VARRIDA

Desventura de Clarinha

Eu rasgo a roupa do corpo
Fico nua e enlouquecida
Grito coisas desconexas
Excomungando a vida
Eu fico descabelada
Me atiro pela estrada
Corro doida e esquecida.

Me chamam “Louca Varrida”
Gargalham do meu estado
Apontam dedos profanos
Não entendem o meu pecado
Que foi amar sem poder
Desejar e jamais ter
O querer do meu amado.

Que quando estava ao meu lado
Falava frases ditosas
Cantava tantas promessas
Sob juras amorosas
E eu, coitada, inocente
Como fui me tornar crente
Em falas tão mentirosas?

DEU NO JORNAL

A ESQUERDA NÃO APRENDE NADA E NÃO ESQUECE NADA

Ricardo Kertzman

Eu não sei o que é mais assustador: um país que se pretende “em desenvolvimento”, em pleno século 21, com uma população total de 215 milhões manter quase 40 milhões de pessoas sem água tratada, e 105 milhões sem coleta de esgoto, ou políticos ainda terem dúvidas a respeito desse inacreditável quadro medieval.

O Partido dos Trabalhadores (PT), após capitanear o maior assalto aos cofres públicos de uma nação, que se tem notícia na história mundial; após atirar o País na maior recessão econômica dos seus últimos 30 anos; e após despejar 15 milhões de brasileiros no desemprego, lidera um bloco de senadores de esquerda, contrários ao novo Marco do Saneamento que está sendo votado nesta noite de quarta-feira (24).

Para piorar, estes senhores representam, em ampla maioria, os estados do norte e nordeste do Brasil, justamente os que sustentam os piores índices de saneamento básico, e consequentemente, de doenças e mortes relacionadas. É impressionante, mas a esquerda brasileira não aprende nada, não esquece nada! E quando surge uma catástrofe equivalente, com sinal trocado, de nome Jair e sobrenome Bolsonaro, se mostram surpresos.

O cinismo desses cretinos só não é maior que a baixeza dos seus atos. Com casa, comida e roupa lavada, além de carros, motoristas, viagens, plano de saúde e aposentadoria especial garantidos pelos miseráveis da Bahia, Rio Grande do Norte, Amapá, Ceará, Sergipe, Roraima, Paraíba, Maranhão e Pará, essa gente ordinária não se incomoda em assistir, por mais duzentos anos, crianças morrerem de diarreia, ou dezenas de milhões não poderem simplesmente sorver um simples copo de água potável.

O que está em jogo é um monopólio (95% de controle estatal) de décadas, onde cargos e salários, e muita corrupção!, é mantido a ferro e fogo pela classe política mais abjeta do mundo. Ou melhor, estava em jogo, pois o Senado Federal acaba de aprovar o novo Marco do Saneamento, obviamente sem o voto dos 13 senadores do PT, PDT, PROS, REDE, PSB e Republicanos.

Pela terceira vez: a esquerda brasileira não aprende nada, não esquece nada.

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

RÔMULO SIMÕES ANGÉLICA – BELÉM DO PARÁ-PA

Prezado Luiz Berto,

Já faz um bom tempo que acompanho o Jornal da Besta Fubana.

Minha última participação foi por volta de abril de 2016, antes do seu problema de saúde, que tanto nos preocupou.

Eu cheguei a enviar para você, pelos correios, uma garrafa de cachaça com jambu, que mereceu uma postagem sua, em 18/Abril/2016 e que me deixou muito feliz.

No final daquele mesmo ano, assumi um cargo de gestão na minha universidade, o que me levou a um certo afastamento do JBF (depois espero comentar um pouco essas circunstâncias).

Mas apenas de escrever, pois nunca deixei de acompanhá-lo, diariamente, como a minha principal fonte de leitura e entretenimento.

Você é uma pessoa muito especial, Berto, pelo amor que você tem e pela maneira como se entrega a essa causa tão nobre.

