JOSÉ RAMOS - ENXUGANDOGELO

ALCÂNTARA – ALÉM DO CLA

Pomba branca da Paz – símbolo da Festa do Divino

Situada numa Ilha marítima e fundada em 8 de setembro de 1612, São Luís, capital do Maranhão tem características diferentes de algumas capitais brasileiras que estão situadas na orla marítima. O mar que banha São Luís tem marés também diferentes durante todo o ano e, durante a “sizígia” sofre bastantes danos. O mar lhe proporciona, além de todas essas diferenças da Natureza, um convívio nada benéfico com a quantidade de salitre, elemento que lhe destrói uma quantidade significativa de elementos metálicos usados na construção civil.

Mas isso não é tudo. A Ilha de São Luís está localizada entre as baías de São Marcos e de São José, garantindo à capital o privilégio da navegação, às não tão boa por conta das altas e baixas das marés. Do lado da baía de São José, está a cidade de Icatu, fundada no dia 10 de abril de 1614, primeira capital do Maranhão. Do lado da baía de São Marcos, está a cidade de Alcântara, com nuances ligadas à história do escravismo brasileiro, fundada em 22 de dezembro de 1648. É nessa região de Alcântara, mormente nos municípios vizinhos, Guimarães, Mirinzal e Bequimão que estão fincados em maior número, os quilombos. Todos, e sem exceção, resquícios da escravidão.

Dito isso, é impossível ficar definitivamente desvencilhado do passado. Trazidos pelos portugueses anos antes, que chegaram para expulsar os franceses da convivência com os índios tupinambás, escravos negros foram utilizados de qualquer jeito como reforços aliados da coroa portuguesa na expulsão dos franceses. Asssim era comum que, após a saída dos portugueses, os que ali ficaram com os benefícios da Lei Áurea, se expandissem e mudassem para municípios limítrofes, levando consigo também alguns hábitos culturais. E não foi diferente com a religiosidade.

Alcântara é um município que nos dias atuais faz paprte da da Região Metropolitana de São Luís. Tem uma população estimada de 21 652 habitantes, segundo o censo de 2014 processsado pelo IBGE.

A povoação foi elevada a vila de Santo António de Alcântara em 1648, tendo sido sede da Capitania de Cumã. Durante o período colonial, foi um importante centro agrícola e comercial. No século XIX, a cidade entrou num período de decadência, permanecendo como testemunho do seu período áureo o acervo arquitetônico de seu Centro Histórico, tombado pelo IPHAN, em 1948.

Fiéis conduzem o “mastro” em sacrifício

Pois, em 1982, o governo brasileiro construiu em Alcântara, um centro espacial do qual são lançados os veículos lançadores de satélites no âmbito da Missão espacial completa brasileira. É o CLA – Centro de Lançamento de Alcântara. Na América Latina, o CLA é o único concorrente do Centro Espacial de Kourou situado na Guiana Francesa, mas, ao contrário deste, o centro espacial brasileiro não opera lançamentos constantes em razão de atrasos logísticos e tecnológicos.

“A origem remonta às celebrações religiosas realizadas em Portugal a partir do século XIV, nas quais a terceira pessoa da Santíssima Trindade era festejada com banquetes coletivos designados de Bodo aos Pobres com distribuição de comida e esmolas. Tradição que se cumpre em algumas regiões de Portugal. Há referências históricas que indicam que foi inicialmente instituída, em 1321, pelo convento franciscano de Alenquer sob proteção da Rainha Santa Isabel de Portugal e Aragão.

A celebração do Divino Espírito Santo no planeta teve origem na promessa da rainha, D. Isabel de Aragão, por volta de 1320. A Rainha prometera ao Divino Espírito Santo peregrinar o mundo com uma cópia da coroa e uma pomba no alto da coroa, que é o símbolo do Divino Espírito Santo, arrecadando donativos em benefício da população pobre, caso o esposo, o rei D. Dinis, fizesse as pazes com o filho legítimo, D. Afonso, herdeiro do trono. De acordo com os documentos, D. Isabel não se conformava com o confronto entre pai e filho em vista da herança pelo trono, pois era desejo do rei que a coroa portuguesa passasse, após sua morte, para seu filho bastardo, Afonso Sanches. Diante do conflito, a rainha Isabel passou a suplicar ao Divino Espírito Santo pela paz entre seu esposo e seu filho. A interferência da rainha teria evitado um conflito armado, denominado a Peleja de Alvalade.

