O surgimento de lideranças e estadistas, para parafrasear o pensamento de Maquiavel, ainda que com endereços trocados (Maquiavel fala para Lourenzo de Medici, praticamente os donos da Florença medieval; eu falo para as lideranças democráticas da atualidade), se dá em momento de convulsões e crises de proporções pantagruélicas, como a que vivemos agora como o “calangovírus” – troquei o nome dele, desde a última postagem -. Vejamos, para fins de ilustração, dois exemplos disso e que, se formos analisar historicamente, essa lição já se encontrava no pensamento de Sun-Tsu, no Livro do Eclesiaste, no Livros das Crônicas judaica, e por aí vai.
Na Primeira Guerra Mundial, Winston Churchil foi o militar aboletado em um gabinete que planejou o que ficou conhecido como “O desastre de Galipoli”, campanha militar em que os turcos otomanos surraram duas vezes as tropas britânicas em solo turco e desmoralizaram a mítica de força militar invencível. Depois disso, Churchil submergiu apenas como político para se erguer já na Segunda Guerra Mundial, como o gigante que garantiu a derrota do nazifascismo e se transformou em um símbolo de resistência, perseverança e firmeza de propósitos, sem ceder um milímetro de sua moral, ou ética pública. O mesmo pode-se dizer do Marechal Josip Broz Tito na antiga Iugoslávia. Com carreira militar mediana, sem chamar a atenção de ninguém, foi no fogo da guerra que se revelou o brilhante estrategista, a vontade férrea e indomável que conseguiu escorraçar as tropas de Hitler de seu país. Pena que depois disso se tornou um sanguinário comunista da mesma opa do bigodudo tarado da Geórgia.
A partir dessa óptica de construção de lideranças nas crises, pode-se lançar um olhar para o Brasil de 2020 e ver como nossas lideranças, em todas as esferas se portam, agem e se movimentam. Estou em busca de líderes que fazem a diferença, líderes do naipe de um Churchil, ou mesmo de um Tito, e o que encontro é desalentador. Em todos os aspectos, desalentador e que causa uma desesperança, um sentimento de rendição a fatos que teimam em esbofetear a nossa cara, pois são frutos de nossas escolhas, de nosso voto.
Observemos o caso do SUS – Sistema Único de Saúde -. Uma doença que mata menos que pneumonia e febre amarela, teve o condão de escancarar as mazelas desse sistema. Sistema esse que certo presidente que passou uma temporada enjaulado dizia que estava tão próximo à perfeição que dava vontade de ficar doente só para ser atendido por ele. Mas, quando ficou doente de verdade, correu para um hospital privado, onde pobre só entra para tirar o lixo e limpar o chão. Há um caso aqui no glorioso Mato Grosso do Sul em que uma senhora teve que esperar 26 meses para fazer um procedimento cirúrgico pelo SUS. Quando a central de saúde ligou para a filha dela marcando a data da cirurgia essa senhora já havia falecido há mais de três meses provocado pela mesma doença que um procedimento cirúrgico simples teria poupado a sua vida. O SUS data a sua criação de 1990, ou seja, em trinta anos permaneceu a mesma situação caótica, desordenada, usado apenas como moeda política. O cidadão que depender de uma unidade básica de saúde vai sair com um atendimento precário e as mãos cheias de diclofenaco, dipirona e AAS. É a única saída que o médico tem para não deixar o cidadão a ver navios. Receita esses medicamentos de unha encravada até tuberculose, na esperança de que a “fé” cure essas pessoas, pois mais do que isso não podem fazer, já que é a política e não a vida que interessa para quem gerencia o SUS.
Observemos, em um segundo momento o caso do Presidente da República. Jair Bolsonaro caminha célere para se tornar um novo Lula. Não digo no caráter ladroístico e bucaneiro do chefe da quadrilha petista, mas sim no caudilhismo e protagonismo político. O PT fez quarenta anos em 2020, e nesses quarenta anos é um sistema planetário que só tem uma vida no seu sol – Lula -. Morto esse sol, o partido morrerá, pois o chefão impediu que novas lideranças despontassem e pudesse haver a sucessão sem solavancos. Quando o Aliança pelo Brasil estiver pronto, seguirá a mesma toada, a mesma história será confirmada. O Aliança pelo Brasil será um partido dos Bolsonaro. Qualquer um que entrar no partido terá que seguir o que a família decidir como certo. Amém. Isso lembra a obra O 18 Brumário de Marx quando este disse a respeito de Napolãeo III: “A historia se repete, a primeira vez como tragédia, e a segunda como comédia”. A tragédia foi o PT, a comédia será o Aliança.