Minha esposa e eu acompanhamos você, e comentamos, entre nós, as notícias do JBF – especialmente quando são as suas intervenções – como se fosse um familiar ou amigo muito querido.

É incrível como hoje em dia hoje as mídias eletrônicas fazem com que nos “aproximemos” das pessoas, e que as afinidades aconteçam, mesmo sem o contato físico, presencial.

Para não me alongar muito e, de alguma maneira, marcar o meu retorno, gostaria de trazer uma contribuição aos leitores do JBF.

É com muito prazer que gostaria de apresenta-los a um blog de artigos sobre análise política, de um ex-reitor da minha universidade, a quem eu muito admiro.

É o Professor Alex Fiúza de Mello, cuja página pode ser acessada clicando aqui

Trata-se uma voz rara, nos dias de hoje, no meio acadêmico, que ousa ser contra o cabresto ideológico reinante.

Tenho certeza que você e os leitores e colunistas do JBF vão gostar muito.

Encerro com os últimos parágrafos, do último artigo, recém postado, denominado: BYE, BYE DEMOCRACIA!

Um grande abraço, amigo, de quem muito lhe admira.

R. Meu querido amigo e leitor, eu fiquei tão ancho com esta mensagem sua que chega arreganhei os dentes.

Aline estava passando aqui perto do computador na hora em que eu lia suas palavras e fez esse certeiro comentário: “Tu tás com cara de besta”.

De fato, fiquei mesmo bestinha de tão contente. É um privilégio ter leitores do seu quilate

Como eu vivo a repetir: aqui nessa gazeta escrota só tem gente boa, gente talentosa, decente e de bom coração.

Veja só: eu costumo dizer que o piripaque cardiológico que eu tive em maio de 2016 afetou mais minha memória do que o meu coração. Isso porque eu deixei de me lembrar de muitas coisas.

Aline, minha agenda ambulante, é que está sempre a me recordar determinados fatos quando estamos conversando.

Mas, veja só: eu esqueci apenas o que não presta e as coisas ruins.

Num lembro nem do dia em que fiquei destrambelhado e fui bater na emergência do Hospital Santa Joana, aqui no Recife.

Todavia, as coisas boas, as boas lembranças permaneceram intactas no meu juízo.

Por exemplo: me lembro perfeitamente bem da garrafa de cachaça com jambu que você me presentou. Exatamente um mês antes do meu desmantelo e da minha corrida pra UTI.

Ô cana boa que só a peste!!!

Até hoje, cumprindo rigorosamente a abstinência compulsória determinada por Dr. Sérgio Azevedo, meu cardiologista, o sabor do seu magnífico presente, cachaça com jambu, esta aqui na ponta da minha língua.

Você diz que o ilustre Professor Alex Fiúza de Mello é “contra o cabresto ideológico reinante”.

E só isto já basta pra definir a pessoa especial que ele é.

Pode ter certeza que os nossos leitores irão acessar a página dele, cujo endereço você nos mandou, e que todos os antenados fubânicos irão colocar este endereço na sua lista de páginas prediletas.

Gratíssimo pela generosidade de suas palavras e de sua apreciação, meu caro amigo.

Que você e sua esposa tenham um excelente final de semana e que sejam muito felizes, junto com todos os seus.

Vou fechar a postagem transcrevendo os últimos parágrafos do artigo que você nos mandou, da autoria do Professor Alex Fiúza de Mello.

E, logo após a transcrição das palavras do professor, uma música em homenagem aos fubânicos dessa linda e acolhedora Belém do Pará!!!

“Sob a capa postiça e ardilosa da “defesa da democracia”, juízes, políticos e intelectuais dos altos escalões do Judiciário, do Parlamento e da mídia falada e escrita operam um golpe infame contra o Estado de Direito e a ordem democrática, ignorando e menosprezando princípios, ética e a letra da própria Constituição – numa conduta coletiva vergonhosa, que maculará, para sempre, as páginas da história (pouco) republicana desta ornitorrínica “nação”.