Caixeiras do Divino Espírito Santo em Alcântara

Essas celebrações aconteciam cinquenta dias após a Páscoa, comemorando o dia de Pentecostes, quando o Espírito Santo desceu do céu sobre a Virgem Maria e os apóstolos de Cristo sob a forma de línguas como de fogo, segundo conta o Novo Testamento. Desde seus primórdios, os festejos do Divino, realizados na época das primeiras colheitas no calendário agrícola do hemisfério norte, são marcados pela esperança na chegada de uma nova era para o mundo dos homens, com igualdade, prosperidade e abundância para todos.

A devoção ao Divino encontrou um solo fértil para florescer nos territórios portugueses, especialmente no arquipélago dos Açores. De lá, espalhou-se para outras áreas colonizadas por açorianos, como a Nova Inglaterra, nos EUA, e diversas partes do Brasil.

No Maranhão, o culto ao Divino Espírito Santo teve início com os colonos açorianos, portugueses e seus descendentes, que desde o início do século XVII chegaram para povoar a região. A partir de meados do século XIX, a tradição da festa do Divino começou a estar firmemente enraizada entre a população da cidade de Alcântara, de onde se espalhou para o resto do Maranhão.

Portal (Altar) do Divino Espírito Santo em Alcântara

Hoje, a devoção ao Divino é uma das mais importantes práticas religiosas do Maranhão, a festa, igualmente a que ocorre em Paraty (Rio de Janeiro) seja talvez uma das mais tradicionais de todo o território brasileiro, conservando ainda à risca aspectos do período colonial, mobilizando a cada ano centenas de pessoas em todo o Estado. Embora possa envolver gente de todos os extratos sociais, quase todos os participantes são pessoas humildes, de baixo poder aquisitivo, que se esforçam para produzir uma festa rica e luxuosa, onde não podem faltar as refeições fartas, a decoração requintada e caras vestimentas para as crianças do império (ver abaixo). Por se tratar de uma festa longa, custosa e cheia de detalhes, sua preparação e realização levam vários meses e envolvem muita gente, construindo assim uma grande rede de relações entre todos os participantes.

Toda a festa do Divino gira em torno de um grupo de crianças, chamado império ou reinado. Essas crianças são vestidas com trajes de nobres e tratadas como tais durante os dias da festa, com todas as regalias. O império se estrutura de acordo com uma hierarquia no topo da qual estão o imperador e a imperatriz (ou rei e rainha), abaixo do qual ficam o mordomo-régio e a mordoma-régia, que por sua vez estão acima do mordomo-mor e da mordoma-mor. A cada ano, ao final da festa, imperador e imperatriz repassam seus cargos aos mordomos que os ocuparão no ano seguinte, recomeçando o ciclo.

A festa se desenrola em um salão chamado tribuna, que representa um palácio real e é especialmente decorado para este fim. A abertura e o fechamento desse espaço marcam o começo e o fim do ciclo da festa, durante o qual se desenrolam as diversas etapas que, em conjunto, constituem um ritual extremamente complexo, que pode durar até quinze dias: abertura da tribuna, busca e levantamento do mastro, visita dos impérios, missa e cerimônia dos impérios, derrubamento do mastro, repasse das posses reais, fechamento da tribuna e carimbó de caixeiras.

Entre os elementos mais importantes da festa do Divino estão as caixeiras, senhoras devotas que cantam e tocam caixa acompanhando todas as etapas da cerimônia. As caixeiras são em geral mulheres negras, com mais de cinquenta anos, que moram em bairros periféricos da cidade. É sua responsabilidade não só conhecer perfeitamente todos os detalhes do ritual e do repertório musical da festa, que é vasto e variado, mas também possuir o dom do improviso para poder responder a qualquer situação imprevista.”