E de onde tiro essa especulação? Do modo como o presidente vem gerenciando a crise do “calangovírus”. Em um momento que ele deveria se elevar acima das mesquinharias eleitoreiras, passa a se comportar como o dono da bola. “Se eu não for o capitão do time, levo a bola embora”. Só que ele se esquece que, como uma jaca, que não se come sozinho, se não estraga; não se joga bola sozinho. Nesse “imbróglio” entre o presidente e o ministro da Saúde, todos gritam com todos, e ninguém tem razão, pois não se está pensando nos 210 milhões de brasileiros hoje, mas sim nos frutos que o protagonismo no combate ao vírus dará nas próximas eleições. E o pobre diabo que vive de catar reciclável para poder botar um pedaço de pão seco na boca dos filhos que vá para o diabo que o carregue.
Essa dicotomia política contaminou os meios de comunicação, as redes sociais. Hoje, falar que o presidente está agindo de maneira temerária é o suficiente para ser taxado de “comunista” e “traidor”. Esquecem esses que fazem esse tipo de algaravia – os mais novos não vão entender esse vocábulo, só os que já cruzaram o Cabo da Boa Esperança, ou o estão cruzando, então sugiro um bom dicionário – que o único lado permitido ao Estado e aos seus agentes, é o lado do cidadão, independente de sua afiliação político ideológica. No entanto, o que se percebe é um ministro cheio de si, crendo em sua própria fantasia, um presidente que acha que a condução de um país é concurso de popularidade. Ninguém de seu “staff” pode ser mais popular do que ele, pois isso seria um complô para as próximas eleições, uma tentativa de minar a autoridade do chefe. Nesse caso, Bolsonaro faz o papel do machão do ensino secundário que, inseguro com a própria masculinidade ameaça o viado da escola, bate nos mais fracos e que traçar todas as menininhas que derem bola a ele.
O seu ministério também não está melhor. São falastrões, empavonados com sua própria visão de mundo e amor ao adjetivo “excelência”. E o brasileiro sem emprego, sem comida e sem a garantia de um leito hospitalar se ficar doente, que vá se tratar como antigamente: com mezinhas, benzedeiras e fumigações com ervas medicinais como ainda fazem algumas tribos indígenas.
O terceiro e último ponto alia o legislativo, o judiciário e os servidores públicos. Até agora essas instâncias têm imposto uma alta carga de compromissos para que a sociedade que trabalha e produz, pague por ela, em um futuro próximo. A todo o momento se vê falar que o congresso quer liberar as burras para que Estados e Municípios gastem por conta, joguem dinheiro sem lastro. Depois a sociedade será chamada a cobrir as despesas. Mas, até agora eu não vi um parlamentar, um ministro do judiciário dizer: vamos cortar metade de nossos ganhos e ajudar nos esforços de combate ao vírus. Ministro que, marotamente tem um salário de trinta e nove mil reais, mas se você ler a sigla “proventos”, que não entram como salário, chegam a receber mais de 150 mil reais por mês, aqui na Botocúndia. O mesmo vale para senadores e deputados. Escondem seus ganhos nas ditas verbas: de gabinete, de representação, de auxílios, de indenizações, e por aí vai. Não se ouviu até agora um único deputado, não importando a matiz política dizer: vamos cortar 70% do fundo partidário e 80% do fundo eleitoral e mandar essa verba para reforçar o orçamento da Saúde. Nada. Silêncio absoluto.
Não se vê também, nenhum movimento em se fazer uma redução nos salários do funcionalismo público em todas as esferas. Não digo do funcionário peba – aqui no glorioso Mato Grosso do Sul, quando se quer dizer que alguém é de baixíssimo escalão, ou valor, chamamos esse indivíduo de peba – aquele que quando recebe muito, mal chega a dois salários mínimos e que é a maioria do funcionalismo público. Mas sim daqueles de alto escalão, que chegam a receber mais de 30, 40, 50 mil por mês e ainda brigam por receber mais. Para estes, falar em reduzir o salário, ou mesmo congelá-los é anátema. Mas são estes mesmos que dizem que, para preservar os empregos é necessário reduzir os salários dos trabalhadores da iniciativa privada.
O resultado disso tudo é que, no fogo da crise, quando o país pensou que veria o surgimento de uma geração com lideranças fortes, estadistas e inspiradores das futuras gerações, o que estamos vendo é mais do mesmo: populistas, caudilhos, aspirantes a assumir o lugar do general Massul, protoditadores de bloco carnavalesco e todo tipo de esperto que vai com a gula de um lobo faminto nos bolsos do cidadão pagador de impostos. Em uma escola em que essas características seriam a mediana para a aprovação para um estado de civilidade maior todos eles estariam reprovados. Reprovados com louvor!