Se em 1964 foram as fardas que, originariamente com apoio popular, afrontaram a normalidade democrática, hoje são as gravatas e as togas que, sem o mesmo apoio – e o compadrio sórdido dos pseudo “progressistas” –, instauram um novo ciclo ditatorial – só que agora com traços civis e padronagem tipicamente fascista.

E com o controle da mídia; com o inesperado fim do direito à liberdade de opinião e de expressão, bye, bye democracia! O golpe está dado!

O mais triste de tudo, ainda, ao final dessa melancólica paródia, é constatar-se o silêncio ensurdecedor e cúmplice de muitos dos que, não faz muito tempo, cantavam com o Chico – clamando por liberdade (!) – Apesar de Você.” (Professor Alex Fiúza de Mello)

* * *

DEU NO JORNAL

ESQUECI O NÚMERO DO ARTIGO

Bolsonaro quer fazer este ano 100 leilões de bens apreendidos de traficantes.

Dez vezes mais que em 2019, segundo revelou nesta sexta o Ministro da Justiça, André Mendonça.

Até Ferraris vão a leilão, disse ele.

* * *

Com certeza essa ideia de Bolsonaro não vai progredir.

Ele não vai poder leiloar bens de traficantes de jeito nenhum.

O ministro Fachin, que assinou liminar proibindo a polícia de subir nos morros do Rio de Janeiro pra prender traficantes, não permitirá o leilão dos bens desses proletários.

Com certeza ele não permitirá.

E, como quem manda atualmente é o Judiciário, o Executivo terá que cumprir a ordem.

Conforme está na Constituição, no artigo… artigo…

Ah. Deixa pra lá.

Depois eu vejo o número do artigo.

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

A INVASÃO DAS GUARAÇUMAS

Mar da Avenida da Paz (Foto: Marola)

O extenso calçadão da praia da Avenida da Paz, arborizado com amendoeiras e jardins gramados, foi o palco da nossa mocidade, onde toda noite a juventude fazia uma festa; andando de bicicleta, patins e patinetes, jogando ximbra (bola de gude), rodando pião, brincando de rouba-bandeira ou gata-pirada empurrando um aos outros nos bancos de concreto até sobrar apenas um, o vencedor. Às vezes um namoro, um aperto nas meninas, a puberdade florescia. Nas noites das quartas-feiras os moradores sentavam-se nos longos bancos de madeira embaixo do coreto para ouvir música clássica, popular e jazz. Era a retreta da Banda do Exército Brasileiro, às vezes da Polícia Militar.

Nesse paraíso havia uma praia extensa de areia branca, nosso campo de futebol. Depois do jogo, mergulhávamos e nadávamos até o fundo do mar perto dos navios fundeados. No retorno, muitas vezes os botos nos acompanhavam como estivessem nos protegendo, brincavam, mergulhavam e emergiam, soltando um som gutural como se estivessem conversando com os jovens nadadores. Ao sairmos do mar íamos em direção às paqueras que esperavam numa sombrinha tomando banho de sol ou jogando baralho. Como era gostoso entrar no mar com a namorada, os dois segurando na boia de pneu de caminhão e as pernas se cruzando embaixo d’água.

À tarde quando a maré estava cheia, a moçada partia para o trapiche que entrava mar adentro no início da praia de Jaraguá. Era uma espécie de ancoradouro, de píer, com um trilho em cima e na ponta, onde o mar era fundo, havia um sólido armazém de telhado de zinco, onde empilhavam sacos de açúcar para transbordo, por balsas, aos navios. Nós nadávamos até o armazém, subíamos pelas palafitas de madeiras grossas e pelas grades do imenso portão, logo alcançávamos o telhado de zinco quente. Ao olhar a imensidão do mar e dos coqueirais em volta, nos sentíamos os donos do mundo. Em seguida, o mergulho: com o corpo retesado nos jogávamos ao mar, era uma queda de segundos, 15 metros de altura, um vento gostoso passava na barriga até batermos e afundarmos na água. Imediatamente subíamos para outro salto.