Os últimos nove parágrafos foram compilados do Wikipédia.

Neste ano de 2019, os festejos do Divino Espírito Santo, em Alcântara, Maranhão, acontecem a partir do dia 29 de maio, se prolongando até o dia 9 de junho. Em outros municípios maranhenses onde os festejos também acontecem, as datas serão diferentes.

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

GEORGE MASCENA – TABIRA-PE

Grande Luiz Berto.

Eu estava vendo o clip da musica “Dio come ti amo” no Facebook e me deu uma curiosidade danada de saber que aeronave era aquela, e na minha pesquisa descobri que era um modelo similar ao do acidente que vitimou o Coroné Ludugero.

Postei no meu Facebook e se você achar interessante coloque no Besta Fubana.

Um grande abraço.

* * *

A morte de Coroné Ludugero em um avião da “Pobre Também Avua”

Nos anos 60 uma música fez grande sucesso na voz de Gigliola Cinquetti: “Dio Come ti Amo“, o filme homônimo também foi estouro de bilheterias, eu lembro que era sinal de casa cheia quando vinha essa película italiana para o Cine Alvorada em Tabira. A cena mais conhecida era a que Mark Damon embarcava em um voo de volta para a Espanha e pelo microfone Gigliola cantava a canção e o avião parava e desembarcava o passageiro para o casal se encontrar e o filme acabar bem. Pois bem, esse arrodeio todo foi pra falar do avião, o Fokker 27.

O Fokker 27 era um avião holandês de grande sucesso nas décadas de 60 e 70, voou no Brasil pela Varig e TAM. A aeronave foi também fabricada nos Estados Unidos pela Fairchild com algumas modificações. Esse foi o modelo escolhido pela Paraense para compor sua frota de 5 aviões, o Fairchild Hiller FH-227-B, como o nome era muito difícil de se pronunciar, a empresa de aviação do Pará rebatizou-o de Hirondelle, andorinha em francês.

A PTA, Paraense Transportes Aéreos deve ter sido a primeira low coast brasileira, tinha bons preços e descontos para estudante ou grupos de pessoas que podiam chegar a 50%, por causa desses preços e da sigla, PTA, a empresa foi apelidada de “Pobre Também Avua”. A companhia voava desde o Acre até RJ e SP, operava também no Recife.

Em 13 de março de 1970 um voo partiu do Recife com escalas em Fortaleza, Parnaiba e São Luiz e as 5:30 do dia 14, uma manhã chuvosa, o voo chegava ao fim. Já na aproximação do aeroporto de Belém, o Hirondelle prefixo PP-BUF colidia com a água da Baia de Guajará, a poucos metros da cabeceira do Val de Cans, na queda morreram quase todos os ocupantes, só 3 sobreviveram, sendo que um dos sobreviventes faleceu no hospital.

Entre os passageiros estava Luiz Jacinto Silva, humorista pernambucano mais conhecido por Coroné Ludugero, acompanhado de Irandir Perez Costa (Otrope) e equipe de apoio, Mercedes del Prado (Felomena) não estava no voo, a trupe havia embarcado em São Luiz na madrugada e ia fazer um show em Belém. A Paraense era famosa também pelo número de acidentes, tinha outro apelido: “Prepara Tua Alma”, este foi o 9º acidente da companhia antes de entrar para a lista de companhias aéreas brasileiras que deixaram de operar.

R. Meu caro Mascena, ilustre sertanejo de Tabira, vou aproveitar a deixa que você nos deu para acrescentar dois vídeos a esta postagem.

O primeiro é com a música “Dio Come ti Amo“, na linda voz de Gigliola Cinquetti.

O outro vídeo é com o Coroné Ludugero, personagem interpretado pelo saudoso Luiz Jacinto, que nos deixou tão jovem e tão cedo naquele triste acidente de avião no Pará.