Quando aparecia o vigia, todos nós mergulhávamos. Ao cair dentro d’água, alguém puxava, os outros continuavam a saudação: “O galo canta… o macaco assovia… banana de jegue… no cu do vigia.” Certa tarde um colega pulou e não retornou, ficamos mergulhando para tentar trazer o Tony para superfície e nada, desesperados chamamos os bombeiros que tentaram resgatar o corpo com embarcação e mergulhadores. Nunca foi encontrado o corpo de nosso amigo. Foi tristeza geral, nossos pais proibiram essa brincadeira, mas dentro de um mês os meninos da Avenida estavam pulando novamente do zinco do trapiche.

Toda manhã, antes de pegar o bonde para o Colégio Marista, eu dava um mergulho no meu mar. Certa vez notei que a água não estava com a cor verde azulada habitual, a superfície tremeluzia, alguma coisa estranha acontecia, quando cheguei à beira mar estavam diversos pescadores jogando redes, anzóis, tarrafas. Era um enorme cardume de guaraçumas que invadiu a enseada da praia da Avenida. Dei o mergulho, notei vários peixes nadando à beira mar. Um arrastão chegava com os pescadores puxando, a rede estava cheia, quase estourando de tanto peixe. Fui ao Colégio, quando retornei perto do meio dia, a praia estava cheia de gente com caniço e samburá.

O cais do porto repleto de pescadores profissionais e amadores jogando suas varas, suas redes. No dia seguinte continuou a inexplicável invasão das guaraçumas. Quase toda população de Maceió levou caniço ou tarrafa para praia e para o cais. À noite a enseada da praia da Avenida tornou-se uma festa: fachos acesos à beira do cais e nas canoas dentro d’água. As guaraçumas atraídas pelo fogo dos fachos pulavam e caíam dentro da canoa.

Ate hoje ninguém soube explicar este fenômeno. Por algum tempo a miséria havia acabado. Havia guaraçuma para quem quisesse: o pobre, o rico, o miserável, menino, velho e mulher. Maceió se fez em festa. Foram treze noites, treze dias, o mar ficou cinzento de tanto peixe pular, cardumes e mais cardumes renovavam-se invadindo a enseada. Fenômeno inexplicável e extraordinário.

Nessa época os negociantes de automóveis encheram Maceió com um novo tipo de jipe, vendido em grande quantidade, logo chamados de guaraçumas. Até hoje, o jipe 1954 é chamado de Guaraçuma pelos colecionadores.

A Gazeta de Alagoas publicou uma reportagem no dia 28 de abril de 1954, dizia assim: ABUNDÂNCIA E PESCA – “O pescado guaraçuma afluiu em quantidade espetacular à praia da Avenida da Paz. Gente muita se fez da pescaria, aproveitando o extraordinário volume de peixes surgidos ali. Muita gente pobre serviu-se à farta desse gênero de alimentação. Nesses últimos dias houve na cidade peixe de muito boa qualidade e extremamente barato. Muito pescado vendido a preço irrisório…”

Muitos técnicos tentaram explicar esse fenômeno: pesquisadores da UFAL, engenheiros de pesca do Recife. Veio gente da Bahia e até do Japão. Cada qual com uma teoria diferente. Eu gostava de conversar com um amigo, Cabo Jorge, motorista do comandante da Polícia, (meu pai). O Cabo era pai de santo de um terreiro pras bandas da praia de Ipioca, e me deu a seguinte explicação sobre a invasão das guaraçumas: “Foi Yemanjá, a rainha do mar, quem presenteou a cidade com 13 dias de fartura com muito peixe, para compensar ela ter levado o Tony que está vivendo com ela no fundo do mar.” Ainda hoje acho a teoria do velho Cabo Jorge a mais plausível.

DEU NO X

VACA PEIDONA CAGOU MAIS UMA VEZ

* * *

CARLOS EDUARDO SANTOS - CRÔNICAS CHEIAS DE GRAÇA

PUTEIRO FLUTUANTE

Restaurante Flutuante, mais conhecido como “O Puteiro de Arlindo”, monstrengo atracado, ao lado da Ponte Maurício de Nassau, no Recife (Foto do Diário da Noite, 1950)

Em 1953 o Recife ainda era meio bucólico. Mas já se projetava em invenções e inovações de alguns modelos de vida. Os bondes começavam a sentir a concorrência dos primeiros ônibus importados da América: os Super-White Marmon Herington, da Pernambuco Autoviária Ltda.

Depois vieram os elétricos. Surgiu a Sudene, com forte influência no crescimento populacional, gente desprovida de condições, motivando o aparecimento das favelas e ampliando as áreas de prostituição.

Mas a cidade transformar-se-ia em Metrópole do Nordeste. A raparigagem, porém, se ampliou, como nos tempos da II Guerra Mundial. As Zonas se espalharam pelo bairro do Sargento Pina, mas o foco principal permaneceu na área circunvizinha ao porto de mar.

João de Morais Moreira, comerciante muito à frente do seu tempo, teve a singular ideia: criar um restaurante que funcionasse sob as águas do Capibaribe. Um restaurante flutuante.

De certo modo, poderia ser um ponto de atração da mulherada, pois distante da chamada Zona do Meretrício, antes de subir a ponte lá estava a atração chamativa.

Mas Moreira pra economizar, criou um estabelecimento comercial improvisado Praticamente um “arranjo” de carpinteiro “meia boca”. Teve o propósito, subliminar de criar um ponto de atração turística da putaria.

Pretendia aproveitar a grande movimentação da “Zona”, onde a “quengagem” explícita funcionava à todo o vapor pelas adjacências.

O Restaurante Flutuante ficava ancorado no Capibaribe, ao pé da Ponte Maurício de Nassau. Por alguns anos passou a fazer parte do roteiro de atrações da “Zona”. Teve sua sorte menos significativa, mas ficaria, igualmente, na História.

Sua construção não contou com uma arquitetura bem definida. Fora montado num tablado em cima de vários tonéis, possuindo uma parte de cobertura sem teto, como se fosse o terraço de uma embarcação.

Possuía mastros com bandeiras. Tudo encantava o passante. Atraia pela singularidade. O freguês podia jantar rodeado pelas águas do Capibaribe. Era uma emoção! Parecia um vapor atracado num porto do Capibaribe.

Nos primeiros anos notava-se o esmero. Em pequeno palco, apresentava-se o pianista George Baltazar. Mesas alinhadas, com toalhas de linho, funcionários bem trajados, corteses e pratos internacionais. Havia pequena pista de dança.

Anos depois, diante de críticas de ferrenhos historiadores e jornalistas, o Flutuante foi perdendo certa classe e passou a enfrentar problemas, a partir de 1959. Transformara-se, de fato, numa agência de prostituição.

Findado o glamour inicial que as novidades despertam o proprietário não acompanhou o modelo dos primeiros anos. Os clientes foram se afastando, havia a presença de muitas “prostitutas pé de chinelo” fazendo ponto pela redondeza. Tornou-se antro de raparigagem, contravenções e brigas, até que foi interditado.

Sempre que passo por perto da Livraria Ramiro Costa fico a recordar aquele tempo, vendo parte do Flutuante perdida num tempo de certo glamour. Ali, resta apenas um pedaço de piso enterrado no mangue, como se a peça permanecesse, marcando o tempo histórico que representou, na atmosfera boêmia do Recife.

Inegavelmente fora uma ação de pioneirismo de Seu Moreira. Mas, tempos depois, quando negociado por um Araque de Polícia de nome Arlindo, se manteve caindo aos pedaços, funcionando, mesmo interditado pela Prefeitura.

Tornou-se o único puteiro flutuante da região.