A PALAVRA DO EDITOR

ATÉ EM PARIS SE FALA DA ENTREVISTA DE LUIZ BERTO

Cara, tô eu em Paris, aniversário de 130 anos da Torre Eiffel, fui lá ver o espetáculo de luzes e sons, mergulhado no berço da cultura, na Cidade Luz, quando um sujeito do meu lado pergunta:

– Caba, tu visse a intrevistcha de Luiz Berto na Rádio Paulo Freire aquela, de Pernambuco?

Eu pensei, porra, esse cara só pode ser nordestino. Como sabe que sou brasileiro?

Ele parece que adivinhou meu pensamento e disse que me viu conversando com a minha mulher e que ele estava doido para falar com alguém sobre a entrevista de um cabra safado que ele viu na Internet, nordestino como ele; mas ali em Paris, onde ele foi parar não sabia como, não conhecia ninguém, nem francês nem brasileiro. E ele estava impressionado a cuma é que é uma emissora cultural, universitária, tinha demorado tanto a chamar Berto para contar suas histórias.

Aí eu falei pro cara, que não acreditou na coincidência: – Pois veja só, Berto é meu chefe!

Ele quis saber como assim e eu expliquei. Esse sujeitinho é o editor do Jornal da Besta Fubana, um jornaleco vagabundo que só presta para falar mal de Lula, onde, não sei porque, eu, que sou Lula roxo, escrevo um monte de porcaria e ele publica, e não só publica como me mandou aqui para Paris, com todas as despesas pagas, para ver se eu paro de endeusar Lula e escrevo sobre outras coisas menos importantes, como o Louvre, a Notre Dame, o Sena e… a Torre Eiffel, onde estamos hoje justamente para isso!

O cara ficou doido, me pediu autógrafo e o escambau e foi-se, me deixando com um problema: Então Berto deu uma entrevista, o vídeo está na Internet e, porra, eu tenho de ver essa onça, se não vai que o cara fica sabendo que eu não vi e eu me lasco todinho. Afinal, o jornal é uma porcaria, mas me paga bem, não posso perder essa boca.

Eu poderia muito bem estar na Veja, na Folha, no Globo, mas me ofereceram a metade do que tiro aqui, tenho de me conformar.

Pois bem, cheguei no “studio”, quarto “arrondissemente”, Marais, o Marré, bairro da viadagem mundial, quarto andar sem elevador – Berto me paga hotel cinco estrelas mas eu economizo pagando um quarto barato – e toma-lhe a ligar o computador para uma hora de tortura.

Tive uma grata surpresa: Enquanto traçava uma baguete com um vinho de fundo liso, foi uma hora de uma divertida entrevista com um sujeito que eu achava que só tinha feito escrever dois livros geniais – o Romance da Besta Fubana e a Serenata (os outros eu não li e o Memorial do Mundo Novo abandonei de cara) – e que agora descobria que, além de ser um velho amigo, é um sujeito divertido, inteligente e palestrador de primeira do tipo do cabra que ele diz ser seu ídolo, o inacreditável Ariano Suassuna.

Pois bem, Berto pode explorar também esse campo, pois, além de ser tão bonito quanto Ariano, tem a palavra fácil, a memória prodigiosa e a capacidade de encantar uma plateia com um senso de humor invejável.

Não é por ser meu chefe.

* * *

Nota da Editoria:

Clique aqui para ouvir a entrevista.

COMENTÁRIO DO LEITOR

ÚLTIMA FLOR DO LÁCIO

Comentário sobre a postagem TEMPO DE VERBO PETISTA

Roque Nunes:

Papa Berto.

Sou professor da amada Inculta e bela.

E nossa língua tem diversos tempos:

Presente, Pretérito Perfeito, Pretérito Imperfeito, Pretérito-Mais-que-Perfeito, Futuro do Presente e Futuro do Pretérito.

Agora os analfabetos ilustrados das nossas universidades criaram mais um tipo de futuro:

O futuro mais que energúmeno.

* * *

A Editoria do JBF toma como pretexto o comentário do leitor Roque Nunes para brindar a distinta plateia fubânica com o belo poema de Olavo Bilac.

LÍNGUA PORTUGUESA

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela…

Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: “meu filho!”
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

A PALAVRA DO EDITOR

EMBALO DOMINICAL

Em sua coluna publicada no último dia 12, aqui no JBF, o Poeta Jessier Quirino prestou uma homenagem à dupla Luiz Gonzaga/Sivuca.

Foi a propósito de uma antiga foto desta dupla genial, feita no Rio de Janeiro, no ano de 1954:

Assim que botei a postagem no ar, me lembrei de uma música da autoria de Glorinha Gadelha, viúva de Sivuca.

Uma composição intitulada Serena no Mar e que foi gravada pelo trio Gonzaga, Sivuca e Glorinha.

Um embalo bem gostoso para alegrar o domingo da comunidade fubânica!

JOSÉ DOMINGOS BRITO - MEMORIAL

AS BRASILEIRAS: Cecília Meireles

Cecília Benevides de Carvalho Meireles nasceu em 7/11/1901, no Rio de Janeiro. Jornalista, professora, pintora e essencialmente poeta. Foi a primeira mulher a se destacar na literatura brasileira. Orfã de pai e mãe, foi criada pela avó materna e após o curso primário na Escola Estácio de Sá, recebeu de Olavo Bilac uma medalha de ouro por ter feito o curso com “distinção e louvor”. Era uma criança bonita de olhos azuis-esverdeados. Passou a infância muito sozinha, pois a avó cuidava para que não fosse brincar na rua. A solidão e o silêncio, segundo ela mesma, foram positivos para sua carreira de poeta.

Em 1917 formou-se professora na Escola Normal do Distrito Federal, e passou a exercer o magistério nas escolas oficias do Rio Janeiro. Aos 18 anos publicou seu primeiro livro com 17 sonetos: Espectros e foi influenciada pelo Movimento Simbolista. Nesta época participou da “Revista Festa”, de um grupo católico, conservador. Vem daí sua visão espiritualista presente em suas obras. Casou-se em 1922 com o artista plástico português Fernando Correia Dias, um dos introdutores de uma nova estética no modernismo português, com quem teve três filhas: Maria Elvira, Maria Matilde e Maria Fernanda, que se tornou uma famosa atriz de telenovela. Mais tarde, numa viagem à Portugal, o marido apresentou-a à alguns intelectuais e artistas e ela se interessou em conhecer pessoalmente o poeta Fernando Pessoa. Marcaram local e hora do encontro, mas o poeta não compareceu alegando num bilhete que, consultando seu horóscopo, viu que aquele dia não era bom para um encontro de dois poetas. Pediu desculpas no bilhete e deixou-lhe um exemplar autografado de seu livro Mensagem.

A vida do casal não foi fácil devido aos preconceitos da época, que prejudicaram o artista plástico e a professora, que mantinha uma coluna no Diário de Notícias sobre educação. No inicio de 1922, quando ocorria a Semana de Arte Moderna, em São Paulo, com a qual não teve contato, escreveu poemas para um novo livro publicado no ano seguinte: Nunca mais… Poema dos poemas, com ilustrações do marido. Preocupada com a qualidade do ensino e a escassez de livros didáticos, escreveu um livro para escolas primárias, e publicou-o em 1924: Criança, Meu Amor. O livrinho foi adotado pela Diretoria Geral da Instrução Pública do Distrito Federal, dirigido por Anísio Teixeira, e aprovado pelo Conselho Superior de Ensino dos estados de Minas Gerais e Pernambuco, onde o livro foi amplamente divulgado.

Em 1925 publicou Baladas para El Rei contendo poemas, que os críticos caracterizaram como representante do “simbolismo-tardio” e outros como O espírito vitorioso (1929), Saudação à menina de Portugal (1930), Batuque, samba e macumba (1933), enquanto lecionava. Seu apego a educação e a literatura infantil motivou-a a fundar, em 1934 a primeira biblioteca infantil do Brasil. Dois anos após, seu marido, sofrendo de forte depressão, cometeu suicídio, fazendo com que ela passasse um período sem escrever e dedicando-se apenas ao magistério. Em 1936 foi nomeada para a recém fundada Universidade do Distrito Federal (atual UFRJ). Passado o período de luto, publicou, em 1939, o livro Viagem, considerado um marco de maturidade e individualidade em sua obra, com o qual recebeu o Prêmio de Poesia Olavo Bilac, da Academia Brasileira de Letras.

Em 1940 realizou uma viagem pela Europa e EUA, onde lecionou literatura e cultura brasileira na Universidade do Texas e Lisboa, e proferiu uma série de conferências sobre estes temas. Essa retomada da vida culminou com o segundo casamento com o engenheiro Heitor Gillo. Em 1942, tornou-se sócia honorária do Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro, e empreendeu viagens pela Ásia e África sempre proferindo conferências sobre literatura, educação e folclore brasileiro. Em seguida dedicou-se a várias viagens aos Estados Unidos, Europa, Ásia e África; sempre proferindo conferências sobre Literatura, Educação e Folclore.

Em 1953, lançou sua coletânea de poemas mais conhecida, Romanceiro da Inconfidência, uma obra em que, segundo os críticos, Tiradentes surge “como um avatar de Cristo e sofrendo o sacrifício do bode expiatório, ele se torna num redentor do Brasil, que abriria a nova era da liberdade”. A obra “construiu um mosaico em que se cristalizaram vibrações captadas na terceira margem da memória coletiva” creditando à poeta a “consolidação de uma teia de mitos suscetíveis de fortalecer o sentimento da identidade nacional”. Mais tarde, a obra serviu como base para o filme Os inconfidentes (1972), dirigido por Joaquim Pedro de Andrade. Sua poesia é caracterizada por imagens sugestivas, sobretudo as de forte apelo sensorial, reflexiva, de fundo filosófico. Isto pode ser visto, digo, ouvido nos poemas “Canteiros” e “Motivo”, musicados pelo cantor Fagner.

Além de poesia, escreveu também em prosa, dedicando-se a assuntos pedagógicos e folclóricos. Produziu também prosa lírica, com temas versando sobre sua infância, suas viagens e crônicas circunstanciais. Algumas de suas obras em prosa: Giroflê, Giroflá (1956), Escolha seu Sonho (1964), seu último livro. Faleceu em 9/11/1964 e deixou muitos livros na gaveta, os quais foram publicados postumamente: O menino atrasado (1966), Flor de Poemas (1972), Flores e Canções (1979), sem contar as obras completas: Poesias Completas (1973), Obra em Prosa (1998 em 6 Volumes), Crônicas de educação (2001 em 5 volumes) e Poesia Completa, edição do centenário (2001 em 2 volumes), organizada por Antônio Carlos Secchin. No ano seguinte ao seu falecimento, recebeu uma homenagem póstuma da Academia Brasileira de Letras: o Prêmio Machado de Assis, pelo conjunto de sua obra, num total de 54 livros.

Em 1989 foi homenageada pelo Banco Central do Brasil, tendo seu retrato estampado na cédula de cem cruzados novos. A fragilidade da moeda brasileira aposentou a cédula, mas seu nome continua denominando escolas, bibliotecas e logradouros públicos no Brasil e no exterior, como nas Ilhas dos Açores, numa escola da freguesia de Fajã de Cima, ou numa biblioteca de Valparaiso, no Chile. Para aquilatar sua poesia, temos a avaliação do crítico Paulo Rónai:

“Considero o lirismo de Cecília Meireles o mais elevado da moderna poesia de língua portuguesa. Nenhum outro poeta iguala o seu desprendimento, a sua fluidez, o seu poder transfigurador, a sua simplicidade e seu preciosismo, porque Cecília, só ela, se acerca da nossa poesia primitiva e do nosso lirismo espontâneo… A poesia de Cecília Meireles é uma das mais puras, belas e válidas manifestações da literatura contemporânea”.

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

PENINHA - DICA MUSICAL